III - Despertando a ira de um certo matrimônio

O conselho estava formado, de certa forma não havia outro modo de definir os rostos dos presentes: amedrontados.

Eram raras as vezes em que ela, pedia uma reunião no conselho: brigas com o marido, desentendimento para com os pais, o desejo variante de mandar algum filho indigno para o Limbo dentre outros; Mas os presentes não podiam negar, era a primeira vez que interrompia uma batalha contra Athena.

Era fato consumado e a muito conhecido por todos, Hera odiava Athena com todas as suas forças. Dentre as inúmeras razões da deusa estavam no topo da lista: Cavaleiros bonitos de mais, e seu domínio sobre a terra com Nike; Outra insuportável em sua opinião.

O Juri era formado da seguinte forma naquela noite: Hera e Cronos pelas acusações a serem feitas. A senhora dos deuses ainda usava as trancinhas infantis, mas de fato seu humor não estava para brincadeiras, era impossível saber exatamente o que ela queria dizer ao arrumar-se daquela forma. A franja caindo displicente pelo olhos azuis, no instante frios como o inverno dos pólos. Trajava uma túnica cor-de-rosa simples, o que deixava os presentes ainda mais surpresos, ela sempre se arrumava o mais formalmente possível, mas agia como se fosse uma adolescente mimada em uma reunião de família para decidir se podia ou não chegar depois das dez.

Seu pai diferente da filha tinha os cabelos negros bem penteados e mais oleosos que o normal ao tentar fazer com que os pequenos fiozinhos ficassem quietos. Os olhos azuis cintilantes fitavam os filhos que chegavam e a esposa Reia sentada com o caçula Zeus. Trajava uma túnica negra afivelada pela cinta de couro dourada, o que era dentro do conselho o mais esperado dentro das formalidades de um titã. Seus olhos fixos na porta a sua frente, por onde possivelmente entrariam Caos ou as Moiras para julgarem a situação.

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Estava sentada em uma poltrona qualquer da mansão Kido. O terninho da reunião substituído por uma leve frente única floral, coisa que não lhe caía bem, mas Saori e as outras lhe forçaram a usar. O vestido em um leve tom de azul era trançado no pescoço, com a barra à um palmo para baixo do joelho de babadinhos em forma de coração, era estampado de flores do campo, lavanda talvez.

Pelo menos é azul; pensou depois de recostar-se melhor na poltrona e observar a sala onde estava.

A sala fresca de cortinas abertas, os tons cremes e rosa bebê das paredes deixavam o local mais claro e convidativo. O verão naquele país tão diferente do seu, era confortável por causa do sol, nem quente, nem frio, característicos do início da estação.

- Será que Freya está bem mesmo? - Se questionava quanto a ter deixado a irmã sozinha com tantas responsabilidades. Mas acabou por tirar tais pensamentos da cabeça ao perceber a companhia na sala.

Os cabelos novamente soltos, os azuis intensos que fitavam o local num mesclo de perdido e indeciso. Não usava o paletó e a gravata relaxada a combinar com o suspensório lhe davam um certo charme jovial.

Caminhou até o meio da sala passando por ela, mesmo sem a olhar sua simples presença já lhe dava um certo incomodo, a ser percebido sem nem mesmo olha-la. A jovem levantou-se tencionando sair do local, quando decidiu ser mais direto.

- Espero sinceramente que algum dia ainda possamos ter um relacionamento mais amistoso Hilda. - A palavra causava a jovem certo frio no estômago.

- Desculpe por ainda não conseguir ser amistosa ou ignorar o fato de que foi você a causar a morte de todos os que me eram importantes Julian. - O sarcasmo era de fato encantador, deixava o rosto da jovem ainda mais desenhado; pensou tentando não ignorar o fato de que ela estava certa.

Por um momento ficaram a se encarar de uma forma acusadora e violenta. As cortinas balançavam ao sabor do vento leve que acabava por entrar indiscreto fazendo a jovem mudar os rumos de seu ódio para arrumar os fios que lhe tocavam o rosto e caiam sobre os olhos.

- Tenha certeza de que se pudesse voltar ao passado isso não se repetiria. - Falou sentado-se em um espaço do sofá azul marinho. - Mas, mudando de assunto.

Incrível como pode ser tão dissimulado e irritante; pensou de olhos arregalados pelo tom e o modo como ele abordava "outro assunto", como se tivessem algo mais a discutir.

- Gostaria de tomar café, ou um chá comigo? - O tom indescritível da voz, e os olhos azuis a fita-la irritantes. - É claro, não é um encontro se é o que pensa, mas sinceramente, não gosto de estar cercado por certos...

Parou de falar ainda com certo desconforto, ao ouvir passos firmes no corredor. A jovem de melenas negras passeava distraída ao parar enfrente a porta.

- Incomodo? - Perguntou ignorando o olhar fuzilante do jovem francês, escondido pela porta aberta.

Aquela situação já estava em sua opinião muito constrangedora. Saiu da sala a passos firmes na tentativa de ficar em seu quarto quando fora alcançada no alto da escadaria por duas jovens "irmãs" que não mais se desgrudavam.

- Hilda querida. - Aquele olhar divertido... - Sente-se melhor, deseja alguma coisa, esta confortável? - Aquela chuva de perguntas sobre como se sentia... - Onde vai num dia de sol tão lindo como esse? Aquele quarto pode ser de verás bonito, mas não pensas realmente em ficar nele o dia inteiro não é? - Sim, era mais uma tentativa de faze-la sair de casa.

Agora só tinha duas opções, elas caminhavam em sua direção na tentativa de arrasta-la escada abaixo. Uma opção pior que a outra, Saori alisava o cabelo azul da jovem numa tentativa de querer arruma-la e logo rumariam para cima a fim de se "emperiquitar", como dizia o gêmeo da loira. Ela podia ir a segunda compra do dia, em uma boutique qualquer, a jovem francesa falava de jóias e brincos, com certeza não iriam a uma butique. Ou podia bancar a camicase e se livrar delas por uma tarde inteira, os outros três observavam divertidos a cena ao pé da escada.

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Não muito distante de tudo o que se passava na sala de reuniões o rapaz caminhava apressado. Deveria fazer isso sem ser visto por ninguém. Sabia o risco que corria em tirar lhe aquilo, mas conhecia bem sua senhora e ela com certeza já tinha algum plano engenhoso para aquele absurdo.

Os cabelos vermelhos em forma de cachos, curtos até pouco abaixo dos ombros, os olhos azuis brilhantes e intensos, os poucos que passavam apressados se assustavam com tanta seriedade, raramente vistas no jovem olímpico. Hermes estava com raiva.

Raiva seria com toda certeza um elogio, ou uma forma mais branda e simples de dizer aquilo. Estava com ódio, poderia ir bem além de ódio, ira talvez, mas como todas aquelas formas de pensar eram para o jovem no momento pequenas, e por mais negativas que fossem não conseguiriam expressar seus pensamentos conturbados com clareza, a raiva era a palavra perfeita. Nem grande de mais para gastar saliva desnecessariamente, mas forte o suficiente para deixar as pessoas longe dele. Era só o que precisava, nada nem ninguém para segui-lo.

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Usava uma túnica verde esmeraldas em tom sobre tom com os olhos, era o que sempre vestia quando era forçado a comparecer em uma reunião da esposa. Os cabelos castanhos manchados de dourado, cacheados como a da maioria de seus filhos. Zeus com toda a certeza estava como sempre, entediado com aquela cena de ciúmes da esposa.

Não conseguia entender o porque de tanto estrelismo. Sim, aquilo já estava ficando infantil e de muito mal gosto. De fato alegrava-se alguém ter colocado um ponto final naquela batalha. Odiava ver seus filhos brigando, principalmente contra Athena.

Ao seu lado a mãe, Reia. Os olhos rosados fixos em algum ponto distante o qual ele não conseguia ver, eram belos e alegres quando bem queria, mas naquele momento não esboçavam nenhum tipo de humor, ficavam apenas ali, vazios e sem emoção. Os lábios pequenos e pintados delicadamente de vermelho, combinavam com a túnica negra num tom mais claro que a do marido, do lado oposto da enorme mesa. Os cabelos lisos e presos num rabo de cavalo alto em uma fivela prateada, davam lhe um ar mais respeitoso fora da prisão onde viviam, e só saiam quando havia algo de muito ruim a acontecer. Mas sinceramente, faziam quase duas semanas que estavam os dois no Olimpo.

IV -- "Mais café senhor?"

Sim, a tranqüilidade e a paz de espírito ao saber que as pessoas mais necessitadas estavam devidamente amparadas. Que diabo de vida mais tediosa que está levando agora em meu caro. Pensava nervoso e impaciente o rapaz sentado a mesa do café local.

Os cabelos um pouco maior desde a última vez que pode se lembrar, talvez caísse até o meio das costas agora. Os olhos ainda brilhantes e limpos, o rosto ainda novo e o espírito juvenil ainda eram muito bem vistos pelas jovens que passavam pelo café.

O local muito bem localizado, frente a um parque no centro do bairro, onde ao que parecia todas as ruas principais se encontravam. Fosse a que vinha do aeroporto, onde os turistas poderiam se maravilhar com a paz e beleza que emanava do lugar. Fosse a que vinha do porto, de onde vinham as cargas mais leves, mas naquele dia tão claro desembarcavam diversas mercadorias para um pequeno parque de diversões que seria montado para as festividades do mês.

As outras ruas não tinha certeza ao certo de onde vinham, ou o que levavam as pessoas a usarem aquele caminho, mas por hora deixou os orbe rosados se perderem melhor na jovem a sua frente. Não que não a tivesse visto antes, mas sua presença tão tímida e delicada em não querer tira-lo de seus pensamentos a cerca de qualquer coisa a fez permanecer ali, quieta e silenciosa.

Levou um tempo até perceber que ele a olhava, não queria tirar o jovem ressem chegado de seus devaneios, com certeza sobre o parque, mas sinceramente havia algo nele, alem da beleza, que a intrigava, só não sabia dizer o que era.

- Mais café senhor? - Ela perguntou tímida e um pouco nervosa. A voz era delicada, como sua face levemente ruborizada.

Estendeu a xícara sem desviar sua atenção da garçonete e de seus detalhes tão familiares. Os cabelos negros perfeitos que caiam até os ombros num corte repicado e simples. Os olhos em um tom de laranja, felinos, davam a jovem uma certa familiaridade com o tigre.

Adoraria ter continuado a olhar a jovem, mas tal desejo fora completamente tomado pela entrada do casal nada comum. Seu desejo era de sumir, desaparecer por de baixo da mesa ao se deparar com aquele olhar. O olhar zombeteiro como se o tivesse pegado no flagrante de uma travessura sem tamanho. Com toda certeza, Julian Solo não mudara em nada nos últimos meses, mas o que fazia ali o ex-imperador acompanhado por Hilda de Polaris, era uma pergunta interessante, que não faria por falta de coragem.

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O jovem corria desesperadamente, a noite fria e chuvosa, se perguntava como ela poderia sobreviver ali, naquelas condições. Um manto escuro lhe escondia o corpo, os cabelos e o rosto encharcados pela água fria de inverno, o vento do litoral cortava o rosto com rapidez, mas se preocupava mais com a pequena em seus braços que com aquele tempo poderia se resfriar. A criança dormia preguiçosa em seus braços vez ou outra girando ou virando a cabeça para se recostar melhor.

Realmente muito parecida com a mãe; pensou lembrando-se da preguiça que a dita senhora tinha pouco antes de despertar. Tão inocente ... Você nunca vai encontra-la, não no que depender de mim;

Continuaria a correr se a chuva não tivesse piorado, raios cruzavam os céus. Sabia que não eram de seu pai, mas o medo de ele descobrir aquela parte do plano lha assustava ao mesmo tempo que o deixava mais nervoso. Não entendia porque simplesmente não poderiam dar fim aquela deusa, que já passava dos limites e das oportunidades de perdão. Com esses pensamentos na cabeça acabou por não ouvi-la tossir, levou um tempo até perceber que ela já estava acordada e poderia adoecer se continuasse na chuva.

Por fim parou próximo a um rochedo, a praia deserta a exceção de pescadores e marinheiros que não lhe aborreceriam se não permitisse que eles o visse. Secou a capa com o cosmo para que não encharcasse a menina e por fim colocou-a ali, em um pequeno pedaço da caverna de estalactites que ficava escondida dos olhos mortais.

Abria e fechava as asas levemente afim de secar-se, as penas levemente esverdeadas que caiam logo chamavam a atenção da pequena, que preferira ficar apenas o olhando do chão onde estava. Os fios vermelhos enrolados, molhados caiam até os cotovelos. Os orbe azuis e limpos. Sim deveria se tratar de um anjo.

- Você é o meu anjinho? - Ouviu-a perguntar sentando-se. Como a própria Hera dissera-lhe, um anjo de candura em forma de ser-humano.

- Não sou anjo criança. - Falou lentamente para que ela entendesse. - Me chamam de Hermes. O senhor do carneiro dourado.

Ouviu-a sorrir e com o passar do tempo se encontravam os dois a sono solto. A pequena de melenas castanhas e lisas que caiam até a altura dos ombros, possuía olhos brilhantes como estrelas cor de amêndoa, a pele branca e clara era fina e aveludada, clara lembrava porcelana. O detalhe que mais chamava a atenção sem sombra de duvidas era a pequena coroa de louros, dourada na altura da testa.

Com o passar da chuva logo estaria de volta em sua missão de encontrar para a pequena um lar provisório e ainda pior, a de explicar as coisas aqueles mortais que geralmente nada entendiam de cosmo, e para eles tudo era sobre-natural, loucura, magia.

Logo amanhecera e lá estava ele, sozinho, triste e feliz ao mesmo tempo. Como explicar aquele tipo de sensação a um deus. Seria isso que os mortais chamam de amor? Já fizera o que lhe fora mandado, agora era só esperar e torcer para que tudo desse certo.

Antes de desaparecer dera uma última olhada para trás. Logo ela acordaria, e não seria mais uma criança. Desejava do fundo de seu coração que as coisas não desandassem naquela reunião, desejava sinceramente que ela não precisasse de se envolver naquilo tão ativamente. Ao levar consigo a tiara, desejava nervosamente que cupido não lhe perguntasse o que fazia com ela, ou teria ainda mais o que explicar.