Depois de seis anos sem escrever, espero que ainda gostem do meu trabalho.

Fic dedicada à amiga Lucrecia Bórgia (Human Being), que teve o carinho de betá-la.

Chá de Mato

I

Ele chegaria em uma semana. Havia pouco tempo para tomar uma decisão.

Devia mesmo testar aquilo? Ora, que bobagem! Como se uma coisa daquele tipo fosse realmente possível! Melhor voltar, subir as escadarias do Santuário e tratar de suas tarefas na Casa de Touro. Sim, senhor! Tinha mais o que fazer! Arriscar-se em uma empreitada que parecia fadada ao fracasso – e ao ridículo! – não valia a pena.

Ou poderia continuar o caminho, descer até o vilarejo, adentrar a cabana que mais parecia um lençol remendado estendido sobre uma armação de gravetos, e seguir o conselho da velhinha misteriosa.

Deu algumas voltas pela praça central do Santuário. Sentou-se em um dos bancos que havia espalhados por um grande gramado e ficou observando uma criança ao longe, que tentava atingir um passarinho com uma pedra. Se o projétil acertasse o pequeno alvo, voltaria para casa. Se não, iria em frente.

No fim das contas, impediu que a criança atirasse a pedra. Maldito coração de manteiga!

Mas bem, a pedra não havia atingido a avezinha... iria em frente!

Ou deveria considerar que havia manipulado os resultados?

Precisava de outra referência!

Perto dali, observou um lírio no qual uma abelha retirava pólen. Se ela voasse para direita, ele iria para casa. Para a esquerda, iria em frente.

E a abelha voou para a esquerda. Respirou fundo e foi. Não demorou muito e chegou à pequena cabana onde a velha o aguardava.

- Ahá! – gritou a figura estranha, assustando-o – Eu sabia que você viria!

- Sabia? – perguntou, ainda meio nervoso do susto.

- Na verdade não... mas eu sempre quis dizer isso! – e sorriu mostrando os poucos dentes que haviam na boca, dando a ele uma pequena sensação de aversão – Vamos entrando, rapaz!

Entrou na cabana, mal acreditando que coubera dentro dela sem bater a cabeça no "teto". Lá dentro haviam uns pequenos vidros mal cheirosos empilhados em uma pequena prateleira, um colchão de palha, um fogareiro velho e outras quinquilharias.

- Você veio pelo chá, não é?

- Oh, sim! O chá que a senhora falou.

- Hehehe... ele é muito poderoso! Acredita em mim?

- Acreditarei se surtir efeito.

Ela parou. Examinou-o bem. E para desânimo dele, sorriu mais uma vez, exibindo a gengiva desdentada.

- Foi a melhor resposta que ouvi em anos! – pegou um pacote dentro de uma gaveta – Por isso, a primeira amostra será gratuita. Mas não vá se acostumando!

- Oh, não!

- Você deve tomar uma xícara do chá por dia e então poderá ouvir os pensamentos dos outros, assim como eu lhe disse. O efeito dura de doze a dezoito horas, dependendo da dose.

- Se realmente funcionar...

- Funcionará, acredite! Mas lhe advirto: pense muito bem antes de tomá-lo. Não me responsabilizo por nada que você irá ouvir daqui em diante.

- Estou ciente dos efeitos do chá, senhora.

- Senhorita! – e sorriu de novo, ajeitando os cabelos que lembravam uma vassoura de palha velha – Nunca me casei, sabia?

- Imagino o por quê.

- O que disse?

- Não imagino! Por quê?

- Ora, os homens! Quem vai entendê-los? Mas bem, agora vá e depois diga se ficou satisfeito com os efeitos do chá! Boa sorte, meu jovem!

Fez então o caminho de volta, pensando se realmente apelaria para a estranha bebida. Pelo menos não lhe custou nada!

De volta à Casa Zodiacal, foi logo para a cozinha, abrindo o pequeno pacote de "mato" que a velha havia lhe dado. Examinou o cheiro e o aspecto da erva, que não parecia assim tão ruim... Decidiu preparar a infusão.

Enquanto fervia a água, sentou-se à mesa, pensando se aquilo era realmente certo. Amava seu melhor amigo, mas será que, por insegurança, tinha o direito de violar seus pensamentos, tentando descobrir se o sentimento era recíproco? Estava na corda bamba. A curiosidade e a dignidade o puxavam, cada uma para seu lado, quase partindo-o em dois. A dignidade o levaria à dolorida incerteza... E a curiosidade matou o gato.

Mas os gatos têm sete vidas, não?

Despejou todo o conteúdo do pacote na caneca e esperou ficar pronto. Colocou gelo para que esfriasse até uma temperatura adequada para beber. O cheiro era bastante forte. Colocou um pouco do chá numa xícara e bebeu, sentindo o gosto amargo descendo pela garganta. Sentiu vontade de vomitar, a mesma que sentira quando viu o "sorriso" da velha. Fez um esforço para impedir que a bebida voltasse pela garganta. Para a próxima vez, adicionaria açúcar.

Agora precisava testar. Será que realmente conseguiria ouvir os pensamentos dos outros? Aioria e Miro deveriam estar treinando mais uma leva de crianças. Shaka estava recolhido em suas meditações. Camus, Shura e Saga cumpriam missões fora. Máscara da Morte, bem, não deveria ter uns pensamentos muito amigáveis...

Mas é claro! A última opção é sempre a melhor.

II

- Olá, minhas rosinhas! O inverno está chegando de vocês deverão ficar bem protegidas do frio!

- Boa tarde, Afrodite! – cumprimentou-o após aproximar-se mansinho, querendo dar-lhe um bom susto.

- Hã?! – o Cavaleiro de Peixes virou-se um tanto assustado – Bom dia, Aldebaran! "Mas que merda! Tem que chegar assim de fininho?"

- Funciona! – gritou, surpreso ao ouvir o que o outro dissera. Ou melhor, pensara.

- Hã? O que funciona? - Afrodite meneou a cabeça, encarando-o com um olhar desconfiado.

- Ora, nada... - Deu-se conta do que fizera, e tinha de consertar.

- Mas você gritou que algo funcionava.

- Gritei, é? Devo andar meio biruta...

- Ah... - "Meio?"

Era realmente fantástico! Estava ouvindo o que os outros pensavam! Ou, melhor, lendo o que os outros pensavam... Sentindo o que os outros pensavam... Ah, que se danasse! Estava fazendo algo do gênero.

- Então, está protegendo as rosas para o inverno?

- Sim, essa época é muito cruel para elas. Tenho que cuidar muito bem de minhas flores.

- Ouvi você conversando com elas antes de eu chegar...

- O que? – virou-se meio assustado – "Droga! Ele me ouviu conversando com as plantas! Deve estar pensando que sou retardado!"

- De modo algum!

- Como assim? - Afrodite meneou a cabeça novamente.

- Como assim o que?

- Não se faça de tonto! – Afrodite cruzou os braços, irritado. – Você disse "de modo algum". Porque você disse isso?

- Ora... é porque... porque... Não é nada importante, mas... Bom, eu acho que conversar com as plantas é bom e ajuda no crescimento delas! – disse a primeira coisa que lhe veio à cabeça para tentar ajeitar a situação.

- Mesmo? – perguntou o sueco, ainda confuso – "Mas que gracinha. Ele é sensível apesar de ser grandão".

- Sim, é muito importante!

- Obrigado, Aldebaran. Se eu precisar de ajuda, bem, posso contar com você? – perguntou, meio sem jeito. Gostava de cuidar de suas rosas sozinho, mas qualquer um riria ao vê-lo conversar com as plantas. Quem sabe o Tourão não tivesse uma mão delicada para flores?

- Oh, sim, se eu não estiver ocupado.

- Para o inverno eu já preparei quase tudo, mas precisarei de muita ajuda no verão. - "Quando você poderá desfilar sem camisa, todo suado pelos jardins, transpirando com esse corpo de macho. Nossa, eu estou com uma ereção." - Ei, Aldebaran? Aonde vai?

O Cavaleiro de Touro desceu as escadarias mais rápido que uma bala. Quando se deu conta, já estava na casa de Escorpião, onde Miro repousava após retornar de mais uma tarde de treinos.

- Aldebaran? - "Não! Agora não!"

- Ah, oi, Miro! – Aquele pensamento o deixara curioso... – Está ocupado?

- Eu? Não! Imagine... - "Vá embora logo! Está passando "Tomates Verdes Fritos" na televisão e eu não quero perder!"

Essa era boa! Miro vendo "Tomates Verdes Fritos"? Nem em sonho pensara isso! Mas seria interessante irritá-lo um pouco...

- Posso me sentar?

- Sentar? - "Pelamordedeus, vá EMBORA!!"

- É, pra gente conversar... Vi que terminou o treino mais cedo.

- Os meninos estavam cansados. - "Estou perdendo o começo do filme!"

- Bom, já que você não tem nada pra fazer, ficarei aqui a tarde toda, jogando papo pro ar, sabe?

- Na verdade eu lembrei que tenho compromissos inadiáveis para fazer!

- Mesmo?

- Mesmo! - "Sai daqui antes que eu te meta uma agulha escarlate onde o sol não bate!"

- Bom, também lembrei que tenho os meus... - Aldebaran ria-se por dentro.

- Puxa... - "Ufa... Legal! Agora tchau e bênção! Vá pela sombra!"

Saiu dali um pouco mais calmo, mas nem por isso, menos atento. Talvez, ouvir os pensamentos dos outros não fosse lá tão bom. Mas e quanto a Mu? Precisava ouvir os dele. Tinha de confirmar se seria seguro levar o que tinham adiante após a chegada do lemuriano no Santuário. Precisava de um sinal verde, uma placa de siga em frente... Qualquer coisa entre os pensamentos do parceiro que lhe desse firmeza para fazer a pergunta crucial!

Aos poucos, se habituava aos efeitos do chá. Era só uma questão de tempo até que pudesse ler os pensamentos das outras pessoas sem exteriorizar sua surpresa diante dos mesmos. Tinha que reconhecer: aquela situação era muito divertida!

Decidiu descer até os campos de treinamento para escutar os jovens recrutas. Talvez pudesse extrair algo interessante... Alguma ideia de aproximação, quem sabe? Afinal, jovens sempre pensavam em namoro e coisas do tipo. Alguns minutos de caminhada e já via alguns garotos cumprindo tarefas sob o comando de Marin.

- Vamos pessoal, vamos! Querem ganhar uma Armadura não? Então treinem com gosto!

- Como está indo, Marin?

- Ah, boa tarde, Aldebaran! Estamos indo bem... - "E agora, será que peço a ele?"

- Mesmo?

- Ah, sim! - "Peça! Não! Ele vai rir de mim..."

- Você parece preocupada.

- É que eu tenho que dar um recado urgente para Shina, mas estou ocupada com os garotos... - "Por favor, se ofereça para cuidar deles! Preciso trocar meu absorvente e tomar um remédio para cólica menstrual!"

Teve de se segurar para não rir.

- Quer que eu cuide dos meninos para você?

- Faria esse favor? Volto rapidinho!

- Claro! Sempre problemas!

- Obrigada, Aldebaran!

Marin o deixou rapidamente, embora não pudesse correr muito devido às dores. Touro teve de controlar o riso pois assumira a posição de comando! Aproximou-se dos garotos, que golpeavam rochas enormes, reduzindo-as a pedaços lentamente.

- Vamos lá rapazes! Rápido com isso!

"Mas que merda! Ainda vem um Cavaleiro de Ouro encher o saco!"

"Vou me esforçar pra ele contar para a senhorita Marin que sou bastante dedicado! Ela é tão sábia, tão imponente, tão bonita..."

"Quero dormir..."

"Eu tenho que ser forte... eu quero ajudar os outros... preciso quebrar a rocha..."

Ainda eram bastante jovens e tinham um bom tempo pela frente. Caminhou entre os rapazes, supervisionando e dando ordens para intensificar o treinamento, o que desagradou muitos deles, embora não externassem esse sentimento com palavras. Provavelmente, apenas um ou dois deles conseguiria uma armadura, apesar de todo empenho ou juventude. E isso não deixava de ser um tanto cruel...

Parou à sombra de uma árvore e ficou pensando na sensação que teria ao ler os pensamentos de Mu. Provavelmente, acabaria também ouvindo Kiki, o que seria realmente divertido. Mas e quanto a Mu? E se ele não nutrisse o mesmo? Seria melhor ouvir uma negativa de sua boca ou de seus pensamentos?

Marin retornou alguns minutos depois e o despertou de seus devaneios, tocando-lhe no ombro. O Touro quase que deu um pulo de susto, mas logo recuperou a compostura

- Muito obrigado, Alde. - "Que bonitinho! Estava sonhando acordado!"

- Ora, por nada! – tentava se manter sério perante a Amazona.

"Por Zeus, os meninos estão quase morrendo de tanto treinar!", pensou a ruiva, bastante assustada com o estado de exaustão dos pupilos, que estavam quase se arrastando pelo chão.

- Acha que peguei pesado com eles? – perguntou-lhe, pois realmente havia deixado de prestar atenção nos treinos quando Mu invadiu seus pensamentos.

- Ah, não, não, imagine! Eles têm de estar preparados pra isso! - "Mas é claro que pegou, coitados! Alguns não vão nem conseguir segurar os talheres para comer".

O moreno engoliu em seco. Realmente, Mu o deixava com a cabeça nas nuvens.

- Bom, acho que vou indo.

- Espere. Tenho algo para conversar com você.

- Sobre a festa surpresa para Mu?

- Ora, como sabia? Aioria deu a ideia nesta manhã. Está lendo meus pensamentos?

- Hahaha, mas que bobagem, Marin! – Deu um tapa na própria testa. Ainda precisava tomar mais cuidado para não confundir os pensamentos com as falas de seus companheiros do Santuário. – É que também pensei que seria uma ideia agradável.

- Hm, claro. Mas ele sugeriu que eu lhe procurasse, afinal, você era o único que tinha passe livre para Jamiel, não é?

- Sim, de certo modo.

- Então, você conhece Mu melhor do que todos aqui no Santuário. - "E se os boatos forem verdade, conhece até bem demais".

- O que quer dizer com isso? – Ele realmente estava empenhado em tentar, mas dessa vez não conseguiu disfarçar o espanto. Que histórias corriam pelo Santuário a respeito de ambos?

- Ei, não precisa ficar nervoso assim! – a mulher se assustou com a reação do Cavaleiro de Ouro – Apenas digo que vocês são bons amigos... "E amantes. Afinal, dizem que você voltava todo arranhado e mordido de Jamiel".

Então os outros não acreditaram que aquelas marcas se tratavam de ferimentos causados pelos obstáculos existentes para chegar até a Torre? Bem... Não era à toa que diziam que ele não sabia mentir.

- Então, acho que você conhece melhor o gosto do Mu. Poderíamos planejar a festa juntos, que tal? - "Daí depois vocês podem continuar a festa onde quiserem".

Nesse momento, Aldebaran desejou usar uma máscara como a das Amazonas para esconder o rubor de sua face.

- E então, o que me diz? - "Por favor! Ninguém quer ajudar, até o Aioria tirou o corpo fora... Bom, o Afrodite quer, mas não acho que vá deixar a festa ter a cara do Mu".

- Certo, certo. Eu ajudo. – ele disse, com um sorriso nos lábios.

- Ótimo! Amanhã nos encontramos para combinar os detalhes. Tenho que voltar ao treinamento dos garotos agora.

Ao se virar, Águia tomou um tremendo susto: não havia mandado os rapazes interromperem os exercícios, e agora, todos estavam caídos no chão, gemendo de dor e balbuciando coisas sem sentido.

- Ce-certo meninos, descanso de meia-hora! - "Isso se nenhum de vocês morrer, é claro".

- Bom, então eu vou indo! Amanhã conversamos mais a respeito da festa!

Touro prosseguiu seu caminho, contemplativo, observando as outras pessoas que iam e vinham. Um grupo de jovens guerreiros pensando em como o clima estava quente; duas meninas conversando amigavelmente enquanto se alfinetavam em pensamentos; um guarda que olhava discretamente para os seios expostos de uma serva que passava com uma cesta de frutas que, por sua vez, pensava no quão grosseiro e feioso era o guarda.

E ainda assim, volta e meia, Mu invadia seus pensamentos.

Então os outros Cavaleiros sabiam, ou pelos menos suspeitavam, que ambos tinham um caso. Isso era verdade: além de amigos, ele e Áries eram amantes de longa data. Haviam se envolvido desde antes da partida de Mu e mantiveram o relacionamento durante o exílio.

Entretanto, além do prazer e da amizade, nunca haviam usado a palavra "amor".

Não que a ideia de se declarar a Mu não tivesse lhe passado pela cabeça. Várias vezes, ponderou se o ariano aceitaria um pedido de namoro, mas lhe faltava a coragem para fazê-lo. Além disso, ao contrário de muitas pessoas regidas por sua constelação, Mu era extremamente racional e frio em certos aspectos. O sexo era um deles.

"-Não é justo eu te exigir fidelidade, Alde. Você está no Santuário, rodeado de gente. Mulheres e homens bonitos. Mais bonitos do que eu." - Áries lhe dizia, com a cabeça deitada no travesseiro macio, quase lhe escondendo os olhos, que não queriam encarar o moreno.

"Eu estou tranquilo, Mu. Não pense nesse tipo de coisa" - Ele respondia, apertando-o junto ao peito.

"É injusto, Alde" - Ergueu o pescoço procurando encará-lo.

"Não. Seria injusto com você" - Ele devolveu a declaração, lançando-lhe um olhar sério.

"Alde, nós somos amigos..."- Uma breve pausa. - "E somos amantes." - Outra pausa. - "Mas não somos namorados. Não posso te cobrar fidelidade".

"Eu não preciso de mais ninguém. Além do mais, você não se encontra com outras pessoas".

"Você acha que nós vivemos num conto de fadas" -Mu disse, com um pequeno sorriso no rosto. Subiu no colo do maior e beijou-o novamente, movendo os quadris sobre o membro adormecido, procurando despertá-lo novamente.

"Já disse que não preciso de outras pessoas"- As mãos fortes de Aldebaran envolveram a cintura de seu amante, deslizando até as nádegas, apertando-as com gosto. - "Além do mais, você dá conta do meu fogo direitinho..."

E avançou sobre o peitoral dele, buscando os mamilos rosados, arrancando um leve grito de prazer do lemuriano, seguido de uma risada.

- Nós não somos namorados. - Touro sussurrou baixinho, enquanto subia as escadarias de volta para sua Casa Zodiacal.

Embora amasse Mu com todas as forças, nunca havia lhe dito uma palavra, enquanto Áries preferia racionalizar o envolvimento de ambos devido à delicadeza da situação. Não, Mu não era um homem insensível. Havia sido treinado pelo Grande Mestre, num regime marcado pela rigidez e pelo isolamento. Por isso, era uma pessoa calma, pensativa, que não demonstrava o que sentia a ninguém.

Exceto a ele.

Os cabelos arroxeados escondiam a face, deixando à vista apenas parte de seus olhos e de sua boca. Levou a mão até a testa dele e afastou a cabeleira, admirando o sorriso sincero. O ariano ainda arfava baixinho após terem consumado o ato.

"O seu sorriso é tão lindo".

Mu corou e não lhe respondeu nada. Inclinou o rosto em direção ao dele, beijando-o na testa.

"Você devia sorrir mais. Tem fama de carrancudo no Santuário" - Aldebaran prosseguiu.

"Não me importo com o que os outros pensam" - O companheiro lhe disse, sem deixar de sorrir - "E eles não são dignos do meu sorriso".

"Ora, isso é uma tremenda maldade!"- Touro respondeu, soltando uma gargalhada.

Áries balançou a cabeça, colando a testa na do brasileiro, olhos fixos nos dele.

"Não é. Eu não sorrio para ninguém além de você. Nem mesmo para meu Mestre. Você é especial para mim. Conquistou o meu sorriso, Alde. Ele é apenas seu. "- Ele disse, com seriedade, deixando o taurino sem palavras. O moreno o olhava quase que como hipnotizado e, então avançou, beijando-o novamente.

Caiu a noite. Touro não saiu mais de casa. Buscava nas memórias as recordações daquele tempo. As escapadas às escondidas – que depois se tornaram conhecidas e, posteriormente, permissivas. O caminho tortuoso até Jamiel. O rosto de Mu quando o viu, pela primeira vez, do alto da Torre. E os abraços, e os beijos e...

Rolou na cama. Buscava em seus lençóis o cheiro do amante. Precisava tocá-lo. Precisava tê-lo novamente. Teve de saciar-se sozinho naquela noite. Uma, duas, cinco vezes.

- Mu... – ele sussurrava, mordendo o lençol para não gemer alto.

III

- Nossa, você está com uma cara péssima! Aliás, está assim há dias. Tem dormido direito?

Marin estava realmente preocupada com Aldebaran. O Cavaleiro estava sendo de grande nos preparativos para a festa de Mu: ajudou a definir o cardápio, a encomendar as bebidas, a organizar o salão. No entanto, as profundas olheiras do moreno lhe incomodavam. E o mais assustador: Ele parecia adivinhar tudo o que ela pensava, como se fosse mágica.

- Já te disse que estou bem. Não há motivos para se preocupar – Aldebaran respondeu, procurando acalmá-la, enquanto prendia a faixa de boas-vindas na parede.

A recepção era uma questão de honra: queria que tudo estivesse perfeito, nos mínimos detalhes. Não ia ser um evento muito grande. Apenas os Cavaleiros de Ouro e alguns poucos de Prata. Mesmo assim, queria que fosse perfeito.

Encomendou o tipo de vinho que sabia ser do gosto de Mu. Instruiu os cozinheiros a prepararem apenas as iguarias que agradariam ao companheiro. Cuidou para que o salão fosse decorado com flores nativas de áreas de altitude e que custaram um bom dinheiro na floricultura, mas ele não se importava. As toalhas eram de tonalidades semelhantes ao roxo, cor favorita do ariano.

"Ele se preocupa tanto com o Mu. Devem ser realmente namorados. Acho isso tão bonitinho". - Os pensamentos de Marin sobre a relação entre Touro e Áries eram constantes. Aldebaran acreditava ter aprendido a disfarçar bem suas reações ao ouvi-los.

Sentia um misto de alegria e dor: a relação entre ele e Mu parecia ser descrita como um grande romance, do qual todos pareciam nutrir certa admiração e uma pontada de inveja. Contudo, ele sabia que a palavra amor nunca havia sido menciona em nenhum momento.

- Bom, acho que acabamos por hoje. Amanhã teremos uma grande festa, de verdade! – Marin respondeu, sentindo-se satisfeita.

- Sim, isso é verdade. Ainda falta uma coisinha.

- O que é? - "Será que ele vai comprar um buquê de flores especial para Mu?"

- Vou preparar um doce do meu país que é o favorito de Mu. Chama-se brigadeiro.

- Que nem o nome da patente militar?

- Sim, isso mesmo. Ele foi criado para a campanha eleitora quando um militar do meu país foi candidato à presidência. Isso na década de 1950. Desde então, é iguaria de primeira necessidade em todas as festas de aniversário. O Kiki também adora, afinal, é quase como chocolate puro.

- Ah, parece delicioso. - "Chocolate? Nossa, eu adoro chocolate. Se eu pudesse..."

- Você quer vir junto? Pode experimentar enquanto eu preparo.

- Se não for incomodar... - "Chocolate! Chocolate!"

- Não, não. Vamos!

Os dois caminharam em direção à Casa de Touro, conversando sobre a festa e outros assuntos. Marin externou novamente sua preocupação com Aldebaran, e este sabia que era algo sincero, pois podia ler seus pensamentos. O taurino mantinha a postura firme e dizia que se tratava apenas de um certo nervosismo pela chegada de Mu.

A verdade, é que não conseguia deixar de pensar em como agir quando o amigo chegasse. E o pior: e se Mu não quisesse um relacionamento sério com ele? Afinal, agora que estava livre do exílio e podia se encontrar com outras pessoas, certo? Podia querer outros parceiros...

Procurou afastar tais ideias e se concentrar na conversa com Marin e nos preparativos do brigadeiro. A Amazona estava um tanto desconfortável por estar na Casa de um Cavaleiro de Ouro com quem não tinha tanta intimidade. Como bom anfitrião, Aldebaran procurou quebrar o gelo.

- Não precisa ficar tão tensa. Não há nada demais em minha casa.

- Acho que todo Templo de um Cavaleiro de Ouro emana respeito. Não é tão fácil se acostumar com a atmosfera do local. - "Nossa, que lugar mais bem arrumado. Quantos livros. E, oh, que quadros mais bonitos! Parece uma galeria de arte misturada com biblioteca".

Touro ficava contente com os elogios da amiga. Realmente se esforçava muito para manter sua casa limpa, confortável, além de lhe dar um toque pessoal. Dirigiram-se à cozinha, onde o Cavaleiro pôs-se a arrumar os ingredientes sobre a pia. Marin o observava atentamente. Não esperava que um homem como Aldebaran fosse um cozinheiro. Em pouco tempo de convivência diária, descobriu diferentes nuances na personalidade dele. O taurino sabia disso e, de certo modo, sentia-se orgulhoso e um tanto encabulado. Nunca esperava que seria capaz de despertar admiração por atitudes tão simples.

- Tome. Se vai ser minha ajudante, terá de se vestir como tal – ele lhe ofereceu um avental com uma grande rosa vermelha à frente, e outras pequenas rosas da mesma cor, que espalhavam sobre o tecido.

- Ah, que lindo! - "Nossa, eu devo estar parecendo uma colegial agora. Se bem que um homem que usa um avental assim só poder ser gay". - O que foi? Se engasgou?

- Não, nada... foi só saliva – Aldebaran tossia. Porque sempre tinham que implicar com aquele avental?

- Antes de começar, posso pegar um pouco de água? Estou com sede.

- Sem problemas. Tome – Ele abriu o armário e lhe entregou um copo – Pode se servir à vontade na geladeira.

Tinha tudo o que precisava: leite, chocolate em pó, leite condensado, manteiga e ovos. Gostava muito de cozinhar para Mu, especialmente quando fazia brigadeiro. Ainda se lembrava da primeira vez que servira o doce para o amigo.

"Eu não vou comer isso. Parece enjoativo. Olha só, é quase como chocolate puro!"- Áries fazia uma careta, enquanto mergulhava o dedo indicador na massa para avaliar a textura.

"Não seja enjoado! Você vai gostar. Anda, experimenta!"- Aldebaran insistia, empurrando a travessa de brigadeiro na direção do amante.

"Não! Meu Mestre disse que os doces são uma ótima maneira de se morrer pela boca!".

"É porque seu mestre nunca comeu o meu brigadeiro".

"Fico imaginando a cena: você chegando e oferecendo doces ao Grande Mestre em uma bandeja de prata. Ele se viraria para você e não diria uma só palavra. Lançaria aquele olhar que conhecemos bem, aquele típico para espantar cachorro sarnento. Depois, ele me alertaria: o seu amigo, o brasileiro, é escravo do açúcar" - Mu então lambeu o indicador, saboreando aquela iguaria. Não era de todo ruim.

"Bom, se é assim... vou comer sozinho!"- Afundou uma colher no doce, enchendo-a de brigadeiro e levando-a à boca, degustando lentamente.

"Ei, não coma isso tudo sozinho! Vai perder o seu tanquinho"- O ariano agarrava-se à cintura dele, rindo do próprio comentário.

"Não ligo. Sou gostoso de qualquer jeito!"- Mostrou-lhe a língua, fazendo uma careta divertida, enquanto continuava a comer.

"Pare com isso!" - Agarrou o braço do moreno e puxou a colher, que bateu de leve em seus lábios. - "Ora, que sujeira!", passou a língua sobre os mesmos, procurando remover o doce que havia melado seu rosto, sentindo o sabor de chocolate e leite condensado.

"Sim, muita sujeira!" - Touro comentou, falando de boca cheia apenas para provocá-lo.

"Isso... isso é bom".

"Eu te disse".

"Quero mais".

"Não, agora esse é só meu" - Afastou-lhe o recipiente de doce.

"Como assim?", Áries perguntou, indignado.

"Você não queria. Agora é só meu!" - O taurino o provocou, piscando.

"Não! Me dá!" - Mu ria, tentando tomar-lhe a colher.

"Quer mesmo experimentar, hum?"- Aldebaran o segurou pela cintura, virando-o de costas para si, agarrando-o num abraço firme.

"O que está fazendo?" - Surpreso, o ariano tentou reagir, mas parou quando viu a colher de doce sendo exibida diante de seu rosto. Provou-a novamente, saboreando o chocolate. - "É muito gostoso".

"É sim" - Touro mergulhou novamente a colher na panela de doce e então, passou-a ao longo do pescoço do amante.

"Cuidado! Seu desastrado!" - Mu ria, sentindo um arrepio com o corpo colado ao do brasileiro e a temperatura morna do doce contra a própria pele. Sentiu então a língua de Aldebaran percorrer seu pescoço, arrancando-lhe um gemido. - "Alde...".

"Relaxe. Deixe eu degustar o brigadeiro em você. Depois será a sua vez"- Disse ao pé do ouvido do companheiro, quase que num sussurro. Em seguida, o pegou pela cintura e o sentou sobre a pia.

"O que está fazendo?", o ariano gargalhava.

"Calma" - Deu-lhe um beijo quente, invadindo a boca do amante com a língua, buscando a dele com voracidade. Enquanto o distraía, levantava a túnica de Mu, expondo seu pênis levemente ereto - "Não está usando cuecas? Faz isso só pra me provocar"

E antes que o outro pudesse protestar, lambuzou-o com brigadeiro.

"Eu sei que você gosta. Humm!" - Áries lhe mordeu o lábio, em protesto, "O que vai fazer, seu pervertido?".

Touro não lhe respondeu. Sorriu, de modo malicioso, abaixando-se entre suas pernas...

- AAAHHH! CREDO! É ASSIM QUE VOCÊS COMEM ISSO? – Marin berrou, desesperada, dando um grande susto em Aldebaran.

- Oi? Como assim?

- Aliás, o que foi isso? Eu... eu assisti... você e o Mu... Parecia um filme!

- Do-do que está falando? – Touro agora estava realmente assustado.

- Daquilo! Mu, você e o brigadeiro!

- Espera aí, como vo... o que você tomou? – Touro avançou rapidamente em direção à visitante.

- F-foi esse chá aí! – Marin olhava-o atônita por detrás da máscara; aquele homem enorme parecia um caminhão prestes a atropelá-la.

- Não, não vou te atropelar! Não sou nenhum caminhão desgovernado, certo? Por Zeus! Você disse que ia tomar água!

- Eu perguntei se podia tomar o chá, mas você não respondeu e, de repente, eu estava assistindo a... aquilo! Parecia um filme pornô misturado com programa de culinária! E como sabe que pensei que você ia me atropelar como um caminhão?

- Ah... bem...

- O quê? O chá tem uma droga que faz ler mentes? Não! Isso é muito maluco!

"Já que você pode ler meus pensamentos, podíamos conversar em silêncio. Ninguém mais precisa saber disso, certo?" – Aldebaran tentou lhe pedir, embora Marin ainda estivesse bastante alterada.

- Eu não estou alterada! Mas que diabos vocês homens tem de achar que as mulheres estão sempre alteradas! – Ela se irritou, dando uns tapas fortes nos ombros de Touro,. – "E eu não vou conversar por pensamentos com você! Isso aqui não é 'O Iluminado!'"

"Você acabou de fazer isso!"

"Não, não fiz!" E pare de invadir os meus pensamentos! Você me drogou com esse chá! – a Amazona alternava a conversa entre as palavras que dizia e aquilo que pensava em dizer, ainda sem acreditar naquela situação.

- Eu não te droguei! Você disse que ia pegar água! – Aldebaran gesticulava nervosamente, sem saber o que fazer para acalmar aquela mulher. Ela ainda ficaria ainda mais irritada se soubesse que ele já estava usando o chá há alguns dias.

- Como assim, alguns dias? Você leu tudo o que eu pensei durante os preparativos pra festa? E sobre a minha cólica menstrual? Você é um porco! "Bom, pelo menos eu estava certa sobre a questão do Mu".

- Não – Touro respondeu, baixinho, quase inaudível.

- Há algo errado aqui, senhor? – era um dos servos responsáveis pela vigia diurna, que parou à entrada da Casa Zodiacal e ajoelhou-se em sinal de respeito – Eu ouvi gritos e resolvi verificar se está tudo bem.

Marin não sabia como reagir. Seu anfitrião estava amuado, encolhido na cadeira da cozinha. Tomou a frente.

- Não se preocupe. Sou a Amazona de Águia. Estávamos preparando algo quando vi um inseto e me assustei.

- Um inseto? – o homem perguntou, incrédulo.

- Sim, um inseto. Uma barata. Mas já está tudo bem! O Cavaleiro de Ouro a matou.

- Ah, sim senhora. Desculpe incomodar. - "Mas que caralho: colocam uma mulher com medo de barata para defender o Santuário".

- Ela voou, sabia? Você já viu uma barata voando? Também ia gritar se visse!

- Ei, calma! – Aldebaran disse, um tanto rude, porém logo se acalmou e completou em pensamentos. – "Não vai querer chamar mais a atenção dos outros. Essa situação já está bastante esquisita".

- Certo – Marin assentiu.

Agora que podia ler sua mente, entendeu como funcionava o relacionamento de Aldebaran e Mu. O taurino nem mesmo se incomodava de tentar camuflar os pensamentos: expunha-os como um livro aberto.

"Então... você não sabe se o Mu realmente gosta de você? Digo, a ponto de te namorar?"

Albebaran puxou uma cadeira e se sentou. Não conseguia encarar Marin. Toda aquela situação o deixara bastante nervoso; e o chá já não era mais um segredo. Além disso, pelo menos uma pessoa já sabia a verdade sobre seu relacionamento com Áries. Eles tinham uma forte amizade e um caso tórrido. Mas um relacionamento amoroso nunca havia se estabelecido oficialmente.

"Mu sempre tratou isso de modo bastante racional. Dizia que evitaria sofrimentos para ambas as partes", Aldebaran lhe respondeu, sem erguer a cabeça.

"Acho que você foi extremo demais, Alde. Não conheço o Cavaleiro de Áries, mas você deve pensar que a situação agora é outra. Não se trata mais do exílio e vocês estarão juntos".

- Vamos cozinhar – disse o Cavaleiro, desviando do assunto, caminhando em direção ao fogão.

"Você é realmente um cabeça-dura! Mas tudo bem, eu não tenho o direito de me meter na sua vida. Faça o que achar necessário" – Marin bufou de raiva, tirando o avental e jogando-o sobre a mesa.

Aldebaran colocou a panela no fogo alto e despejou os ingredientes na mesma, começando a mexer. Não se importava com o comportamento da Amazona. Usaria o chá e era sua decisão final.

"As coisas não são tão simples. Mu encontrará um outro Santuário, conhecerá outras pessoas. Antes ele só tinha a mim".

"Ele tinha a você porque te escolheu!" – Águia gritou em pensamento.

"Como pode dizer uma coisa dessas? Você não o conhece!" – esbravejou Touro, finalmente se virando para a Amazona.

"Aioria me contou. Disse que foi com você a Jamiel uma vez, pois você era a única garantia de que poderia adentrar aquelas terras. Ele descreveu Áries como uma pessoa extremamente fria, mas cuja a personalidade mudava quando você estava perto".

Aldebaran não soube o que responder. Ele sabia que Mu lhe considerava uma pessoa especial, mas não deixava de acreditar que isso era fruto das circunstâncias.

Afastou o pensamento. Não. O ariano agora teria uma nova vida e, por mais que quisesse, Touro não poderia afastá-lo das possibilidades de conhecer novos parceiros. Seria injusto. Além disso, acreditava que a amizade seria posta em risco caso ele insistisse num namoro sem que esta fosse a vontade de Áries.

- Isso vai queimar. – Marin o interrompeu, indo até o fogão e tomando-lhe a colher das mãos para mexer a mistura do brigadeiro – Venha, me ensine a fazer. "Eu acho esse tipo de pensamento uma grande bobagem da sua parte, Alde. Mas se usar esse chá te deixa mais tranquilo, vá em frente".

- Ah, certo. Vou adicionar um pouco de leite. "Você não entende, Marin. Ele é a pessoa mais importante no mundo para mim. Se ele não corresponder ao meu amor, quero manter a amizade. Não posso arriscar perder tudo".

- E devo mexer assim? Mais rápido? "São coisas da vida, Alde. Mas sabe, pelos boatos que correm pelo Santuário, todos acreditam que você e o Mu já são mais do que casados".

- Isso. Cuidado para não grudar no fundo. "O que os outros dizem não me interessa. Eles não sabem nada sobre o nosso relacionamento".

- O cheiro é bom. Mal posso esperar para provar. "Você é inseguro demais. E eu não deixo de imaginar esse chá como um tipo de trapaça".

- Assim está bom. Vamos colocar nessas travessas e guardar na geladeira para resfriar. "Como assim, uma trapaça?"

- Demora muito para isso? Estou com muita vontade de provar. "Pelo que sei, nunca ouvi falar de um relacionamento que começasse apenas porque uma pessoa leu os pensamentos da outra. Não funcionou assim entre Aioria e eu".

- Não muito. Uma meia-hora. Se comer muito quente, pode causar dor de barriga. "Com vocês foi diferente. Todos sabiam que vocês deveriam ficar juntos".

- Bom, isso seria muito desagradável. "Oh, sim, e onde mais ouvi as pessoas comentando sobre um casal nesses mesmos moldes? Ah, lembrei! Você e Mu!"

Aldebaran bateu a porta da geladeira com força. Marin deu alguns passos para trás, assustada com aquela reação violenta. Touro então se apoiou sobre o eletrodoméstico e fechou os olhos, sentindo raiva de si mesmo.

"Alde, não se crucifique tanto".

"Naquele dia em Jamiel, no dia do brigadeiro... Eu estranhei o jeito do Mu agir. Ele nunca criticava a minha comida, sempre aceitava tudo de bom grado. Depois, à noite, ele me contou que viu em minha mochila uma advertência por deixar o Santuário. Ele me disse que não queria mais que eu voltasse lá e que estava sendo desagradável para que eu me afastasse dele, pois ele temia por minha vida".

"E você parou de visitá-lo?"

"Eu passei a viajar com uma frequência ainda maior, Marin" – Touro lhe respondeu escondendo o rosto – "No começo, ele brigou comigo, tentou me expulsar de Jamiel. Quase me matou, o desgraçado! Mas ele viu que eu não ia desistir".

A Amazona ficou surpresa. Aquele gigante estava desmoronando a sua frente, sofrendo por amor. Abraçou-o com cuidado e lhe ofereceu um ombro amigo, esperando que o grandalhão se acalmasse. Os pensamentos do Cavaleiro se embaralhavam em uma confusão imensa. Por meia hora, conversaram em silêncio, a mulher tentando lhe injetar um pouco de ânimo.

- Bom, eu devo ir agora. "E tente se controlar, certo? Creio que Áries ficará extremamente feliz ao vê-lo amanhã".

- Espere – Touro foi até a geladeira e pegou uma das travessas, entregando-a à Amazona – Essa é pra você.

- S-sério?

- Sim, por me ajudar hoje. "E por tentar me entender".

- Muito obrigado, Alde! – ela sorriu e o abraçou forte, aceitando o presente – "E por favor, não se martirize tanto. As coisas correram melhor do que você imagina".

- Não há de que. "Prefiro estar preparado para o pior, Marin".

- Preciso ir. Nos vemos amanhã na festa. "Se é assim, Alde, vou te dar um conselho. Não pense que estou querendo te desanimar, mas lembre-se: se você descobrir que Mu não está interessado em namoro, seja através da boca ou dos pensamentos dele, a dor que você sentirá será a mesma".

- Boa noite.

Touro se recolheu cedo, mas demorou a dormir. Não tinha pensado no que faria caso Mu não retribuísse seus sentimentos. Precisou tomar um calmante, porém, acordava de hora em hora, por conta dos pesadelos.