Lei de Murphy
"Coronel... Roy Mustang..."
Algo tão simples quanto murmurar enquanto dorme pode causar consequências inesperadas. Se tivesse sido pronunciado pela florista ou pela enfermeira não haveria problema algum, mas pro azar da 1ª Tenente Riza Hawkeye ela cometeu esse deslize no lugar errado, na hora errada e nunca mais se perdoou.
Numa viagem de volta a Central ela cochilou no trem... pra piorar, sonhou com qualquer coisa e pronunciou aquelas três palavras. Pra piorar de vez, o Coronel Roy Mustang estava sentado a sua frente, e contrariando a normalidade das coisas, ele estava acordado enquanto ela cochilava, fato só aceitável de acordo com a Lei De Murphy "se alguma coisa pode dar errado ela vai dar errado".
Mal terminou de dizer a última palavra e despertou. Assim que abriu os olhos se deparou com o Coronel olhando-a com uma cara entre surpresa e satisfação.
"Desculpe, senhor, não devia ser tão relapsa."
"Não se preocupe, cochilar numa viagem dessas é normal. Eu cochilaria em qualquer lugar mesmo. Se bem que eu não falo enquanto durmo..."
Sinal de alerta! Havia acontecido algo pior do que ela suspeitava. Ela conhecia muito bem o Coronel, aquele rosto, aquele tom de voz, indicavam perigo.
"Mas talvez se eu tivesse sonhos muito bons eu também falasse..."
"Perdão senhor, não serei mais displicente dessa forma. Com licença, irei ao banheiro lavar o rosto."
A saída mais rápida era aquela: fingir que não havia nada demais e sair pra finalizar logo aquela conversa. Mas o Coronel não era nenhum bobo, pelo contrário era experto demais pra deixá-la escapar assim.
"Você só tem permissão para sair se me contar com o que estava sonhando..."
"Eu creio que minhas necessidades pessoais não reconhecem hierarquia alguma. Com licença."
Não se podia negar que ela também era dura na queda. Pra tentar solucionar a situação, ela foi ao toilett, ao refeitório, deu uma volta por todos os vagões, na expectativa que a viagem terminasse e ela não precisasse ficar a sós com o Coronel. Mas obviamente ele contra-atacou...
"Com licença, a senhorita é a 1ª Tenente Riza Hawkeye?"
"Sim, pois não."
"O Coronel Mustang me pediu para convocá-la para uma reunião urgente, disse que enquanto subordinada e excelente profissional você não se importaria de perder alguns minutos de lazer em nome de suas responsabilidades."
"Obrigada pelo recado."
Maldito Coronel Roy Mustang e suas ironias. O jeito agora seria encará-lo calma e friamente, enquanto pudesse agüentar e torcer pra que até lá o trem chegasse ao seu destino.
"Pois não senhor, qual é esse assunto tão urgente?"
"Vamos lá Tenente... com o que estava sonhando?"
"Não acho que o que sonho ou deixo de sonhar tenha algum interesse pro Estado."
"Mas se você fala enquanto dorme, pode revelar algum segredo para o inimigo, não gostaríamos que isso acontecesse, não é?"
"Mais uma vez, perdão senhor, garanto que não ocorrerá novamente se esse é o problema."
"Mas eu preciso saber a natureza desse sonho, se você não sonha nada demais, não tem problema cochilar de vez em quando."
"Não vou mais fazer isso! Não se preocupe."
Definitivamente, não era fácil dobrar a Tenente. Roy resolveu apelar pro seu maior trunfo.
"Como não me preocupar? Caso você não saiba, você pronunciou o MEU nome, com todas as letras. Então eu gostaria de saber o que eu faço nos seus sonhos..."
"Ah, então é isso... desculpe senhor, mas nem me lembro direito com o que sonhava."
Como nunca na vida ela precisou se segurar, manter-se calma, sem suar, sem ficar vermelha, voz fluindo normalmente. Exceto pelo ficar vermelha, todo o resto funcionou muito bem. Mas ficar vermelha, mesmo que de leve, denota um embaraço altamente comprometedor.
"Tenente... acho que você está me escondendo algo..."
"Francamente, Coronel, essa reunião não está servindo pra muita coisa."
Para felicidade suprema de Riza o trem começara a desacelerar, assim em breve seu suplício chegaria a um fim. É claro que no que dependesse do Coronel até que ela estivesse bem longe dele o assunto não terminaria.
"Olha, já vamos descer."
"E você ainda não me disse."
"Não tenho nada de interessante pra dizer."
"Mas pelo que eu conheço de sonhos, pra se chegar a pronunciar alguma coisa, tem de ser algo importante."
"Pelo que eu entendo de sonhos, principalmente em cochilos, é que imagens aleatórias do seu dia passam pela sua mente. E coronel é uma das palavras que eu mais pronuncio num dia, as chances de eu vir a repeti-la mecanicamente são bem altas."
Ponto pra ela, lógico e crível o pensamento. Mas por que a Tenente não podia ser um pouquinho menos certinha? Repetição mecânica de palavras não era a melhor coisa a se associar com sonhos, especificamente, era uma coisa muito chata para estar associada ao nome Roy Mustang. As palavras de Hawkeye soaram um bocado arrasadoras... Talvez ele devesse parar antes de parecer um idiota completo, ou pelo menos antes que ela sacasse sua arma e lhe ensinasse como ter mais disciplina... Entretanto a lembrança do rubor que, minutos antes, havia visto no semblante da Tenente o fez reagir.
"Mas você não fala Roy Mustang tantas vezes assim."
Ponto pra ele. Várias vezes por dia era a posição dele, Coronel, o nome Roy Mustang, principalmente Roy, ela falava pouquíssimas vezes.
"Coronel, já chega, não?"