Nota: (1) – Harry Potter e seus personagens não me pertencem. E sim a J.K. Rowling. Toda a trama desta história é baseada na incrível obra de S.J. Watson, que, obviamente, também não me pertence. Porém, a causa da amnésia de Harry e o final desta história serão completamente diferentes do livro de Watson. Essa história não possui nenhum fim lucrativo, é pura diversão.
(2) – Essa é uma história Slash, ou seja, relacionamento Homem x Homem. E contém Lemon, ou seja, sexo explícito entre os ão, se você não gosta ou se sente ofendido, é muito simples: não leia.

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Uma SUV preta Volvo usava toda a sua potência para percorrer a interminável Rota 431, que cruzava o Alabama, também conhecida como a "Estrada para o Inferno" em razão das inúmeras mortes que ocorreram naquela estrada. Tal informação, porém, estava longe de amedrontar as três pessoas dentro do carro. O maior medo deles era pensar no que Harry estaria passando nesses últimos tempos, desde o seu repentino sumiço da Clínica Zabini, há pouco mais de um ano. Nesse meio tempo, o Dr. Malfoy havia usado toda a sua influência e boa parte de sua fortuna para contratar os melhores detetives, subornar policiais e políticos, contatar o FBI e a INTERPOL para conseguir localizar o jovem paciente que havia roubado seu coração. Ironicamente, inclusive, ele havia juntado seus esforços com Anthony Goldstain, marido de seu paciente, para localizá-lo. No entanto, nenhum dos dois poderiam se comparar a Hermione Granger quando o assunto era inteligência e perspicácia, talvez nem os órgãos governamentais acionados por Malfoy chegassem aos pés da jovem, que, há alguns dias, havia localizado uma pista de Harry numa pequena cidade chamada Elkmont, no Alabama.

- Você tem certeza, Granger? Eu não quero perseguir outra pista falsa.

- Ao contrário dos imbecis que você contrata, Malfoy, eu sei o que eu estou fazendo.

Todos estavam com os nervos a flor da pele. O último ano havia passado voando para eles, enquanto tentavam a todo custo encontrar o paradeiro de Harry, sem sucesso. Agora, porém, Hermione estava confiante de que conseguiriam encontrá-lo. Em uma de suas pesquisas, o algorítimo de detecção facial que ela havia desenvolvido captou a imagem de Riddle ao fundo, numa matéria de jornal de uma cidadezinha local, caminhando como um cidadão comum.

Desgraçado.

- Essa é a melhor pista que tivemos em meses, Malfoy – disse Goldstain, dirigindo aquele carro como se estivesse numa perseguição policial – Algo me diz que, dessa vez, estamos no caminho certo.

Malfoy não respondeu, mas, por dentro, ele esperava que Goldstain tivesse razão. Ele não conseguia nem imaginar o que aquele maníaco poderia ter feito com Harry. Se ao menos ele não tivesse atendido o celular naquele dia... Não! Ele não podia pensar nisso agora. Sua dor e remorso precisavam ser postos de lado e todas as suas energias deveriam estar concentradas em achar Harry. Em salvá-lo.

Nos últimos meses, Draco acordava todas as noites assustado, pois sua mente o levava de volta para o jardim da Clínica Zabini, onde ele via Harry vezes desaparecer diante dos seus olhos, vezes ser arrebatado por uma sombra maligna e coisas terríveis do gênero, sem que ele pudesse fazer nada para evitar. Todas as noites ele acordava se odiando um pouco mais, desejando voltar no tempo e jogar o maldito celular no lago e nunca mais deixar o jovem de olhos verdes sair de perto dele.

Mas ele não podia voltar no tempo. Então, praticamente colocando de lado sua carreira e a própria vida, Draco colocava todas as suas energias em encontrar Harry. Durante mais de um ano, exaustivamente, ele não havia poupado esforços e recursos financeiros para achá-lo. Cada pista falsa, cada emboscada vazia, cada frustração o impulsionavam a continuar procurando. Ele nunca desistiria. Não enquanto estivesse vivo.

Ao seu lado, talvez com o mesmo ímpeto e a dor de novamente perder aquele que fora seu grande amor, Anthony Goldstain se mantinha firme, concentrado como um soldado em uma missão, lembrando-se da última vez que viu Harry com o filho nos braços e usando essa lembrança como força para persistir. Durante anos ele havia acreditado que Harry não o amava, que não se importava com o filho, tampouco com a família que haviam construído, para então descobrir que um maníaco havia sequestrado seu marido e o mantinha drogado e sem memória para sustentar uma loucura obsessiva que Anthony não sabia ao certo como começou, mas que, se dependesse dele, terminaria com Riddle caído numa poça de sangue e uma bala 9mm no meio de sua testa.

Anthony achava que nunca poderia odiar alguém, mesmo como um policial, ele não odiava os criminosos, ele reconhecia que alguns eram frutos da desigualdade social e outros, mentes doentes, mas Riddle lhe provara ser a exceção. Anthony sabia que ele se enquadrava entre aqueles que tinham uma mente doente, mas não podia deixar de odiá-lo com todas as forças, de querer descarregar sua arma contra ele até não sobrar qualquer parte do corpo de Riddle sem o buraco de bala de uma pistola semi-automática.

Sinceramente, Anthony não tinha certeza se conseguiriam encontrar Harry com vida – por mais que ele tentasse não pensar nisso – mas de uma coisa ele estava certo: ele mataria Tom Riddle, nem que fosse a última coisa que fizesse em vida.

- Você não pode ir mais rápido? – a voz de Hermione o sacudiu de seus pensamentos.

- Infelizmente o carro só chega a 230 km/h.

- Oh... Tudo bem então – Hermione não havia notado que estavam tão rápidos.

Sinceramente, salvo se pudessem se teletransportar para o local em que Harry estava, nada seria rápido o bastante para que ela achasse o seu melhor amigo. Ela tentava aparentar calma, mas, por dentro, estava desesperada. Não conseguia comer, nem dormir direito, desde que Harry havia desaparecido. Em sua cabeça, cabelos brancos cresciam aos montes e, sinceramente, ela não se importava. Todas as suas energias estavam concentradas em achar Harry. Ela havia perdido seu melhor amigo uma vez e não deixaria isso acontecer de novo.

- Só mais um pouco Harry – murmurou ela, numa silenciosa oração – Por favor, espere por nós. Por favor, seja forte...

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O vento gelado daquele final de outono cortava as bochechas de Harry, que, no entanto, não esboçava qualquer reação. Mais uma vez, ele estava sentado na varanda daquela bonita casa provinciana usando um pijama confortável, cinza, que abraçava seu corpo com suavidade, mas isso tampouco era apreciado pelo jovem que olhava com expressão vazia para o imenso pasto de grama verde, límpida, que rodeava a casa. Os vizinhos mais próximos moravam há quilômetros dali e para chegar na cidadezinha mais próxima, a pequena Elkmont, fazia-se necessário percorrer alguns quilômetros de carro. Alguns poderiam entender este cenário como a personificação da paz, outros possivelmente surtariam com a tranquilidade daquelas terras afastadas e quase inabitadas, há quilômetros de qualquer traço de civilização, mas Harry via tudo aquilo com profunda indiferença.

Há tempos ele não pensava profundamente sobre nada, não questionava nada, não se deixava intrigar por qualquer notícia que aparecesse nos jornais. Ele tampouco se lembrava de muitas coisas, sua infância, adolescência e a vida antes de acordar naquele hospital com a cabeça enfaixada eram um completo borrão, apenas imagens desconexas de pessoas as quais ele não sabia nomear ou dizer o que um dia significaram para ele. Ele se sentia uma concha vazia, um brinquedo quebrado. Desde a cirurgia suas funções motoras também haviam se deteriorado e lhe parecia impossível permanecer de pé e caminhar sem ajuda, ele não conseguia coordenar os próprios movimentos e precisava de ajuda até mesmo para se alimentar, além disso, sua visão perdera cerca de 40% da capacidade e a maioria dos objetos distantes lhe parecia turvos e indistinguíveis.

Harry, às vezes, perguntava-se por que se tornara tão inútil. Ele havia nascido assim? Ou a cirurgia havia lhe transformado de tal forma que não conseguia fazer nada sem ajuda? Então, de repente, seus pensamentos se perdiam de novo e não lhe importava mais o estado deplorável em que vivia. Na única vez em que ele perguntou para Tom o que havia acontecido com ele, Tom lhe explicara que a cirurgia havia sido necessária para tratar os severos distúrbios psiquiátricos que ele sofria. Segundo Tom, Harry desenvolvera uma profunda esquizofrenia paranoide acreditando que seu marido fosse um impostor que o sequestrara de sua verdadeira família e, desde então, eles viveram momentos terríveis. Por sorte, nas palavras de Tom, ele o amava o suficiente para não desistir e ainda buscar este tratamento alternativo para que a vida de Harry voltasse à normalidade.

Sinceramente, Harry não sentia pena de si mesmo, tampouco de Tom.

Na verdade, ele não sentia nada.

Ele já não conseguia dizer quando estava feliz, triste ou com raiva. Todas as emoções pareciam as mesmas para ele: absolutamente nada. Nem quando Tom o tocava intimamente, quase todas as noites, Harry conseguia sentir uma real onda de prazer e excitação, seu corpo apenas reagia mecanicamente aos estímulos de Tom e ele se mantinha quieto, pacífico, até seu marido finalmente se satisfazer. Se isso era algo certo ou errado, Harry não sabia ao certo dizer, pois ele já não conseguia mais distinguir ambos os conceitos, então ele simplesmente acreditava em Tom.

Quando Tom dizia que algo era certo, então era certo.

Quando Tom dizia que algo era errado, então era errado.

Tom sempre dizia que a vida dos dois seria muito mais fácil se Harry simplesmente concordasse com ele. Então, Harry concordava com ele.

Uma vez Harry comentou, sem qualquer tristeza ou ressentimento, que se sentia uma boneca de pano nas mãos de Tom. Este, no entanto, apenas sorriu e disse que ambos estavam felizes assim e que não havia com o que se preocupar. Harry não estava preocupado. Ele estava feliz, pois Tom havia dito que eles estavam felizes. Estranho como a felicidade se parecia à indiferença para ele, mas ele nunca discutiu com Tom sobre isso, ou sobre qualquer outra coisa.

- Harry, pequeno, você vai ficar resfriado se continuar aqui fora nesse frio – disse Tom, ingressando pela porta da varanda que ficava anexada ao seu escritório. Era ali onde Harry passava a maior parte do dia, quando Tom estava trabalhando, então ele enchera o lugar com vasos de flores e uma bonita cadeira de balanço para que o menor estivesse sempre confortável e sob os seus atentos olhos.

- Eu vou? – perguntou desinteressado, o olhar ainda perdido no horizonte.

- Sim, vamos para dentro.

Harry não disse nada, apenas segurou o pescoço de Tom quando este o pegou no colo e o levou para a sala de estar.

- Sente-se aqui enquanto eu preparo o jantar – disse Tom, depositando um beijo suave em seus lábios – Pensei em fazer uma torta com o que sobrou do almoço, o que você acha?

- O que eu acho...

- Você irá adorar.

- Eu vou adorar.

- Excelente, pequeno! Veja um pouco daquele seriado que nós gostamos enquanto eu estou na cozinha.

Harry concordou em silêncio, seu olhar perdido num ponto qualquer da parede.

A rotina deles, naqueles últimos meses, resumia-se à clausura daquela casa, onde o lugar mais longe permitido a Harry era o belo jardim, sempre sob os vigilantes olhos de Tom, que parecia não se importar em empurrá-lo em sua cadeira de rodas ou mesmo carregá-lo nos braços para que Harry tomasse um pouco de sol rodeado pelas belas flores às quais Harry, no entanto, era tão indiferente. Pouquíssimas vezes, Tom o levava para a pequena cidade vizinha e, quando isso acontecia, Harry devia permanecer em completo silêncio até voltarem para casa. Nunca lhe era permitido interagir com ninguém além do próprio Tom, afinal, poderiam levá-lo para um hospital psiquiátrico onde ele sofreria os mais terríveis abusos sem que seu querido marido estivesse lá para salvá-lo. Ou, pelo menos, fora esta a explicação de Tom.

Na maior parte do tempo, Tom estava no escritório rodeado de livros de advocacia, em frente ao notebook, trabalhando. Algumas vezes ele levava Harry para o escritório e lhe contava alguns detalhes dos casos, a maioria situações bem complexas que Tom resolvia com maestria sob inúmeras identidades diferentes. Uma vez, Tom lhe contou de um caso em que duas empresas brigavam por milhões em mercadorias extraviadas e contrataram, cada uma, um excelente advogado. Ambos eram Tom, sob identidades diferentes, que conseguiu um acordo milionário sem precisar sair da frente do notebook, apenas com o celular pré-pago de chip descartável na mão, como sempre fazia.

Geralmente, Harry não prestava muita atenção quando seu marido falava sobre esses casos, mas Tom gostava que ele parecesse ouvi-lo atentamente, então Harry procurava encará-lo fixamente e balançar a cabeça a cada pausa dramática que Tom fazia. Tom parecia feliz com isso, então Harry estava fazendo algo certo. Tom sempre lhe dizia o que era certo e o que era errado, o que fazer e o que não fazer, quando sorrir e quando fichar chateado. Harry não precisava se preocupar mais com essas coisas.

Harry não precisava se preocupar com mais nada.

Desde o dia em que saíram do Hospital na Ucrânia, Harry com a cabeça ainda enfaixada, Tom não o deixara sozinho nem um minuto sequer. Ele achava que o homem mais velho estava sendo atencioso, que estava preocupado com o seu bem estar e, para falar a verdade, Harry não conseguia se concentrar em mais nada. Nos primeiros dois meses após a cirurgia, Harry ainda sentia seu corpo dolorido e a mente desorientada. Febre, espasmos e a perda da visão quase por completo o atormentaram e, por diversas vezes, ele achou que não fosse conseguir sobreviver. Estranhamente, ele não estava preocupado com isso. Ele não conseguia sentir a tristeza ou o desespero que essa situação poderia proporcionar a qualquer pessoa e, ao seu lado, Tom sorria dizendo que após esse período conturbado, Harry se recuperaria e logo se sentiria muito melhor. E, é claro, Tom estaria sempre ao seu lado para ajudá-lo em todas as dificuldades.

Uma noite, em especial, fora particularmente difícil.

[Flashback]

Pouco mais de um mês havia se passado desde a cirurgia de Harry e, naquele momento, eles estavam hospedados num precário Hostel na Romênia aguardando que um conhecido de Tom providenciasse passaportes e passagens para os EUA. O pequeno quarto tinha mofo acumulado nas paredes e a luminosidade mal ingressava no local pelas janelas pesadas e antigas, já a cama rangia como um fantasma a cada pequeno movimento e a TV de tubo pegava apenas um canal: chuvisco com imagens distorcidas. Nada disso se comparava ao estado deplorável do pequeno banheiro acoplado ao quarto, é claro, cujas manchas na banheira levantavam a dúvida de quantas pessoas haviam morrido ali dentro com seus órgãos roubados.

O deplorável ambiente, no entanto, era ignorado por Tom, que sabia ser aquele apenas um momento de transição para a vida perfeita que teria com Harry na América. Mas se Lestrange atrasasse um pouco mais com a falsificação dos malditos passaportes talvez ele começasse a ficar irritado.

- Você conhece o ditado, pequeno: se quer algo bem feito, faça você mesmo – comentou Tom, distraidamente, digitando algo no notebook em seu colo.

Deitado ao seu lado, Harry apenas gemeu em resposta, reação esta que logo chamou a atenção de Tom:

- Você está ardendo em febre de novo – constatou, após alguns segundos com a mão sobre a testa do menor – Estanho, com a quantidade de antibióticos que ainda está tomando...

- Dói...

- Imagino que sim – suspirou – Você viu onde se meteu, Harry? Por que foi arrumar tantos problemas para nós? Nada disso teria acontecido se você aceitasse de uma vez por todas que me ama, se tivesse ficado quietinho na nossa casa, sob os meus cuidados, ao invés de procurar um maldito médico intrometido para recuperar sua memória. Nós estamos nessa situação por sua culpa, então não adianta choramingar agora.

- Por favor...

- Você tem sorte que eu o amo tanto. Qualquer pessoa no meu lugar deixaria você sofrer para aprender uma lição, mas eu não vou fazer isso, eu me preocupo com o seu bem estar. Espero que nunca se esqueça disso.

- Por favor... D...

- O que?

- Draco... Por favor... Não...

Os olhos de Tom se estreitaram.

Como Harry ousava chamar o nome de outro homem na sua frente?

É claro que se tratava do cérebro abusado de Harry acessando o seu inconsciente e pronunciando um nome registrado ali durante um pico de febre, num delírio, mas Tom não dava a mínima para tais detalhes. Harry estava chamando o nome de outro homem enquanto ele estava ali, naquele fim de mundo com cheiro de bolor, preocupado com a felicidade dos dois, aquele pirralho ingrato.

- Dr...

Harry não viu o tapa chegar. Por sorte, ele estava deitado, caso contrário, teria sido jogado no chão pela violência do golpe de Tom. Entre lágrimas e gemidos doloridos, ele tentava segurar a cabeça e impedir que Tom o sacudisse pelos cabelos que escapavam da faixa branca agora manchada com gotas de sangues. Alguns pontos certamente tinham se rompido. Tom, no entanto, estava cego pelo ódio.

- Como você ousa me desrespeitar dessa forma? Depois de tudo o que eu fiz por você? Depois de tudo o que nós vivemos? – cada pergunta era seguida de um tapa no rosto já machucado de Harry, que chorava e gritava, mas mal conseguia levantar os braços para se defender.

Quando Tom o jogou no chão, seguido de um chute nas costelas, Harry ofegou e o grito de dor morreu em seus lábios. Ele não conseguia se sentir triste ou irritado, mas a dor fazia com que desejasse morrer, sem conseguir distinguir o que era pior: os calafrios, o gosto de sangue na boca, a cabeça a ponto de explodir, a falta de ar, o corpo dolorido, ou não conseguir enxergar um palmo a sua frente enquanto recebia os golpes enfurecidos de Tom.

- Você irá me respeitar, Harry – Tom sussurrou próximo ao seu ouvido, agarrando-lhe os cabelos com crueldade e se posicionando sobre o corpo que se encolhia a cada palavra – Você irá respeitar o nosso amor.

- Por favor...

- Sim, implore. Você pode não se lembrar muito bem agora, mas eu adoro quando você implora.

Sorrindo, com a fome e o desejo cruel brilhando em seus lábios, Tom abriu o zíper da calça e mais uma vez sussurrou no ouvido do menor:

- Está na hora de lembrá-lo mais uma vez a quem você pertence, pequeno. Por sorte, eu não me canso disso.

Harry não sentiu os toques lascivos e violentos sobre o seu corpo, tampouco esboçou reação ao ato que se seguiu, ele já havia perdido a consciência.

[Fim do Flashback]

Desde aquela noite, por sorte, Harry não havia voltado a delirar durante episódios de febre, tampouco chamou o nome de qualquer pessoa que não o de Tom. E, no dia seguinte, quando Harry perguntou a este sobre as marcas e a dor que sentia, Tom lhe disse que não precisava se preocupar. Então, logicamente, Harry não havia se preocupado.

- Vamos, pequeno? – a voz suave de Tom o despertou de seus pensamentos. Então, sem dizer nada, Harry abraçou o pescoço do maior e se deixou levar para a mesa de jantar, sobre a qual uma deliciosa torta de frango com requeijão e uma travessa de salada os aguardava.

Como era de praxe, Tom sentou ao seu lado e colocou o prato dos dois, então, conversando sobre seu último caso, começou a alimentá-lo e a comer a sua própria refeição. Era mais uma noite tranquila na casa dos Riddle. Uma noite que certamente se encerraria com um delicioso sorvete de Cookies and Cream como sobremesa e, então, seus corpos suados entrelaçados sobre a cama.

- Quer mais um pedaço de... – Tom, de repente, ficou mudo.

Harry não entendeu, mas permaneceu em silêncio, indiferente.

- Ora, ora... – os olhos escuros se estreitaram – Parece que temos alguns ratos intrometidos aqui por perto. Consegue ouvir o barulho, pequeno?

- Não.

- Bem, isso não importa – sorriu, levantando-se da mesa e trazendo Harry para o seu colo – Vamos deixá-lo no quarto, seguro, enquanto eu me livro desses ratos.

- Está bem.

- Espere por mim quietinho – disse Tom, subindo as escadas com Harry no colo – Prometo que será rápido.

Chegando à suíte, ele deixou Harry na cama e prendeu seus tornozelos com algemas ligadas a uma corrente para evitar que Harry saísse da cama e pudesse se machucar. Harry apenas observou seu marido aprisioná-lo em silêncio, então, voltou os belos olhos verdes enevoados para o teto. Ele ouviu o clique da porta se fechar, mas não esboçou qualquer reação, tampouco pareceu preocupado quando a casa inteira imergiu no breu, perguntando-se brevemente se não seria mais difícil para Tom caçar os ratos no escuro, mas logo ignorando este pensamento para se concentrar num porto particularmente escuro da parede.

Tom cuidaria de tudo, não havia com o que se preocupar.

No andar de baixo, Tom havia acabado de deligar o disjuntor e agora ajustava os óculos infravermelhos no rosto e as duas pistolas automáticas na cintura. Esse não era o jeito que ele esperava terminar aquela noite, mas, certamente, seria igualmente divertido.

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- Espere por nós no carro, Granger – disse Draco, empunhando a arma.

- Eu ainda acho que deveríamos chamara polícia, o FBI, ou algo do tipo como reforço. Vocês sabem tão bem quanto eu que aquele homem é perigoso. Todo o cuidado é pouco.

- Acontece que a polícia e o FBI não responderão a mais um chamado que, possivelmente, trata-se de uma pista falsa – respondeu Anthony Goldstain, a própria arma em punho como Malfoy.

- Tudo bem, mas tenham cuidado. Algo me diz que não se trata de mais uma pista falsa.

- Eu sei, Granger. Vamos.

Deixando Hermione no carro pronta para uma fuga rápida caso fosse necessário, Draco e Anthony seguiram pela vegetação escura que ligava a estrada de terra à pequena casa no centro daquele sítio, onde, após perguntarem pelas redondezas no dia anterior, eles descobriram morar um advogado charmoso e seu pobre marido doente, cujas descrições físicas batiam com as de Riddle e Harry. Agora, com os nervos a flor da pele, eles seguiam pelo breu tentando enxergar algo com a pouca iluminação com a qual podiam contar: a luz fraca da lua minguante parcialmente encoberta por nuvens, pois a própria casa estava mergulhada na penumbra. Por sorte, cada um deles contava com uma pequena lanterna, mas esta não iluminava muita coisa também.

- Por aqui – disse Anthony, num sussurro, apontando para a entrada nos fundos da casa, após constatarem que a porta principal estava trancada.

- Ok.

- Cuidado, a luz não está acendendo.

Eles ingressaram na casa pela porta dos fundos e logo perceberam que não havia como acender a luz. Com cuidado, então, os dois seguiram pelo corredor estreito até a sala de estar. O barulho dos grilos do lado de fora era o único som passível de ser ouvido. A casa estava mergulhada no silêncio completo e, se não fosse a louça suja em cima da pia e a mesa desarrumada, eles acreditariam não haver uma alma viva naquele local.

Quando Anthony levantou a mão para fazer um sinal para Draco em direção às escadas, ele sentiu uma dor ensurdecedora. Dois tiros o haviam atingido, um em cada mão, e imediatamente ele largou a arma e se encolheu de dor, ajoelhando-se no chão. Ao seu lado, Draco se assustou, mas quase no mesmo instante sentiu a mesma dor. Por puro reflexo, ele também largou a arma e se encolheu no chão. Não houve qualquer barulho precedendo o disparo, então, quem quer que os tenham atingido usara um potente silenciador. Antes que eles pudessem se recuperar e alcançar novamente as armas, uma figura rápida chutou ambas as pistolas para longe e uma voz divertida os surpreendeu:

- Senhores, a que devo a honra desta visita?

- Seu desgraçado...

- Você deve ser o Dr. Malfoy – zombou Tom, a arma apontada para a cabeça de Draco – Devo admitir que você fez um excelente trabalho com a memória do meu querido marido, eu tive bastante trabalho para novamente trazê-lo a um estado favorável a nossa convivência.

- O que você fez com ele?!

- E você deve ser o ex-marido de Harry – o sorriso de Tom se alargou um pouco mais, como um predador diante de uma preza – Meu caro, você tem que aprender a lidar com uma rejeição, sabia? Perseguir Harry até aqui, isso é doentio.

- Você é louco!

- Por favor, não me ofenda na minha própria casa – pediu Tom, educadamente, seguido de um disparo no joelho direito de Anthony.

O grito ecoou pela casa.

- Agora, onde estávamos? Oh sim, sobre sua obsessão com Harry...

As palavras de Tom, no entanto, foram interrompidas quando um ensanguentado Anthony Goldstain se lançou contra ele tentando desarmá-lo num embate corporal. Draco, por sua vez, aproveitou a distração criada por Anthony e correu para as escadas em busca de Harry. A dor latejante na palma da mão era sua menor preocupação naquele momento. Ele precisava chegar até Harry. Ele precisava salvá-lo daquele psicopata.

Tateando as paredes do corredor mergulhado na penumbra, Draco abriu a primeira porta.

Um escritório vazio.

Deixando um rastro de sangue, ele seguiu.

Na segunda porta, o quarto de hospedes. Na terceira, um banheiro. Na quarta, um armário de casacos.

- Droga, onde você está Harry?

Finalmente, chegando à última porta no final do corredor, Draco forçou a maçaneta e encontrou a porta trancada. Harry estava ali, não havia dúvidas. Então, ele ouviu passos na escada e não esperou para ver se Goldstain havia levado a melhor contra Riddle. Para falar a verdade, ele duvidava disso. Ele chutou a porta para arrombá-la e, na segunda tentativa, finalmente conseguiu e ingressou no quarto.

Ali, com os tornozelos aprisionados numa grossa corrente de ferro, um pacífico Harry repousava sobre a cama olhando para o teto. Mas, ao ouvi-lo arrombar a porta, voltou os belos olhos verdes para ele. Olhos estes que Draco conseguiu contemplar ainda na penumbra. Afinal, ele jamais conseguira esquecê-los.

- Harry... – murmurou, observando-o com pena e arrependimento.

Aquela pobre criatura acorrentada na cama estava ali por sua causa, porque ele fora negligente e, para atender uma ligação inútil, deixara Harry ser sequestrado sob o seu nariz. Ele nunca se perdoaria, mas, neste momento, não havia tempo para remoer o passado, ele precisava achar uma forma de soltá-lo para fugirem dali.

- Não se preocupe Harry, nós iremos salvá-lo.

- Me salvar? – questionou o moreno, confuso.

- Você sabe o que está acontecendo, não sabe? – perguntou Draco, aproximando-se da cama e procurando por sinais de que Harry estava drogado. Mesmo na penumbra, ele conseguiu ver que as pupilas de Harry estavam normais, não havia sinal de dilatação, ou de qualquer outro sinal de que Harry estivesse sob os efeitos de alguma substância psicotrópica.

Ele parecia genuinamente confuso.

- O que esse maldito bastardo fez com você?

- Quem?

- Deixa para lá. Nós precisamos sair daqui, Harry. Por favor, me ajude a soltá-lo.

- Tom disse para eu ficar aqui.

- Harry, você não está entendendo, ele é perigoso e está armado, você precisa...!

Harry arregalou ligeiramente os olhos, surpreso, quando sentiu o corpo daquele homem cair contra o seu, sangue nos lábios e o furo de um tiro a queima roupa manchando a camisa na altura do coração.

Tom acabara de ingressar no quarto.

- Você consegue ver a dor de cabeça que arrumou para nós, Harry?

- Sinto muito?

- Sim, está correto. Você deve sentir muito – suspirou Tom, exasperado – Agora eu tenho que me livrar de dois corpos e provavelmente vamos precisar nos mudar novamente.

- Oh... – Harry não perguntou quem era aquele homem que Tom acabara de arrancar de cima dele e jogar no chão, tampouco perguntou quem seria o segundo corpo, ele apenas olhou sobre o ombro de Tom e viu uma terceira pessoa ingressar a passos vacilantes no quarto com uma arma apontada para as costas de seu marido.

- Afaste-se dele!

- Ótimo, e ainda tem você, Granger – disse Tom, sem se virar.

- Afaste-se dele agora!

- Ou você pode jogar a arma no chão, se não quiser que eu estoure os miolos do seu querido amigo de infância – ele apontou a arma para a cabeça de Harry, que não esboçou qualquer reação, limitando-se a olhar para a mulher que o encarava com lágrimas nos olhos e as mãos trêmulas segurando a arma.

- Você não se atreveria...

- Quer apostar para ver? – sorriu, engatilhando a arma – Se eu não puder tê-lo, Granger, ninguém poderá.

- Não! Por favor, não faça nada com ele! Oh, Harry...

Hermione chorava ruidosamente e Harry, por um instante, sentiu um leve desconforto ao observá-la naquele estado. No entanto, ele não fazia ideia de quem poderia ser ela.

- Por favor, Riddle, não o machuque – ela pediu, soltando a arma no chão – Eu sinto muito, Harry.

- Você está certa – disse Tom, disparando cinco vezes com ela – Eu não jamais me atreveria a machucá-lo, sua idiota.

Em silêncio, Harry observou a mulher cair no chão ao lado do homem de cabelos loiros.

Eles pareciam familiares.

Mas Harry não conseguia se lembrar de onde.

- Eu conheço essas pessoas? – perguntou para Tom.

- Não – respondeu o maior – Eles são apenas invasores que tentaram roubar algo que é meu. Não preocupe a sua linda cabecinha com essas coisas, pequeno.

Harry ainda encarava os corpos caídos no chão, mas permaneceu em silêncio.

Tom havia dito que ele não precisava se preocupar.

- O que acha de assistir um pouco de TV enquanto eu arrumo essa bagunça?

- Está bem.

- Coisas que fazemos por amor, não é? – cantarolou Tom, divertido, chutando os corpos para o lado para liberar a passagem.

Harry concordou com um breve aceno, alheio ao significado daquelas palavras, mas sabendo que Tom queria que ele concordasse. No colo de Tom, a caminho da sala de estar, ele olhou novamente para os corpos caídos no chão e sentiu coração apertado no peito. Uma lágrima solitária escorreu de seu olho direito sem que ele percebesse. Ao tocá-la, ele olhou com curiosidade para a ponta do dedo molhada por um breve instante, e, no instante seguinte, voltou a encarar a parede com indiferença.

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Alasca.

Quem nunca imaginou fugir para o Alasca após uma situação irremediável?

Sinceramente, Tom não esperava chegar a este extremo. Mas, para falar a verdade, não era tão ruim quanto se imaginava. Ao contrário do estereótipo de ser apenas uma geleira gigante, o Estado do Alasca contava com inúmeras cidades grandes e produtivas, populosas e de economia ascendente, que se destacavam em meio às belas montanhas e aos lagos cobertos de gelo.

- O que acha de um chocolate quente, pequeno?

- Seria bom.

- Eu vou buscar para nós.

Deixando Harry nu, sob o tapete de pele em frente à lareira, Tom se levantou e, sem se preocupar em cobrir-se, seguiu para a cozinha da nova casa. A lareira, é claro, tratava-se apenas de um charme, pois o potente aquecedor central cuidava para que a casa estivesse sempre em torno de 24 graus ainda que lá fora a temperatura estivesse negativa.

A bela casa em questão estava situada num bairro afastado de Anchorage, a maior cidade do Alasca, voltado para as pessoas mais abastadas e também as mais reclusas, que desejavam conforto e privacidade próximo às montanhas. Fora um verdadeiro achado, há pouco mais de dois meses, depois do incidente no Alabama, quando ele se livrou dos corpos de Granger, Goldstain e Malfoy com um poderoso corrosivo químico vendido na Deep Web e mandou o carro para um desmanche de reputação duvidosa que certamente sabia como sumir com os vestígios de veículos como aquele.

Lestrange sabia como conseguir excelentes imóveis, isso ele não podia negar.

- Aqui está, pequeno. Cuidado para não se queimar – Tom entregou a caneca com o delicioso líquido fumegante e repleto de marshmallows para Harry e se sentou ao seu lado. Então, instantes depois, puxou o menor novamente para o seu colo.

Eles ficaram assim durante alguns minutos, em silêncio, apenas bebendo chocolate quente e contemplando o fogo trepidar na lareira.

- Você está feliz, Harry?

- Eu estou feliz – respondeu com indiferença, sabendo ser aquilo o que Tom queria ouvir. E ele estava certo, pois, ao seu lado, Tom sorriu satisfeito.

Mas Harry não se sentia feliz.

Na verdade, há muito tempo, ele não sentia mais nada.

FIM

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N/A: Finalmente, meus amados leitores, nós chegamos ao final dessa história. Acredito que não tenha terminado da forma que alguns de vocês esperavam e, para falar a verdade, tampouco da forma que eu mesma esperava quando comecei a escrevê-la e já tinha o capítulo final na minha mente e num esboço. Tanta coisa mudou... Eu mudei. E, com essa mudança, ficou difícil romantizar certas situações que antes eu veria com normalidade e acharia bonito. "O Tom sequestrou o Harry e manipulou a vida dele, mas eles são tão lindos... Ah, foi por amor, os dois devem acabar felizes no final". Não, não foi por amor. E não, não tem como os dois acabarem felizes quando um deles não se importa verdadeiramente com a felicidade do outro. Eu finalmente percebi isso e, por isso, essa história acabou assim, tão... real.

Isso não significa, é claro, que eu deixarei de escrever sobre o meu casal favorito. Harry e Tom são e sempre vão ser o meu ideal de amor. Mas esse ideal vai se refinando, se curando, e refletindo novas perspectivas. Espero que vocês gostem, meus amores! E, em breve, prometo trazer uma nova – e mais feliz, rs – história com esses dois.

Então, por favor, deixem suas REVIEWS e me digam o que acharam desse desfecho!

Muito obrigada mesmo pelas Reviews de vocês e meus agradecimentos especiais para:

Maria Eduarda... Sandra Longbottom... Jasper1997... Hanii Seirios Slytherin... e FranAssis!

Um grande beijo e até a próxima história!