SODOMA

by sniperpadalecki

Capítulo I

Run and tell all of the angels

Corra e conte a todos os anjos

This could take all night

Isso pode levar a noite toda

Think I need a devil

Acho que preciso de um diabo

To help me get things right

Pra me ajudar a acertar as coisas

O sino badalou três vezes indicando a hora daquela tarde ensolarada. Em frente a Catedral Metropolitana, em Roma, a escada estava lotada de fiéis que deixavam a missa de sétimo dia de um político importante da capital italiana.

A batina branca do jovem padre era agora retirada e colocada no quarto ao lado do altar, devidamente pendurada em um cabide dourado. Tinha apenas 28 anos, era o padre mais jovem que já houvera passado pela paróquia e sentia-se orgulhoso por servir a Deus naquela cidade tão significativa para a igreja católica, apesar de ainda não ser de sua responsabilidade total.

O padre Jared Padalecki, um americano recém-chegado à Itália, ainda estava se acostumando com o clima, com o jeito mais caloroso das pessoas e principalmente com o idioma. Voltou ao à sua vestimenta preta habitual, olhou-se no espelho quando a porta do armário de madeira se fechou e, com o típico olhar calmo, mirou a porta de saída, onde uma mulher estava parada e parecia aflita.

- Pois não? - A voz dele era calma, doce, extremamente reconfortante. - Posso ajudar a senhora em alguma coisa?

A moça não respondeu. Apenas andou na direção do padre e o abraçou chorando e, em seguida, ajoelhou-se diante dele, segurando sua mão, típico gesto de respeito que alguns fiéis tinham em relação aos padres católicos. Jared não negou que até se sentiu um pouco constrangido pois ter uma mulher que poderia muito bem ser sua mãe ajoelhada diante de si, era algo perturbador para ele, especialmente porque ela estava chorando.

- Levante-se, senhora, por favor. - Ele pediu gentilmente e, a segurando pela mão, ajudou-a a levantar-se. - Somos todos iguais perante ao Senhor.

- O senhor é um representante divino Dele, padre... - Ela respondeu com extremo respeito. - Espero que não se incomode.

- Absolutamente não. - Ele sorriu tranquilizando a mulher e, só de estar na presença daquele homem de fé, ela inclusive sentia-se mais confortada. - O que a trás até aqui? Por que está chorando?

- É meu filho, padre... - Ela começou e logo as lágrimas voltaram a brotar de seus olhos. - Há alguns meses ele foi diagnosticado com um tipo raro de câncer no coração... - Ela continuava e Jared ouvia atentamente enquanto a guiava para uma cadeira pedindo num sussurro pra que ela se sentasse. - Desde então ele... desistiu de viver, padre...

Hook me up a new revolution

Me arrume uma nova revolução

'Cause this one is a lie

Porque esta é uma mentira

We sat around laughing

Nós sentamos e rimos

And watched the last one die

E assistimos a última morrer

- Eu sinto muitíssimo, senhora. - Ele respondeu com ar triste. - Se houver alguma coisa que eu possa fazer, estou aqui para ajudar. - Ele respondeu segurando nas mãos trêmulas da mulher.

- Eu já rezei todas as orações que conheço, ele não quer ver médico algum ou frequentar qualquer grupo de ajuda que seja... - Ela limpou as lágrimas que continuavam a cair. - Não quer nem sair de seu quarto...

- Não há nada que o motive? Um esporte, algum hobby? Quem sabe uma namorada? - Jared era bastante prestativo.

- Ele é pianista, padre. - Jared pode jurar que viu um brilho nos olhos da mãe do rapaz. - Piano é sua paixão desde criança... Já estava indo estudar em uma escola clássica... Mas agora parece que nem isso mais tem sentido para ele... - Ela baixou os olhos triste. - Ele não toca desde que soube da doença... - Ela fez uma pausa e encontrou os olhos bondosos do padre, que agora pareciam bem preocupados. - Eu estive pensando... Gostaria que o senhor fosse conversar com ele, o que acha?

Um dos motivos pelos quais Jared decidira seguir o caminho de seminarista, era justamente o poder de ajudar as pessoas de uma forma mais espiritualmente acessível. Há quem diga que ele poderia ser o mais ingênuo tipo de ser humano, mas ele não se importava. Preferia viver acreditando ainda nas pessoas do que ficar sem esperança.

- Eu acho que eu poderia fazer isso sim. - Ele respondeu calmo e ficou incrivelmente feliz por ver que, finalmente, o rosto daquela mulher chorosa agora aprecia repleto de esperanças.

x.x.x

I'm looking to the sky to save me

Estou procurando um céu pra me salvar

Looking for a sign of life

Procuro por um sinal de vida

Looking for something to help me burn out bright

Procuro por algo que me ajude a brilhar forte

Jensen Ackles estava deitado na cama, com cobertas até o rosto. Não, ele não havia chorado, nem rido. Aqueles sete meses foram de total escuridão e caos interno, ele pareceu ter adotado uma expressão única, não era tristeza, não era pena de si mesmo, não era angústia e nem falta de esperança. Era apenas... nada. Nada além de uma indiferença profunda a tudo que estava à sua volta e todos.

Duas batidas na porta do quarto escuro e um rastro de luz correu pra perto de sua cama. Ele preferiu fingir que estava dormindo, quem sabe, quem quer que fosse, iria embora.

- Filho? - A voz de Donna era um sussurro. - Posso entrar?

Nada. Nenhuma resposta... Quem sabe ela fosse embora.

- Jensen. - Ela repetiu um pouco mais alto. - Filho, acorda... - Ela entrou de vez no quarto. Dirigiu-se até a janela e abriu as cortinas, iluminando o ambiente sombrio.

Ela não iria embora.

- O que foi? - Ele tirou as cobertas do rosto e levantou-se, sentou sobre a cama, encarando a mãe um pouco enfezado, com o cenho franzido devido a claridade. - Por que perde seu tempo abrindo-as se quando a senhora sair, eu vou fechar de novo?

- Jen, tem uma pessoa que eu gostaria que você conversasse. - Ela começou, ignorando o comentário do filho. Sentou-se na cama ao lado dele e Jensen apenas suspirou impaciente ao ouvir aquilo. Ela nunca desistia.

- Não quero, mãe. - Ele respondeu categórico. - Já disse que só quero ficar sozinho. Vou morrer logo mesmo, então, é bom irem se acostumando com a minha ausência...

- Jensen Ross. - Ela quase vociferou ao ver o filho falar daquele jeito. - Por favor, filho... Vamos encontrar um jeito, você não pode desistir... Quero apenas que você encontre um novo motivo pra continuar lutando...

- E pra que? - Ele não podia se conter. Era mais forte que ele. - Tenho menos de 5 meses, segundo os médicos e, não há nada que possa ser feito.

- É a última vez, Jensen. - Bem que ela poderia chorar, mas encontrou forças em algum lugar naquele coração de mãe que aguenta tudo e segurou as lágrimas. - Se dessa vez você realmente ver que não vai adiantar, vou te deixar em paz... - Ela fez uma pausa e encarou os olhos verdes opacos do filho. - Vou encarar isso como um último pedido e, que Deus me ajude, vou te deixar em paz.

Jensen nunca viu sua mãe tão firme antes. Durante os sete meses, ela implorou pra que Jensen visse médicos especialistas, psicólogos, psiquiatras, grupos de ajuda de todos os tipos, mas não. Ele não fora a mais que dois ou três encontros e consultas. Nada resolvia. Ele achou que sua mãe tinha uma boa cartada na manga pra dizer que aquilo era um ultimato.

- E de que se trata? - Por uns instantes, ele até ficou curioso.

- Padre Jared virá aqui pra conversar com você. - Foi a resposta dela.

Jensen balançou a cabeça negativamente e sorriu de um jeito apagado e irônico.

- Vai me obrigar a conversar sobre Jesus com algum velhote fanático e acha que isso realmente vai me ajudar? - Jensen mal acreditava na proposta da mãe. - Você não pode estar falando sério.

- Por favor, Jensen. Se não quer fazer por você, faça por mim. - Ela insistiu. - Como o meu último pedido.

- Que seja. - Ele respondeu apático. - Mas não tenha esperanças, não quero que se decepcione comigo mais uma vez. Não é sua culpa se Deus me odeia.

- Deus não te odeia, Jensen! - Ela respondeu enérgica.

- Seu filho vai morrer e ele parece que não está dando a mínima e você ainda O defende? - O sarcasmo estava de volta.

- Existem várias maneiras de interpretar sua situação, meu filho. - Ela preparava-se já para deixar o quarto. - Se você escolheu a pior delas, não há nada que eu possa fazer. Mas de repente o padre Jared saiba.

Ela deixou o quarto e Jensen resolveu que não iria perder seu tempo discutindo mais uma vez sobre o lado extremamente religioso da mãe. Um padre? Realmente Jensen tinha que admitir que ela estava totalmente desesperada.

I'm looking for complication

Procuro por uma complicação

Looking cause I'm tired of lying

Procuro porque estou cansado de mentir

Make my way back home when I learn to fly high

Fazer meu caminho de casa e aprender a voar alto

x.x.x

Na manhã seguinte, o padre Jared acordou em seu horário habitual, por volta das sete da manhã. Fez suas orações, tomou seu banho e fez toda sua higiene pessoal. Sentou-se à mesa com seu café da manhã fresco e rezou novamente em agradecimento.

Ele sentia uma vibração divina de que seria um dia diferente. Talvez pelo sol estar mais ameno aquela época do ano ou por causa do horário, a brisa da manhã lhe fez sentir bem quando saiu de casa rumo à casa dos Ackles. Avisou seu sacerdote superior que iria fazer uma visita a pedido de uma fiel e apenas lhe pediu instruções sobre o endereço que ela lhe passara.

Ele vestia preto, é claro, apenas o sinal branco de pároco no colarinho, vestiu um casaco igualmente preto e pegou sua Bíblia. Seus cabelos eram escuros e ligeiramente longos. Sua jovialidade raramente fazia as pessoas acreditarem que ele, de fato, era padre. Seu porte era de um atleta, pois cuidava da saúde, e seu olhar expressava uma confiança rara.

Ele foi a pé, admirando a paisagem da bela Roma aquela hora da manhã. A maioria das pessoas o cumprimentavam e algumas lhe pediam bênção, como algumas crianças, obviamente ensinadas de certo por seus pais. As mulheres baixavam os olhos em respeito e os homens tiravam o chapéu em forma de cumprimento.

Ser padre em Roma era ser quase uma celebridade poderosa. Jared nunca entendera essa posição, pois sentia exatamente o oposto. Sentia que era um servo. De Deus e das pessoas.

Não foi difícil encontrar a casa dos Ackles. Era simples, tinha um jardim bonito em frente, com algumas flores no pequeno canteiro no centro. Era grande, tinha dois andares e uma garagem ampla. Jared entrou na varanda e tocou a campainha duas vezes até que alguém lhe atendesse.

Donna abriu a porta e sorriu ao ver de quem se tratava. Jared retribuiu simpático o sorriso.

- Muito obrigada por vir, padre. - Ela pegou na mão direita de Jared e beijou, em forma de respeito.

- Não precisa agradecer, senhora. - Jared disse calmo, mas achando graça do certo fanatismo que Donna ostentava. - Me pediu e aqui estou.

- Entre, por favor. - Ela abriu mais a porta dando espaço para que ele passasse. - Jensen está no quarto, vou chamá-lo.

Jared assentiu com a cabeça e Donna subiu as escadas a fim de chamar o filho. Jared olhou ao redor da sala, algumas fotos de família. Imaginou que o menino com boné e taco de baseball fosse Jensen, que na foto, não devia ter mais que dez anos. Olhou duas fotos num outro canto acima da lareira que mostrava uma moça loira, acadêmica formada e outro homem, também de beca.

Um belo piano de cauda, que parecia não ser usado há um bom tempo.

Ouviu o que parecia ser uma breve discussão no andar de cima e alguma porta bater. O padre parou de andar e fixou os olhos na escada, já que parecia que alguém descia.

Donna desceu um pouco atordoada, acompanhada de Jensen, que estava com a barba grande, uma camiseta azul, simples, e jeans rasgado perto dos joelhos. Pés descalços e uma cara de quem acabara de acordar e não havia sequer escovado os dentes ou arrumado os cabelos.

Jared nem quis pensar no desafio que tinha pela frente. Ele não esboçou qualquer reação negativa, apenas esperou os dois se aproximarem.

- Padre, esse é meu filho Jensen, de quem lhe falei. - Donna apresentou o filho extremamente sem graça, pelo estado em que o homem se encontrava.

- Muito prazer, Jensen. - Jared sorriu de leve, simpático, mas Jensen não esboçou nenhuma reação. Apenas pôs as mãos nos bolsos e encarou Jared como se ele fosse o ser humano mais entediante de todos.

- Vou deixá-los a sós. - Donna se retirou e voltou a cozinha, deixando Jared sozinho com o filho.

Jared tentou ler as feições de um Jensen que o encarava fixamente agora, como se esperasse assustar o homem e que ele fosse embora logo e nunca mais voltasse. O loiro deu alguns passos em direção ao sofá e sentou-se, preguiçosamente, entediado. O padre sentou-se na poltrona, de frente pra ele.

- Dormiu bem, Jensen? - Jared resolveu dar início a conversa. Ackles apenas continuou em silêncio.

Ele inclinou-se de leve para frente, a fim de encarar Jared melhor. Talvez intimidá-lo, mas o padre não se moveu, continuou esperando uma resposta.

- Você não é velho. - Jensen disse sorrindo sem achar graça.

- Assume que todos os padres são velhos? - Jared não se sentiu ofendido ou acuado com a malcriação.

- A maioria é. - Jensen rebateu.

- Acho que devo ser a exceção então. - Jared respondeu sereno.

- Você deve ser louco. - Jensen disse olhando sério, medindo Jared dos pés a cabeça.

- Por que você acha isso, Jensen? - O padre pareceu intrigado pra saber a resposta.

- Tem uma vida toda pela frente e... resolve ser padre? Quem em sã consciência faz isso? - Ackles não era lá muito fácil. Na verdade, ele pensou que sendo ofensivo, faria Jared desistir. Mas o impressionante é que ele não estava conseguindo irritar o padre.

- Escolhi dedicar minha vida ao Senhor, por que acha que isso é um desperdício? - Jared realmente queria saber, não era apenas uma pergunta com intuito de se impor.

- Não foi isso que eu disse... - Jensen riu, estranhando a colocação.

- Foi isso que quis dizer. - Jared permanecia com o mesmo sorriso.

- Quer dizer... Você poderia viajar, ter quantas mulheres quisesse... digo, você é um cara bonito... - Jensen disse e o moreno arqueou as sobrancelhas surpreso, Jensen imediatamente ficou sem graça. - Quer dizer, se eu gostasse de homens, claro... - Ackles falava e depois pensava. Agora iria querer o que? Discutir homossexualismo com um sacerdote? - Mas não, você prefere guiar missas e se vestir desse jeito engraçado...

- Gosto de saber que pensa assim, Jensen. - O padre suspirou e enfim percebeu que não era bem um caso perdido. - Ainda vê o valor da vida... Ainda quer aproveitar a sua.

- Que acaba daqui 5 meses, você quer dizer? - A ironia foi clara, mas não abalou o padre.

- Como tem tanta certeza?

- Os médicos têm.

- Deus é quem sabe, Jensen.

- Ok, ok, padre... corta essa! Se veio aqui pra me dar catequese, não estou interessado. - Ele tentou irritar Jared mas foi ele quem acabou irritado, principalmente porque Jared sorriu aberto agora.

- Não é isso, Jensen. Mas se acho que você não é a pessoa mais aconselhada pra me falar sobre desperdício de vida. E já que você tem tão pouca, por que não a aproveita de outra maneira?

- Se não veio me dar catequese, veio me dizer o que devo fazer com o que me resta de vida? - Jensen suspirou entediado.

- Pois é. - Jared respondeu como se fosse a coisa mais normal do mundo e Ackles ficou um pouco surpreso com o que pareceu ser prepotência do padre.

- Ah não me diga! E que te faz pensar que tem esse direito?

- Talvez o fato de você mesmo não saber o que fazer, me parece que alguém tem que vir até aqui te dizer, estou errado? - Jared sorria ainda, mas era calmo, não era pretensioso.

- Cara, você é meio maluco, não é? - Jensen cogitou de verdade que o padre fosse um pouco desequilibrado.

Para Jared, não importava, a conversa estava fluindo e, para ele, era isso que importava, Jensen estava falando e parecia cada vez mais envolvido na conversa, parece que ele gostou de saber que alguém realmente queria ouvi-lo, e não apenas fazê-lo por obrigação, por estar sendo pago para ouvir os problemas dos outros.

Donna, pela primeira vez em meses, sentiu a chama da esperança voltar ao seu coração quando viu o filho, pelo menos, não mandando o homem embora. Literalmente um enviado de Deus, ela pensou.