Último capítulo no ar.


Tsumetai

"O que estava em seus olhos era o verdadeiro amor" – Gaiden, 700/10.

Capítulo Final

Nada na postura de Sasuke poderia ser considerada anormal ou fora de qualquer comportamento costumeiro. Sakura hesitou ante a surpresa do rumo do diálogo. Estava pronta para brigar com ele, o que seria praticamente inédito, mas provavelmente Sasuke descobriria da pior maneira como ela estava cansada por ele supor mais do que lhe cabia.

Dessa vez foi... diferente.

O shinobi, por sua vez, se mexeu no sofá, desconfortável com a falta de reação. Sakura teria muito o que pensar, é certo. Até aqui, em cem porcento das vezes em que partiu da vila, a havia deixado para trás. Colocá-la em perigo inutilmente não poderia ser considerado mesmo quando era um gennin, e, em menção a seus propósitos de vingança e redenção, menos ainda houveram intenções de envolvê-la em tais assuntos. Eram objetivos que só fariam sentido se alcançasse sozinho, afinal.

— Você não tem que responder agora. — Por fim, decidiu dá-la algum tempo.

— Eu preciso responder agora, só não pensei que esse seria o rumo dessa conversa.

— Só tenha certeza, antes de qualquer decisão

Sakura reprimiu uma expressão surpresa. Intrigava-lhe a maneira como Sasuke raciocinava. Quiçá ele não entendesse completamente o lugar que tinha em seu coração.

— Ainda que você supostamente não me chamasse — começou, enfim — eu iria, se estamos casados, é bom que me inclua a partir de agora. Você tem muito a aprender ainda para não saber disso. Que idiota.

Idiota... Provavelmente era assim que Naruto se sentia ao ser insultado por ela, sem ferramentas para se defender. Limitou-se a ficar calado, uma atividade que fazia melhor que a maioria. Talvez, sim, Sasuke tivesse um longo e penoso caminho a percorrer, onde o matrimônio atravessava papéis oficiais e toques físicos. Vê-la como companheira e ajudante, incluindo-a em sua jornada mais pessoal e difícil, seria o maior desafio de alguém que aprendeu a vida toda a ficar sozinho.

Ela tinha seus compromissos, aspirações e devoções, ele estava absolutamente certo em levar em conta cada ponto e conquista. Nenhum de seus méritos foram alcançados facilmente e, a seu próprio modo, Sakura protegia os interesses de Konoha. Acompanhá-lo numa jornada significaria guardar a vila das sombras, entender o papel antagônico de Sasuke, a nova dinâmica pós-guerra e compreender a forma como o Uchiha via o mundo com seus próprios olhos.

— Serão anos — Sasuke reforçou, para que ela decidisse apropriadamente. — Sem nenhum contato com a Folha.

Sakura suspirou com cansaço. Algumas vezes, Sasuke conseguia ser irritante.

— Eu sou uma shinobi, assim como você. Minha família está habituada, meus amigos entendem melhor do que qualquer um e o hospital já consegue gerir-se por contra própria, eu só preciso de um tempo para repassar meus pacientes para outros médicos. Quanto aos seus inimigos, acho que você já me viu lutando o suficiente.

Sasuke demorou alguns segundos para assentir, passando o indicador entre as sobrancelhas rosas para desfazer a ruga de irritação. Tinha dificuldades para mensurar seu nível de estresse.

— Eu sei que você é forte, Sakura. — Sasuke viu a postura de sua esposa relaxar.

— Então confie mais. É claro que eu quero ir porque me preocupo com você, mas também me preocupo com minha vila e as pessoas que vivem aqui. A guerra foi algo que eu também vivi, e vi centenas de pessoas morrerem nas minhas próprias mãos, coisas que você ou Naruto não fazem ideia. Tanto quanto você, quero evitar que algo assim aconteça de novo.

— Se conseguirmos as pistas corretas, será possível.

— Então não há mais o que pensar, há? Por que não me dá mais detalhes?

Sasuke tomou fôlego, às vezes não passava de um homem simples com assuntos ordinários: jutsus e estratégias estavam no seu topo de conversas mais discursadas. Aos poucos, contou-lhe de suas primeiras pistas, a fundamentação de suas suspeitas, documentos antigos e relatos em lugares remotos, tentando se lembrar de tudo que estava no relatório enviado a Kakashi, outrora. Sua voz era extremamente profissional ao falar do trabalho, respondendo às perguntas de Sakura calmamente.

Nesta missão, buscaria confirmar a existência de Zetsus desgarrados do exército de Kaguya, para então caçá-los, interrogá-los e exterminá-los. Ele tinha alguns pontos de busca já marcados em mente, lugares geralmente ermos e de difícil acesso, onde haviam histórias e boatos de homens brancos caminhantes.

Durante as horas seguintes, compartilharam informações sobre os terrenos e teorias sobre estes estranhos seres, com Sakura narrando sua própria experiência ao derrotar um deles quando tentaram se infiltrar na Aliança Shinobi.

Sasuke também priorizou a importância do sigilo desta missão. Sugerindo que era melhor que todos pensassem que se tratava apenas de uma extensão de sua viagem anterior, agora com sua companhia. Quanto menos pessoas soubessem do real objetivo, menos chances de alguma informação vazar e alguém com interesses ocultos tentar se aproveitar da brecha para prejudicar as Cinco Nações.

Sussurros sopravam a existência de espiões e infiltrados por Konoha, apenas esperando uma chance para perturbar a paz através de um ponto fraco. E não havia nenhuma garantia de que Zetsus não eram um deles, caminhando nas ruas da vila fingindo-se de civis.

Boa parte da tarde foi tomada pela preocupação e um longo debate sobre o assunto, ao montarem um roteiro de por onde deveriam seguir e uma forma de identificarem os inimigos, uma vez que podiam assumir a forma de qualquer um. Sakura tomava notas num caderno com capa de couro, tomando o cuidado para usar um ninjutsu para ocultar o conteúdo.

— O que você vai fazer amanhã? — Sakura perguntou-o, quando os assuntos sobre a missão se esgotaram e suas dúvidas estavam sanadas, enquanto caminhava para a janela da sala e fechava-a.

Sasuke levantou-se do sofá, esticando a coluna e acendendo a luz quando a casa começou a ficar escura com a chegada do anoitecer.

— Tenho assuntos com o hokage. — Olhou-a, esperando que ela também pudesse dizer sua própria resposta. Sakura sorriu.

— Provavelmente eu vou estar ocupada durante o dia todo, e ainda preciso ver Hinata pela manhã. Mas eu acho que, em algum momento, deveríamos treinar um pouco juntos.

— Treinar? — ecoou.

— Isso mesmo.

Sasuke arqueou uma sobrancelha. Por todos esses anos, não se lembrava de ter particularmente praticado qualquer técnica com Sakura.

Quando gennins, considerava-a até mesmo pior que o Naruto, então dificilmente a teria como um desafio. O próprio Kakashi, ao passar exercícios ao time, subestimava a integrante feminina, reduzindo-a à função de suporte ou vigia, mantendo-a segura na retaguarda enquanto assistia aos colegas lutarem, olhando para suas costas à distância. E depois de toda a guerra não houvera nenhuma oportunidade assim, nem mesmo com Naruto.

— Temos que melhorar nossa comunicação e praticar alguns movimentos.

— Você vai estar ocupada — comentou, referindo-se ao fato de que ela, em certas épocas, entrava por aquele hospital e ele só a via dias depois, sempre exausta e com suas reservas de chakra em níveis perigosos.

— Terei algumas horas por noite nos próximos dias. Podemos fazer em uma das zonas de treinamento chunin — Sakura começou a dizer, e enquanto isso, abria os armários da cozinha, para onde se dirigiram um pouco depois. Ela ainda não tinha certeza de onde estava cada item ainda, acostumada com a arrumação na casa de sua mãe. Mas como Sasuke era organizado, a tarefa de encontrar algo era relativamente simples.

Sasuke observou-a se movimentar, buscando encher um copo de água, não muito familiarizado com sua presença nos cômodos ou com seu cheiro suave. Normalmente, a casa tinha aquele eco comum dado a lugares vazios ou muito grandes, mas não se lembrava de tê-lo ouvido desde que Sakura havia chegado. Ponderou sobre o assunto de treinarem juntos, sabendo que ela provavelmente tinha razão. Não tinham muitas experiências lutando lado a lado e não poderiam contar apenas com a intuição e instintos, correndo perigos desnecessários.

— Diga quando, Sakura.

#

Era uma manhã agradável e as lojas haviam acabado de abrir suas portas. Uma senhora em particular, ao destrancar a entrada, ficou surpresa ao ver aquele rapaz em sua loja. Muitos anos antes, quando ainda vivia numa cidade abandonada, ele visitou-a exigindo ferramentas para seu time de mercenários, buscando meios para assassinar o próprio irmão. Anos se passaram desde então e continuava um rapaz bonito, embora alguns centímetros mais alto e com os traços de seu clã amadurecendo em seu rosto. Conjecturou se ele estava buscando um novo alguém para se vingar novamente.

— Sasuke — cumprimentou-o, seus gatos cheiravam o ar, tentando reconhecer o novo cliente.

— Nekobaa — devolveu, com uma inflexão respeitosa.

— Faz muito tempo — a senhora comentou, com um sorriso gentil no rosto. Seus olhos já pequenos fecharam-se um pouco mais com o gesto. Apesar de curiosa, evitou fazer perguntas a respeito de qualquer coisa que não tivesse relação com uma possível venda. — O que minha loja tem a te oferecer?

Sasuke olhou ao redor. Originalmente, Nekobaa serviu aos Uchiha durante muitos anos, residindo em ruínas que comportavam armas, equipamentos e roupas do clã. A senhora era responsável por suprir as necessidades da família, sendo paga por seus serviços rigorosamente. Com o massacre, seus negócios decaíram ao ponto da falência. Nekobaa pretendia morrer naquela cidade, não fosse pela insistência de sua neta e parentes residentes em Konoha, onde reabriu seu negócio.

As vendas iam surpreendentemente bem, e ela frequentemente se aborrecia pelo design exigente e cortes complicados da nova moda shinobi para vestuários e armas. Além disso, sua posição parecia estar prejudicando a tenda de armas de uma moça logo em frente, que vivia suspirando sem clientes.

— Sua família serviu a minha por muitos anos — Sasuke disse, por fim. A senhora apenas o olhou, expectante e interessada. — Por um preço razoável, seus serviços seriam contratados novamente.

— Por um preço razoável, sim. — Nekobaa sorriu, um sorriso de comerciante experiente. — Do que você precisa?

— Por hoje, isto. — O Uchiha lhe entregou um papel dobrado, a senhora o pegou e buscou os óculos de leitura de dentro de um dos bolsos. Com cuidado, leu os escritos. Eram medidas, escritas com uma elegante caligrafia. Arqueou uma das sobrancelhas.

— Isso não é um pouco pequeno para você?

Sasuke olhou para baixo, um dos gatos começou a roçar e ronronar em suas pernas.

— É para minha esposa.

Ele não viu o rosto surpreso da senhora. A notícia do secreto casamento não havia, afortunadamente, chegado até a maioria das pessoas. Nekobaa perguntou-se como isso havia acontecido, pensando em como sua neta estava certa sobre ter perdido muita coisa por viver naquela cidade fantasma por tanto tempo. Não faria perguntas pessoais, mas, ao olhar o papel, ela com certeza tem o corpo de uma kunoichi.

— E como devo fazer a peça?

Sasuke pensou, isso não lhe ocorreu.

— Eu não...

— Você não trouxe nenhum modelo? — Sasuke balançou a cabeça. — Você pode me trazer alguma roupa dela, então?

— Não terei tempo para isso.

— Bom, tudo bem — a senhora suspirou. — Que tipo de roupa ela gosta?

Ele provavelmente deveria ter pensado nestes detalhes antes de vir até a loja, mas não havia maneira de voltar uma outra hora, também. Pensou por alguns segundos nos uniformes que costumava ver Sakura usar, nas roupas caseiras e como ela gostava de ter seus movimentos desimpedidos.

— Algo confortável, apenas. Desta cor. – Ele apontou para um dos rolos de tecidos nas paredes.

Nekobaa sorriu, teria de perguntar a sua neta alguma sugestão.

— Você pode buscar a peça daqui dois dias. — Nekobaa viu o rapaz assentir sem emitir qualquer som, virando-se para deixar a loja. Olhando para ele, a senhora sentiu uma pontada no peito. Dirigiu-se aos carretéis de linhas vermelhas, procurando o tom específico daquele clã que renascia das cinzas. — Sasuke — chamou-o, sem esperar que ele respondesse — será um prazer atender sua família novamente.

Assim, Nekobaa voltou toda a atenção para seu ofício e Sasuke deixou nas mãos dela toda a significância daquilo que viria a ser um presente para Sakura, mas uma afirmação para todos.

O clã Uchiha, afinal, começava a ser reestabelecido.

#

A reunião com o Hokage demorou menos que o esperado. Apesar do breve silêncio sucedido a fala de Sasuke, Kakashi não parecia relutante à ideia de que seus dois alunos sairiam em jornada, mas fez recomendações para que mantivessem contato frequente, tanto quanto possível, considerando as condições da missão e a distância que percorreriam. Apenas pediu para falar com Sakura também, em breve, pois ela deveria decidir sobre quem assumiria seu cargo no hospital em seu tempo fora como chefe interino. Provavelmente Shizune seria a escolha óbvia.

Em casa, Sasuke almoçou sozinho e assim ficou até algumas horas da madrugada, quando, desacostumado com os sons diferentes na casa, ouviu a porta se abrindo e instintivamente levantou, acendendo a luz do quarto e do cômodo adjacente. Encontrou Sakura no corredor, andando nas pontas dos pés.

Não queria te acordar. — Sua voz era um sussurro como se ele estivesse ainda dormindo.

— Já estava acordado.

— Que mentira, sua cara está um pão amassado.

Sasuke ignorou-a, observando seu cansaço.

— Está tarde.

Sakura assentiu, e continuou: — Te explico na cozinha. Estou morrendo de fome.

Sasuke esfregou o rosto, espantando o sono, por fim.

— Vou esquentar o almoço.

— Hm! O que fez de gostoso?

— Misshoshiru.

— Finalmente vou provar uma comida sua. Estou curiosa.

— Não crie expectativas. É só uma sopa.

Sasuke não tinha muito orgulho de sua gastronomia, considerava seu curto repertório de pratos apenas comestível – indigno de elogios. Seus cortes no tofu estavam bons, perfeitamente cúbicos, mas o tempero era comum e sem personalidade. Com a morte de seus pais, sozinho, tivera que se arriscar na cozinha algumas vezes e aprender receitas saudáveis. Em alguns momentos, houveram acidentes. Às vezes, se rendia ao conforto do rámen. Noutras, escondia seu bentô com arroz queimado e comia sozinho, longe das outras crianças da academia.

Apesar de tudo, quando Sakura recebeu a tigela, comeu quase a metade antes de falar qualquer coisa.

— Nada mal, Sasuke-kun! É a primeira coisa que como em horas... eu estava com Hinata durante a manhã e, de repente, estava fazendo uma cirurgia a tarde. O paciente teve várias complicações, durante. Mas correu tudo bem. E agora estou aqui.

— Coma primeiro, Sakura. Conte a história depois.

Ela balançou uma mão, mordendo mais um pedaço de tofu.

— Estou acabando... conversei também com meus colegas da clínica, antes de tudo. Eu vou levar alguns meses antes de conseguir transferir todos meus pacientes. Queremos fazer isso de forma gradual, muitos já estão num ponto avançado do tratamento e não podemos perder essa evolução, mas imagino que nós não tenhamos todo esse tempo, não é?

— Não, em poucos dias preciso ir ou perderemos as pistas.

— Eu compreendo — murmurou, matizes de tristeza refletiam sua fala, finalizando o caldo e empurrando a tigela vazia para frente. — Você não deve se arriscar sozinho até lá.

— Quando for a hora, envie uma mensagem por meu falcão. Ele ficará com você e saberá me achar.

— Hnm... está bem.

Sakura se levantou, levando a louça até a pia, retornando a mesa, fazendo um pequeno carinho em seu ombro. Seus olhos estavam baixos, mas a motivação ia além da sonolência sentida: já não estava tão acostumada com a ausência de Sasuke. Antes, parecia natural que ele não estivesse ali. Havia se tornado uma rotina amarga; ficar preocupada era um papel que genuinamente desempenhava todos os dias e, sendo honesta, estava pronta para deixar essa figura ansiosa no passado.

— Vou sentir sua falta.

— Vai ser breve. — Sasuke apertou os dedos dela, trazendo sua mão para perto e olhando para seu rosto. — Você tem que descansar.

— Eu vou, depois de um banho. — Ela suspirou, olhando os móveis ao redor. — Parece que não vamos conseguir morar aqui como um casal normal tão cedo.

O tom de voz indicava que ela provavelmente estava de alguma forma brincando com ele, desanuviando o sentimento ruim pelo que estava por vir, mas o Uchiha, apesar de não poder lê-la na mesma proporção que Sakura podia fazer consigo, conseguia identificar o mecanismo usado por ela para dizer algo que, ele sabia, era verdade. Meio segundo atrás, sentiu nela uma aura estranha, antecipada em sentir uma emoção da qual ele também compartilharia se estivessem separados. Talvez fosse cedo demais para pensar nisso – mas não era ninguém para ditar coisa alguma.

Isso não parecia adequado.

Sasuke se levantou da mesa de jantar, acompanhando Sakura que subia as escadas em direção ao banheiro, apagando as luzes do andar debaixo. O som da pantufa ficava abafado na madeira e só se ouvia algum tipo de ave de rapina que murmurava na natureza. Pensou se a fazia se sentir vigilante sobre tudo ou se ela almejava algum tipo de meta de relacionamento que estavam longe de atingir, espelhando-se em conhecimentos privilegiados que Sasuke não tinha acesso.

— Sakura. — Esperou-a se voltar para ele. O tom de voz de Sasuke era casual, assim como a postura: — Você está bem com isso?

— Com o quê? — Ela chegou mais perto até dividirem o mesmo degrau.

— Com o jeito que as coisas são.

— Ah... isso, acho que sim. Sei que não somos o tipo de casal tradicional. O que é bom, outros maridos não esperariam a esposa e ainda fariam o jantar, sabe? Tenho sorte. — Ela o olhou com um sorriso torto nos lábios, mas o Uchiha continuava sério.

— Sorte — repetiu, com uma inflexão pessimista.

— Talvez não seja a melhor palavra, não foi por sorte que chegamos até aqui. A distância vai me incomodar, Sasuke-kun, sempre me incomodou, mas eu posso conviver com ela. — Sakura se inclinou para frente, pouco a pouco tomando espaço e enrolando os braços pequenos ao seu redor, o nariz enterrado na camisa branca de dormir, inspirando o cheiro familiar do seu sabonete e loção. — O jeito que as coisas são está bem, só não posso evitar me preocupar. Não ter notícias é... torturante.

— Desculpe. Vai durar pouco.

O Uchiha sentiu o desenho dos lábios dela formando outro sorriso contra seu peito.

Com os braços enfim ao redor dela, o abraço tomou forma da mariposa não nascida protegida no casulo. Sakura carregava o perfume esterilizado do hospital, diferente do costumeiro, e isso logo anuviou-se e deixou de ser um detalhe. As mãos dela apertavam os músculos de suas costas com os dedos, e seu cabelo rosa fazia cócegas em sua bochecha.

Esse tipo de abraço acontecia não muito corriqueiramente, mas era melhor, muitas vezes, que beijos, olhares e gestos. Um abraço que parecia saudade de quando se estava perto, que durava alguns minutos suspensos, que ficava apertado e se afrouxava, e quase parecia que um coração entraria dentro do outro.

#

Sakura já estava dormindo há uma hora, mas seu próprio sono havia partido com a chegada dela. Estava junto de si na cama e pelas frestas da janela de madeira Sasuke via os primeiros tons do nascer do sol, acompanhado pelo frio tímido da manhã que, naquele dia, começava chuvosa. A pequena fonte de luz tirava-o da completa escuridão, iluminando sua esposa deitada displicente sobre a cama, uma faixa de luz fria incidindo sobre suas pernas, cobertas apenas por uma manta.

Havia coisas pendentes a resolver, mas Sakura estava perto demais para que pudesse sair sem arriscar acordá-la. De todo modo, menos ainda queria partir.

Estava convencido de que não adormeceria e durante algum tempo esteve correto. Seu polegar deslizava pela pele do ombro em movimentos incertos quando as sobrancelhas dela franziam ou se remexia inquieta, desacostumada com aquele novo ambiente, tomando o lugar de uma canção de ninar. No entanto, com o passar dos minutos a cadência da respiração dela ditou seu cansaço, viu-se piscando os olhos no mesmo ritmo que o peito dela subia e descia, trazendo-a para mais perto até enfim se render àquele quase divino aconchego.

Horas mais tarde, o sol havia ascendido alguns graus no céu nublado. Sasuke abriu os olhos, encontrando Sakura de costas para si, as curvas moldadas a ele mesmo como se naturalmente houvessem encontrado aquela posição enquanto dormiam. Ela permanecia imóvel e um de seus braços estava ao redor do corpo pequeno. Ao instintivamente aproximar o rosto, a kunoichi teve um arrepio e os pelos da nuca fizeram cócegas na ponta do nariz de Sasuke.

Está acordada? — perguntou, a voz levemente enrouquecida. Ela se encolheu e depois se espreguiçou, como um gato, voltando para o aperto.

— Sim. Que horas são? — Ainda mantinha os olhos fechados, um leve sorriso parecia despontar no canto da boca. Poderia dormir um pouco mais, se insistisse.

— Tarde. Dez, onze.

Sakura puxou a manta para acima dos ombros, enrolando-se, a chuva havia parado alguns momentos antes, restando apenas o som da água escorrendo das calhas.

Empurrou-se contra Sasuke, sentindo seu calor e respiração na orelha. Uma respiração que começou a ficar pesada não muito depois, repentinamente mudando as notas de sossego da manhã. Sakura não demorou a perceber o porquê.

Suavemente, evitando movimentos bruscos, virou-se para olhá-lo, seu corpo roçando na ereção que ele mal podia chamar de involuntária, pois estava muito ciente de que era completamente culpado por isso. E que por pelo menos duas vezes antes estivera nessa mesma situação, ponderando entre a ideia de acariciá-la em locais que ele normalmente não faria, mas evitou fazê-lo, longe de uma postura que ele consideraria inadequada para este momento, incapaz de racionalizar uma reação descente.

Sakura umedeceu os lábios, encarando-o de maneira que até incomodava. Seu rosto já estava quase que da mesma cor dos cabelos e Sasuke não estava entendendo bem aquele suspense ao redor dela. Levando em consideração as últimas horas no ryokan, pensou que esse tipo de coisa já havia se tornado razoavelmente natural para os dois.

Ele não sabia, mas, às vezes, sua dificuldade em transpor as camadas de Sakura tinham um resultado positivo, pois cedendo a uma ideia jogada por Ino e alimentada por ela mesma, a iryou-nin pensou se esse não era o tal momento.

Faltava um impulso de coragem a mais. Que não veio.

Mas ela o fez mesmo assim.

— Não fique olhando demais.

— Do que está falando? — perguntou, confuso e alegadamente desconfortável. Mas foi por um breve momento, apenas até sentir as mãos dela no cós da calça de flanela, puxando-a para baixo de uma vez só, expondo-o sob a manta. Mal teve tempo de compreender o curso dos acontecimentos, a própria Sakura foi naquela direção e ele sentiu algo quente e úmido envolvê-lo, realizando-se que era sua boca, timidamente tocando-o e descobrindo ela mesma uma nova sensação. — Porra.

Ela havia começado com beijos que provavelmente tinham um efeito insosso, mas Sasuke, inexperiente, não saberia a diferença. Biologicamente, Sakura sabia onde e como ele sentiria mais prazer, mas lhe faltava todo o resto. Sabia que seus dentes haviam o arranhado mais de uma vez, embora Sasuke não houvesse tido qualquer reação sobre. Haviam certos movimentos que ele parecia apreciar mais, mas seus pensamentos facilmente desviavam-se para longe e era difícil reproduzi-los linearmente.

A médica demorou até encontrar um ritmo e coragem para suavemente introduzir uma pequena parte em sua boca, guiada pelo alento profundo de Sasuke e o retesar de seus músculos.

Quando Sakura enfim constatou uma fórmula que funcionava – ainda que houvesse uma inocência no movimento de suas mãos e língua – ela poderia jurar que seu marido quase pareceu gemer.

Sasuke trincou os dentes quando percebeu todo seu corpo fluir para um só lugar, prendendo a respiração. Uma sensação tão indescritível como quando no ryokan, mas talvez essa fosse a coisa mais sensual que já tivera oportunidade de ver e povoaria seus pensamentos tanto quanto a nudez de sua esposa. A franja de Sakura escondia os olhos verdes, mas era um poderoso afrodisíaco poder ver sua boca e ao mesmo tempo senti-la em si.

Sua borda transbordou mais cedo do que ele poderia suportar, de maneira tão inesperada quanto o início daquela manhã, sentindo-se líquido, devastado. Sua respiração levou algum tempo para se normalizar.

Seus olhos, fechados involuntariamente, abrirem-se e constataram que Sakura havia ido para o banheiro. Sentou-se na cama, colocando suas roupas desalinhadas de volta em cada lugar. Suas mãos foram do cabelo para o rosto, esfregando quase com rudeza, com uma leve impressão de incredulidade, na tentativa de voltar ao mundo. Genuinamente atordoado por Sakura conseguir ser irritante a tal ponto – edeus sabe por quantos outros mais.

O retorno de Sakura ao quarto ficou marcado por um pequeno silêncio. A expressão dela era inquieta frente a austera de Sasuke. Ele olhou-a de baixo a cima, permanecendo um pouco a mais na boca avermelhada.

— Sakura.

— Bem, eu espero qu— ele interrompeu-a, contudo.

— É sua vez.

#

Os dias finais antes da partida de Sasuke se passaram rapidamente e com o passar deles ambos se prepararam para a breve separação. Os últimos momentos foram recheados de pequenas alegrias, descobertas e a intimidade pareceu aumentar em todos os níveis, cobrindo arestas e lacunas deixadas por anos não vividos.

Sakura descobriu manias que nunca havia reparado antes em Sasuke, como o jeito como ele enrolava o fio dental nos dedos ou como lavar a louça deveria obedecer a um ritual: copos, pratos, talheres e panelas. Sempre nessa ordem.

E ele mesmo achava estranho que ela ao mesmo tempo que estivesse cozinhando podia ler um livro e praticar algum movimento de ioga, como se não fossem coisas demais e diferentes demais para se fazer de uma só vez. Também descobriu que treinar com ela mostrava como Sakura havia herdado a competitividade de sua mestra. Ela realmente odiava perder e ele, por segurança, ficou feliz por ser vencido.

Na saída do Portão Oeste da vila, menos movimentada, estavam a sós e se encaravam para alguém enfim iniciar aquela difícil despedida. Nenhum dos dois tivera coragem de imediato.

— Trouxe seu obentô. Para almoçar depois. — Ela lhe entregou delicadamente o embrulho, havia colocado todo seu talento culinário ali, com porções nutritivas e saborosas.

— Obrigado.

— Coma bem.

— Eu vou.

— E não durma ao relento.

— Isso depende, você sabe.

— Sei, mas se possível.

— Tudo bem.

— Se algo acontecer, mande notícias.

— Não vai acontecer nada.

Se.

— Sakura.

— Só... cuide-se.

Ela acariciou seu rosto, brevemente, recolhendo a mão de volta. E se inclinou em direção a ele de maneira sugestiva, esperando por algo que Sasuke já sabia. No entanto, o rapaz procurou algo em sua bolsa de viagem e tirou de lá um pacote envolto em papel seda branco, uma linha de sisal mantinha o conteúdo protegido e levava no nó o brasão da loja de Nekobaa. Sakura pegou o embrulho com surpresa.

— Sasuke-kun, eu não... Obrigada.

— Abra.

Não sem alguma hesitação, a kunoichi desfez o laço e abriu o presente. Uma peça vermelha se revelou. Era uma blusa com três nós-sapo próximos da gola. Achara a peça linda imediatamente, mas obviamente ficou surpresa ao virá-la para medir no corpo e ver o símbolo bordado a mão nas costas. Ela olhou entre Sasuke e o tecido, apertando a blusa contra o peito. Seus olhos marejaram por algo que não poderia controlar.

Eu...

— Você é uma Uchiha. — Sasuke parecia quase formal, abaixando-se na altura dos olhos verdes. Indicou o símbolo preso dentro da mão dela. — Será uma honra.

— Obrigada — respondeu-o, do fundo do coração, os dedos resvalando na superfície bordada do leque Uchiha. — Significa muito.

— Usá-lo pode trazer hostilidade, Sakura. Não tenho intenção de colocá-la em situações desagradáveis, então use quando estiver segura.

— Se eu pudesse, colocaria agora. Que bobo. — Sakura soltou um risinho fraco, que foi desmanchando-se aos poucos, sabendo que havia adiado demais o momento.

Ele retribuiu com um pequeno sorriso, analisando seu rosto: — Obrigado.

E, sem emitir qualquer som, os lábios dela gesticularam uma frase que apenas Sasuke poderia ler.

Seus destinos se separariam por uma vez mais, unidos apenas por um fio invisível, mas forte o suficiente para reaproximá-los tantas vezes quanto fossem necessárias. Seus caminhos seriam cobertos por desafios que, descobririam, só poderiam ser superados se estivessem juntos e, no entanto, apenas porque um dia tiveram que viver separados. Cada desafio vencido num dia a dia de rotinas e trejeitos serviriam como base e sustento para dias vindouros sombrios que pairariam sobre o casamento, através de um sentimento fortalecido.

O mundo shinobi foi construído e marcado por tristezas, injustiças e lutas que colocavam o dever acima da própria existência daqueles que o sustentavam. Provavelmente, não seriam eles a quebrarem a roda e o ciclo em que as grandes nações confortavelmente se apoiavam.

Talvez isso viesse de uma pequena luz. Uma luz que pintaria o último espaço na tela em branco do coração de Uchiha Sasuke e preencheria os dias de Sakura de euforia e felicidades.

Uma luz chamada Sarada.

Fim.

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Iam ser dois capítulos finais, mas não me agradaram da maneira que foram escritos, então os reduzi e formei apenas um. Só quero agradecer pela paciência de cada um de vocês, o apoio imenso e cada comentário especial. Espero que tenham se divertido, shippado e sofrido comigo nessa história. Foi um prazer escrever Tsumetai e espero que ela esteja em seus corações, pois vocês estão no meu. É meu presente e contribuição para esse casal tão lindo. Obrigada... e até uma próxima vez. Um poke em todas vocês.

Se você nunca comentou, é sua chance! O que achou?


Hmm's09: Que nick difícil, ein? Mas lindo! Ainda bem que aqui o Sasuke conseguiu ser agradável aos seus olhos. Eu quis desenvolver mais o pessoal de ambos, os personagens de Naruto passam por muitas lutas internas, talvez essa etapa da vida fosse uma delas. Então muito obrigada e espero que aprecie o final. Nos vemos!

Detch: Que bom que gostou, meu anjo, planejo continuar e, hoje, acaba de ser concluída. Nos vemos por aí!

Guest: Muito obrigada! Espero que tenha gostado do final. Beijos! Nos vemos!

Mel Itaik: Sim, Mel! Você foi a única e me deu um grande apoio, de verdade. Agradeço muito, cada palavra é importante e levo no meu coração. Nos vemos por aí!

Larissa: Acho que muitos ficaram. Demorei dois anos ou quase isso para voltar, mas fiquei muito feliz por ter voltado e mais surpresa ainda por ter pessoas que ainda leriam essa história. Obrigada. Nos vemos por aí.

Uchiha-Leeh: Oh, obrigada por isso, eu estava precisando. Nos vemos por aí!

Bloodsteined Alice: Fiquei feliz também de estar de volta, obrigada pelo carinho e recepção! E também pelo cuidado na leitura, obrigada mesmo. Nos vemos por aí!

Myagarah: Minha velha companheira, um prazer sempre vê-la. Agradeço por ter estado neste barquinho comigo desde os primeiros capítulos. Obrigada pelo seu apoio, comentários e incentivos. Espero que tenha sido divertido até aqui e nos vemos por aí!

Hyunbak: Meu anjo, muito grata por seu comentário, fiquei muito feliz por retornar. Nem eu achava que o faria. Obrigada pelos elogios, mais uma vez, e nos vemos por aí!

Umaestudante: Que bom que me encontrou, e eu fiquei feliz por tê-lo feito. Lia bastante histórias em inglês também, eles tem uma qualidade muito boa de escrita e pra mim você ler minha história me deixa realizada de muitas maneiras. Muito obrigada e nos vemos por aí!

SunflowerUchiha: Nunca me cansaria de uma leitora tão querida quanto você. Nunca um leitor teve palavras tão carinhosas assim, de verdade, do tipo que aquecem meu coração e acalmam minha ansiedade, Sunnie. Eu concordo totalmente com você, pois sou uma grande fã de putaria, então tenho que te agradecer muito por me acompanhar nessa jornada e me incentivar. Um grande abraço e nos vemos por aí.