N.A.: Chegamos ao capítulo 4. O clímax da história! (não) Se tem alguém aí acompanhando a fic, peço mil perdões pela demora. Acho que o final de semestre na faculdade devem ser uns teaser trailers que nós seres humanos temos do inferno. Pra compensar a demora eu vou postar um extra de DVD pequenininho que eu escrevi um tempinho atrás no fim do cap. pra vocês. (:
Espero ter deixado algumas coisas mais claras nesse capítulo.
Outra coisa. Eu detesto transcrever partes do livro literalmente pra fic, mas tô chegando em pontos da história que não tem pra onde correr. :/

Disclaimer:"Harry Potter" pertence à J.K. Rowling e "Doctor Who" à BBC. Pedi os dois de Natal, mas não tô levando muita fé.


Anteriormente, em "Harry Potter and The Blue Box"...

"Após o livro e a clepsidra terem sido devidamente guardados e as amenidades terem sido trocadas, os cinco se reuniram, sorrindo, ao redor do bolo. Harry inclinou-se para assoprar as velas.
E então um enorme estrondo e o barulho de vidro sendo estilhaçado vieram da porta da frente da casa."

Capítulo 4 - The Keeper's Stratagem

- Ladrões? - Vovô Wilf murmurou, assustado.

Sylvia gritou enquanto Donna instintivamente inclinou-se para Harry e o envolveu com os braços. O Doctor deu a volta na mesa e, puxando a chave de fenda sônica, chamou alto da porta da cozinha.

- Alô! Quem está aí? Se você é um humano, já deve saber que está invadindo propriedade privada e, acredite, eu posso colocar coisa pior do que a polícia atrás de você. Se é um alienígena, eu sou o Doctor. Isso deve ser suficiente pra você saber que seria sensato sair daqui, correndo e gritando, o mais rápido possível. Só vou avisar uma vez!

- Donna, - Sylvia sibilou, entre dentes - seu marido enlouqueceu de vez?

Donna deu de ombros, como quem diz "não ligue pro que ele fala, é bobagem, juro a você" e fez uma nota mental para bater no Doctor - com força - quando estivessem novamente sãos e salvos na TARDIS.

Alheio à conversa que se passava às suas costas, o Doctor acompanhava os movimentos do intruso. Ele não se havia deixado intimidar pela ameaça dele; barulhos podiam ser ouvidos na sala, e estes soavam como algo muito grande que se deslocava em direção à cozinha pelo espaço apertado da residência dos Noble, derrubando muitas coisas pelo caminho.

(Donna realmente esperava que o baque que tinha acabado de ouvir não tivesse sido produzido pela mesinha de mogno que lhe custou cem libras.)

Os barulhos foram ficando mais e mais próximos, até que a silhueta de um homem enorme emergiu, recortada contra a luz, na porta da cozinha. O Doctor afastou-se, juntando-se a Donna, e eles ergueram os olhos para o recém-chegado. Ele era realmente enorme - muito mais alto que um homem normal - e tinha o rosto encoberto por uma juba de cabelos pretos e uma barba revolta, com apenas os pequenos olhos brilhantes visíveis.

- A casa de vocês é muito apertada, eh? - ele comentou, casualmente, antes de virar-se para Harry, a quem Donna ainda estava abraçando com força. - Ah, Harry, aí está você!

Ele inclinou-se e Harry pôde ver que os pequenos olhos brilhantes se apertaram num sorriso.

- Da última vez que eu te vi, você era só um bebê. Você parece muito com seu pai, mas tem os olhos de sua mãe.

O Doctor limpou a garganta suavemente, chamando a atenção com delicadeza.

- Me desculpe, senhor. Mas quem exatamente é você? É o aniversário de Harry, eu sei, mas ao mesmo tempo é nossa casa, entende, e não é comum convidarmos gente desconhecida para entrar, a menos que tenhamos conversado com a pessoa desconhecida antes, perguntado o nome dela e tudo, o que na verdade faria ela deixar de ser uma pessoa desconheci- - ele foi calado, abruptamente, por uma cotovelada de Donna em suas costelas.

- Spaceman. Agora não!

O gigante virou-se para encarar os dois e Harry viu a sombra de sorriso em seu rosto se desfazer, dando lugar a um olhar penetrante e maldoso.

- Não estou falando com vocês.

- Se está falando com nosso filho, está falando conosco, Sunsh- - Donna imediatamente protestou, mas foi a vez do Doctor silenciá-la de imediato, meneando a cabeça e apertando seu braço de leve à guisa de alerta. O gigante continuou a olhá-los com hostilidade antes de novamente voltar sua atenção para Harry.

- Ah, que se danem os dois. Então, é seu aniversário! Onze anos, eh? Tenho um presente pra você, espero não ter sentado nele no caminho...- ele puxou do casaco uma caixa. Harry desvencilhou-se dos braços de sua mãe para apanhá-la e constatou, ao abrir, que ela continha um bolo de chocolate inteiro com os dizeres "Feliz Aniversário, Harry" escritos com glace.

- Me desculpe, - ele perguntou, hesitante - você é um alienígena?

A pergunta foi feita antes que ele se desse conta do que estava dizendo. Ele se beliscou internamente, sabendo que sua mãe provavelmente lhe daria uma bronca e tanto por ter esquecido de agradecer o presente direito depois.

O gigante piscou, levemente aturdido.

- Eh? Ali-o-quê?

- Um... um alienígena, sabe. Não? É que seu casaco é maior por dentro. Pra caber um bolo inteiro nele, digo, seus bolsos têm que ser maiores por dentro do que por fora, igualzinho à calça do meu pai...

- Harry! - Sylvia interveio, abruptamente - Que história é essa? Não invente bobagens.

- Vovô, - Donna sussurrou para Wilf, que acompanhava o desenrolar da situação ao lado de Sylvia - pode levar minha mãe lá pra cima e, pelo amor de Deus, manter ela lá?

- Pode deixar, querida. - Wilf concordou de leve com a cabeça - Eu cuido disso. Sylv, pode vir comigo, por favor?

- Um minuto, companheiro! - o gigante protestou - Não quero ninguém dessa casa saindo das minhas vistas. O que vocês acham que isso aqui é, um domingo no parque? Todos os quatro são culpados. Eu sei que Harry não estava recebendo as cartas.

- Ora, fale sério! Ele é só um pobre senhor indefeso, acha mesmo que ele vai ser capaz de alguma coisa! - Donna retorquiu, em meio a gestos silenciosos de protesto do Doctor; pelo tom de voz dela, Harry poderia dizer que ela estava chegando no final do seu limite de paciência, mas na verdade ele não absorveu nada do que ela tinha acabado de dizer.

- Você é quem estava mandando as cartas! - ele perguntou para o gigante, piscando com espanto.

- Bom, como é que eu vou saber! Vocês são sequestradores, não sei do que são capazes! - o gigante bradou para Donna, ignorando Harry completamente.

- Sequestradores! Nós não sequestramos ninguém! Quando uma criança é abandonada, está implícito que pode ser adotada por qualquer um que a queira!

- Ele não foi-

- Acho que agora já chega, não?

O Doctor adiantou-se, dando um passo a frente, e encarando o gigante com um olhar que o fez recuar ligeiramente.

- Sinto muito, mas não vou permitir que entre na min- na casa dos Noble - ele acrescentou, rapidamente - e ofenda minha... Donna. - ele finalizou, após alguns momentos de hesitação e fez uma careta, tanto por causa dos olhares que recebeu de Sylvia quanto pelos que recebeu de Donna. - Não quando você próprio invadiu essa casa e se recusa a explicar educadamente quem é.

- Ora, muito bem. - o gigante resmungou, mal-humorado - Vamos todos ser civilizados aqui. Então, Harry! Acho que ainda não me apresentei direito, eh? Sou Rúbeo Hagrid, Guardião das Chaves e das Terras de Hogwarts. Você sabe tudo sobre Hogwarts, é claro.

Harry piscou, curiosamente; o nome não lhe soava familiar.

- É o seu planeta? - ele voltou-se para o Doctor - Já estivemos lá, pai?

(Donna sentia que ia ter que inventar a maior quantidade de mentiras de sua vida pra conseguir dissuadir sua mãe da aparente maluquice de seu "marido" e seu filho. O que é que esses dois estavam pensando?)

O gigante olhava de um para o outro, aturdido.

- O que vocês dois colocaram na cabeça desse menino nesses dez anos! E Hogwarts! Até mesmo dois trouxas como vocês deveriam saber, Dumbledore o deixou com uma carta, eu o vi deixar a carta, vocês deviam ter contado a ele sobre Hogwarts! Espere... - o choque no rosto dele intensificou-se quando ele aparentemente se deu conta de alguma coisa - Vocês não disseram a ele o que ele é!

- Bom - o Doctor bradou, irritado -, nós tentamos! Mas como nós vamos fazer isso se nós nem mesmo sabemos com certeza o que ele é!

Harry sentiu seu estômago afundar ouvindo aquelas palavras. Ele não era normal? Ele não era humano? Mas aquilo não era possível...

E a lembrança de todas as coisas estranhas que já tinham acontecido com ele o atingiram com a força de uma pedrada.

- O que eu sou? - ele murmurou.

- Você é um bruxo, Harry. - Hagrid constatou, simplesmente.

- ...bruxo!

Aquela coisa toda fazia cada vez menos sentido.

- Sim, um bruxo. - o Doctor deu de ombros - E o que exatamente é isso? Nós tentamos descobrir. Levou alguns meses pra abrirmos a carta, Donna dizia que não devia ser nada importante. É claro que era, e depois que a abrimos, tentamos entender. Seu amigo Alvo Dumbledore não foi exatamente preciso na carta. Falou vagamente sobre pessoas com poderes, entre algumas outras coisas. Você acha um bebê e cuida dele durante meses a fio pra depois descobrir uma sociedade secreta aparentemente capaz de coisas incríveis que diz que seu bebê é um deles! Parecia tudo bem inocente, mas nós não sabíamos se eram alienígenas, humanos com poderes psíquicos, uma seita de malucos que ia roubar nosso filho e fazê-lo desaparecer quando fizesse onze anos- nada!

O silêncio caiu pesado sobre a sala. O Doctor inspirou profundamente antes de continuar.

- No começo, só estávamos curiosos. Queríamos compreender. Nós reviramos todas as galáxias, percorremos todas as eras - nada. Se tem uma coisa que nós podemos dizer sobre vocês, "bruxos", é que têm filtros de percepção muito fortes. E que eu não sei nada sobre vocês. Acredite, eu devia saber. Pensamos em várias coisas por causa do que veio acontecendo com Harry ao longo dos anos... Depois do incidente com a cobra, ficamos ainda mais atentos em busca de pistas... Nada conclusivo. E foi aí que começamos a nos preocupar. Tememos pela segurança do Harry. Nosso trabalho é arriscado. As cartas começaram a chegar. Queriam que o mandássemos pra essa escola, Hogwarts, pra junto desses outros bruxos - seja lá o que fossem. Nesse ponto, já não tínhamos certeza de mais nada. Nos fale exatamente quem vocês são - aí nós conversamos.

Hagrid olhava para ele como se ele tivesse duas cabeças.

- Eu não entendi metade do que você disse, companheiro, mas acho que a carta de Dumbledore foi bem clara. Ele falou tudo sobre Lílian e Tiago-

- Inclusive - Donna interviu, repentinamente - que foram assassinados por outro "bruxo"! O que você queria que nós pensássemos, Garotão!

Harry franziu o cenho.

- Lílian e Tiago?

- Seus pais, Harry. - Hagrid sussurrou.

- Meus... pais?

- Vocês dois - Hagrid parecia prestes a explodir - sequer tiveram a decência de falar a ele sobre os pais?

- E como íamos fazer isso sem sequer entender o que eles eram e o que os tinha matado? - Donna indagou, seca. - Queria o que, que mentíssemos e disséssemos a ele que os pais morreram num acidente de carro ou coisa parecida? Você não tem idéia de como foi difícil pra gente.

- Bom, eu tenho certeza que nada disso teria acontecido se vocês deixassem o menino exatamente onde ele estava e que era onde ele devia ficar. Aposto que não têm noção da imprudência que foi-

- Agora me escute, Garotão! – Donna gritou, ficando quase tão vermelha quanto seus cabelos – você não tem moral nenhuma pra me falar sobre prudência, se você realmente é uma das pessoas que acha remotamente sensato largar um bebê indefeso na porta de alguém no meio da noite. Foi assim que nós achamos o nosso filho. Só isso já é motivo mais do que o suficiente pra eu não querer que ele vá com você. Nós estamos dispostos até mesmo a conversar e a permitir, mas pra isso você tem que por tudo em pratos limpos e começar a explicar o que nós não entendemos!

- Eu não devia perder meu tempo pedindo permissão a vocês. Não têm direito nenhum sobre o menino. Só estão com ele até hoje porque Dumbledore quis assim. Mas vou explicar, porque Harry merecer saber. Como eu disse, Harry... você é um bruxo.

- ...Quer dizer então que eu não sou humano?

- Claro que é! - Hagrid coçou a barba - Tão humano quanto eu. Não, espera... Mais humano que eu, na verdade... Eu quero dizer que você pode fazer magia. Simples assim.

Os olhos de Donna se estreitaram.

- E isso implica em que exatamente? Nós lemos a carta da escola. Não nos diz muita coisa. Até onde sabemos, pode ser um código.

O gigante remexeu-se no lugar, parecendo desconsertado.

- Ahm. Não tem um jeito mais fácil de fazer isso, acho, mas... Ah, bom... Harry, veja bem, eu não estou bem autorizado a fazer isso... Mas acho que se for deixar esses dois trouxas te deixarem ir...

Hagrid rumou em direção à sala e fez um gesto com a enorme mão, indicando que eles deveriam segui-lo. Seguiram em meio às coisas derrubadas e pararam em frente à lareira, onde Hagrid puxou um enorme guarda-chuva cor-de-rosa maltratado e, com alguns estalos, conjurou um enorme fogo que pôs-se a crepitar alegremente onde antes só havia o vazio.

- E... é isso. - Hagrid pigarreou - Aprendemos feitiços. E poções. E adivinhação. Entre outras coisas. Não eu mas... - ele deu de ombros - Aqueles que podem.

Harry percebeu a expressão de seu pai transfigurar-se ao seu lado.

- É só isso? Tanta preocupação... E a coisa toda era literal? - o Doctor sorriu. - Donna! Olha só! Esse tempo todo, nós estávamos pensando todas aquelas teorias... Deve ser verdade o que eles falam sobre não se analizar demais as coisas. Bom, era difícil dizermos com certeza, com Harry fazendo as coisas sem saber o que estava fazendo... Ou isso ou eu estou ficando velho e virando um pai superprotetor. - ele coçou o queixo distraidamente. Donna fez uma careta.

- Me desculpe se eu não compartilho do seu entusiasmo, Sunshine, mas... Mágica? Isso não existe. Tem que ter outra explicação.

Ele deu de ombros.

- Nós já vimos tanta coisa por aí, Donna. Acho que mágica não devia ser tão inacreditável assim.

Ela suspirou e massageou as têmporas.

- Muito bem, então. Não vou ser eu quem vai impedir que Harry tenha a educação que seus pais biológicos acreditavam que ele devia ter. Não me importa se é uma escola privada pra garotos ou uma escola de magia – Deus sabe que eu já vi muita coisa estranha nessa vida. Mas você não vai nos ofender ou nos acusar de nada aqui. Nós fizemos o que achávamos que seria melhor praquela criança. E hoje ele é nosso filho. Fui clara?

Hagrid não respondeu, limitando-se a revirar os olhos.

- Pelo menos vocês parecem ter salvação. Eu ainda não acredito que Harry Potter não conhece a própria história. Todo mundo no mundo mágico conhece. Crianças cresceram ouvindo o nome dele, e tudo.

- Mas... por quê? - Harry piscou - Se existem outros bruxos, não tem razão pra isso - quer dizer, eu... eu não sou nada de especial!

Donna imediatamente voltou-se pra ele.

- É claro que é! E não deixe ninguém te convencer do contrário, filho.

- Ela está certa, uma vez na vida, - Hagrid concedeu, de má vontade - mas não pelos motivos que ela acha, claro.

- O que... O que aconteceu com meus pais? - Harry perguntou, hesitante. Na verdade, ele não tinha certeza se queria saber. Ele tinha vivido a vida toda sem se importar muito com o que tinha acontecido com os pais biológicos. E sua mãe tinha mencionado, alguns minutos antes, que oss dois tinham sido assassinados; talvez saber isso fosse o bastante.

E, por outro lado... Talvez fosse melhor entender de onde ele realmente tinha vindo de uma vez por todas. Se ele realmente fosse pra essa escola, ele precisava saber pelo menos quem tinham sido seu pai e sua mãe.

O gigante também não parecia particularmente inclinado a responder à pergunta de Harry; ele coçou a barba nervosamente antes de voltar a falar.

- Eu não esperava isso, não esperava ter que ser a pessoa que ia te contar isso...

E ele contou. Contou tudo sobre Voldemort, sobre a grande guerra, sobre os pais de Harry, sobre Godric's Hollow e sua cicatriz...

Harry engoliu seco, ouvindo a história mergulhado em um silêncio profundo e chocado. Ele não sabia o que dizer ou pensar; tinha vontade de chorar e ao mesmo tempo tinha vontade de simplesmente negar tudo aquilo, dizer que era mentira, que um grande engano estava acontecendo ali. Ele queria voltar pro seu quarto na TARDIS, se encolher na sua cama e pedir colo a sua mãe. Ao mesmo tempo, estava com receio de se voltar pra ela naquelas circunstâncias, medo (ou seria vergonha?) de buscar seu abraço. O que não fazia sentido. Sua mãe sempre tinha sido a pessoa na qual podia confiar, não importava o que estivesse acontecendo.

O mundo estava todo errado agora.

- ...e nós levamos você pra morar com seus últimos parentes vivos. Que era onde você deveria estar, é claro, mas aí esses dois apareceram no meio do caminho. - ele finalizou a história, mais uma vez encarando o Doctor e Donna com hostilidade.

- Olha aqui-!

- Calma, Donna. Eu tenho certeza que nosso amigo aqui só esqueceu momentaneamente que nós tínhamos combinado parar com as acusações - o Doctor lançou para Hagrid um olhar penetrante.

Ele, por sua vez, limitou-se a cruzar os braços.

- Que seja. Eu vou seguir as ordens de Dumbledore, e não vão ser vocês dois que vão me impedir, de um jeito ou de outro. O que me lembra que eu ainda tenho que te entregar a sua carta, Harry, tome. Nós vamos sair daqui a pouco pra comprar o material. As lojas não ficam muito longe, não deve demorar demais, mesmo tendo que usar os meios de transporte dos trouxas...

Harry adiantou-se para pegar a carta e enfim poder lê-la.

"ESCOLA DE MAGIA E BRUXARIA HOGWARTS
Diretor: Alvo Dumbledore (Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Bruxo Chefe, Cacique Supremo, Confederação Internacional de Bruxos).

Prezado Sr. Potter,

Temos o prazer de informar..."

Sua leitura foi interrompida por um grito estridente.

- Ora, MUITO BEM!

Donna, o Doctor, Harry e Hagrid viraram para o fundo da sala, onde Sylvia Noble tremia de fúria.

- Já acabaram com o teatrinho de vocês! É impressionante! Nem mesmo numa data que devia ser tranquila - uma reunião tranquila de família - vocês aceitam fazer as coisas como devem ser! Têm o dom de estragar tudo - mas não imaginava que chegassem ao ponto de encenar uma confusão dessas - já estou farta de vocês!

Donna virou-se para retrucar, mas calou-se quando sua mãe acenou imperiosamente para a porta da rua.

- Eu tive paciência durante todo esse tempo. Tive paciência demais. Não quero mais vocês dois aqui - e levem esse farsante grandalhão com vocês - FORA DA MINHA CASA, OS DOIS! FORA!

[Continua]


Extra

Dez anos antes

- Vamos, Harry, só mais um pouquinho. Só mais uma colherada, vamos lá, meu amor...

O Doctor soprou o vapor quente que saía do seu chá recém-feito e apanhou o último biscoito do seu prato para mergulhá-lo na xícara antes de morder. Ele permaneceu impassível, compenetrado na tarefa automática, sem se abalar com as palavras de Donna ou com o tatibitate que se seguiu. Estava oficialmente acostumado. Essas eram as refeições comuns na TARDIS agora.

Ele não pode deixar de lançar um olhar para sua companheira de viagens enquanto bebericava o restante do chá. Sorriu afetuosamente antes de voltar-se para sua xícara, num misto de admiração e orgulho. Ele honestamente não acreditava que ela fosse resistir tanto tempo cuidando da criança. Em meio a noites sem dormir, fraldas e a preocupação constante com um bebê que começa a andar, ele não dava nem uma semana pra ela implorar a ele que deixassem o menino de volta onde o haviam encontrado.

E, no entanto, lá estava ela. Suada, com os cabelos ruivos sujos e presos em um coque malfeito. As roupas, velhas e folgadas, tinham manchas variadas e em seu rosto duas olheiras profundas haviam surgido. Ainda assim ela persistia, papinha de bebê e colherinha plástica em punho, lutando para alimentar um Harry que parecia achar tudo que o rodeava digno de nota – com única exceção da comida que sua nova mãe oferecia. Donna estava empregando todas as forças que tinha (e que não tinha) com o único intuito de fazer aquilo funcionar.

Ele, por outro lado, não havia movido um músculo para ajudá-la e não se envergonhava disso. Esse tinha sido o combinado, afinal de contas; o que havia resultado em um mês inteiro no qual ele se limitava a observar os dois com curiosidade enquanto se mantinha a uma distância segura do bebê.

O Doctor gostava de crianças, de verdade. Mas ele já tinha amado e perdido mais crianças do que gostaria de se lembrar. Parecia uma brincadeira cruel que as linhas temporais faziam com ele: toda e qualquer criança que ele viesse a amar e a adotar como sua seria tirada da sua vida da maneira o mais cruel possível.

Donna, por sua vez, se aproveitava da sua aparente impassividade e falta de compaixão para descarregar nele toda a frustração que estava sentindo nos últimos dias e que não poderia canalizar para o filho de maneira aceitável e/ou recomendada por psicólogos, pais e pedagogos. De "coração de pedra" a "egoísta mesquinho e insensível", ele já tinha ouvido de tudo nos últimos dias.

Ela virou-se para ele, com os olhos marejados de lágrimas. Sua última tática a ser descoberta tinha sido a tortura psicológica.

- Você bem que podia me dar uma ajuda, não é mesmo, Spaceman?

Ele revirou os olhos e negou de leve com a cabeça. Donna suspirou e voltou-se para o bebê na cadeirinha alta.

- Ora, vamos, meu amor. Só mais um pouquinho e a mamãe promete que te deixa em paz. "Mamãe", querido. Fala "mamãe"?

Harry vinha balbuciando desde que os dois o encontraram na porta do número 4, mas até agora não dava sinais de querer começar a falar de fato e Donna fazia o possível para encorajá-lo a cada oportunidade que tinha. Às vezes o Doctor tinha a impressão que ultimamente ela conversava mais com o bebê do que com ele.

Ele percebeu que no ritmo que a manhã seguia aquilo ainda demoraria um bocado. Papinha e primeiras palavras à parte, Donna ainda iria querer tomar banho, se trocar, fazer uma mamadeira e ajeitar o babysling antes de sequer querer pensar em sair da TARDIS. Sem chá e sem biscoitos, a coisa mais sensata a fazer provavelmente seria encontrar outra coisa com que se ocupar. O Doctor pôs seus óculos de leitura e puxou um livro de Agatha Christie do bolso do paletó.

Perfeito. Não ia ser nada mal reler "Cinco Porquinhos" pela septuagésima nova vez—

- Papai!

Ele ergueu os olhos do livro. Harry encarava-o, sorrindo. Donna também o encarava, mas ela não estava sorrindo.

- Papai! – ele repetiu, sorrindo e, à guisa de ênfase, ergueu os bracinhos se jogando na direção do Doctor.

Por um segundo, fez-se silêncio na cozinha iluminada da TARDIS. E então o Doctor levantou-se, dirigiu-se à cadeirinha alta e, com um sorrisinho, pegou o bebê no colo.

Em meio às risadinhas inocentes de Harry, que prontamente pôs-se a brincar com seus óculos e seus cabelos, e os protestos de "COMOvocêCONSEGUE?VocênemmesmoTENTA!" de Donna, ele percebeu que não havia pra onde correr...

Por Rassilon, ele acabaria amando muito aquele menino.