Colheita

AU: "Eu nunca agradeci ao garoto com o pão. Agora eu nunca irei." – Colheita alternativa.

N/A: Essa fic é uma tradução de "Reaping", da Swishy Willow Wand. Eu amo as histórias dela, por isso resolvi compartilhar com vocês. Espero que gostem!

Não tenho direitos sobre Jogos Vorazes nem sobre "Reaping".

Uma garota com longos cabelos pretos, muito parecidos com os meus, caminha com dificuldade até o palco, mãos segurando seu vestido, um olhar débil em seu rosto. Por perto, em algum outro lugar, eu ouvo o choro, o som de uma família se dissolvendo. Mas tudo o que sinto é a tensão lentamente deixando meu corpo. Segura por mais um dia.

Quando eles chamaram o nome da garota – Grey Rankine, uma garota bonita de Costura que parece tanto comigo que poderia ser minha irmã – eu me senti tonta de alívio. É uma coira terrível, ficar feliz sabendo que essa garota estaria enfrentando uma morte inevitável, mas tudo o que eu consigo pensar é – eu não, eu não, eu não. Mais dois anos dessa zombaria, dessa tortura, e eu poderei estar livre. E Prim – Prim!- está salva, passando fácil pelo seu primeiro ano. Só faltam mais seis.

Effie Trinket balbucia sem pensar no palco, escorrendo com entusiasmo. Quanta honra! Que sorte! Garota de sorte! Ela está totalmente alheia à agitação da multidão, à menina vacilante no palco com lágrimas escorrendo pelo rosto, claramente à beira de um colapso, ignorando os soluços que permeiam o ar. Ao invés disso ela sorri abertamente, movendo-se para a taça de vidro cheia de nomes e futuros e morte, e excitadíssima anuncia: "Agora é hora de selecionar o sortudo tributo masculino!"

Através da multidão eu vejo Gale, seu rosto duro e imóvel. Minha mente pode ser altruísta agora, a necessidade de pensar somente em mim acabou, e meus pensamentos imploram por ele – Gale não, Gale não, Gale não.

A mão de Effie mergulha na vasilha de vidro e descuidadamente pega um pedaço de papel - como é fácil mandar alguém para a morte - e rapidamente volta para o microfone.

Não é Gale.

É Peeta Mellark.

Tudo estava indo tão bem. Eu penso de volta nessa manhã: o queijo de cabra fresco, caçando com Gale. Morangos e peixe e pão fresco, a promessa de uma refeição feliz na volta para casa, uma vez que a colheita acabou. Quase como um feriado. Agora, a dura realidade do mundo em que vivemos pisca de volta à vida, e eu fiquei em choque. Ele não. Peeta não.

Antes que eu possa espantar as ondas de choque, antes que eu sequer possa pensar, ele está no palco. Suas mãos ficam abrindo e fechando, seu rosto desprovido de emoção, exceto seus olhos, que contêm um desespero que eu só tinha visto nos animais infelizes que eu encontrei presos nas intrincadas armadilhas de Gale. Effie Trinket respeitosamente pergunta se há voluntários, mas a multidão permanece calada - voluntários são desconhecidos no Distrito 12, onde estar sendo colhido é uma sentença de morte garantida.

Prefeito Undersee marcha para frente, recitando o dolorosamente longo Tratado da Traição. Todo o tempo meus olhos estão colados à figura no palco, meu estômago agitado com uma emoção que eu não consigo nomear. Grey está chorando abertamente agora e eu noto vagamente que ela será descrita pela Capital como fraca, desprezada pelos outros concorrentes. Ela provavelmente estará morta dentro da primeira hora. Peeta, no entanto, permanece estóico, imóvel, olhos distraidamente movendo-se pela multidão, provavelmente à procura de sua família.

Meu coração aperta no peito e tenho certeza de que esqueci como respirar. Porque a colheita desse garoto deveria significar alguma coisa para mim está além da compreensão. Não existem ligações visíveis entre nós, nada que ligue meu destino ao dele. Ainda assim, tudo o que eu consigo pensar é no frio, noite chuvosa, encharcada e derrotada e faminta. Uma marca vermelha na bochecha dele, pão silenciosamente jogado na minha direção. Dois pedaços de pão escurecido pressionados firmemente contra o meu peito, queimando a minha pele. O dente de leão na primavera, e então esperança.

É quase como se ele pudesse ler meus pensamentos traiçoeiros porque, inexplicavelmente, seus olhos encontram os meus, como se eu fosse a pessoa que ele estava procurando esse tempo todo. Minhas mãos tremem e no meu estômago eu posso sentir o peso de ferro de uma dívida não paga. Eu nunca agradeci ao garoto com o pão.

Agora eu nunca irei.

Fim