Reflexos

.socorpìceR

Minerva nunca agia precipitadamente. Malgrado sua decisão de regressar a Hogwarts tenha sido tomada da noite para o dia, ela foi acompanhada de uma carta muito bem redigida, na qual expunha em pormenores os seus motivos. Não todos os seus motivos, é claro. A parte sobre seus sacrifícios, sobre um amor que ela deixara para trás e uma vida que ela jamais recuperaria – isso ela preferiu deixar de mencionar, como se não houvesse importância.

Mas havia. E havia tanta importância que ela não podia deixar de se sentir infeliz no castelo, enquanto sua mente flutuava para longe com pensamentos sobre ter uma família. Uma família feliz – uma família muggle-born. Ela estava sim grata e orgulhosa dos seus dons mágicos, mas a sua aptidão não tornava mais fácil viver com aquela escolha.

Nenhum de seus ressentimentos, porém, ultrapassava seus lábios. Sua natureza era discreta, e ninguém poderia fazer algo contra isso. Assim, foi uma grande surpresa para ela quando o Professor Dumbledore pôs uma mão em seu ombro e reconfortou-a com palavras sábias.

Desde sua época de aluna, Minerva sabia que ele era um homem cheio de segredos, e parte do mistério que o envolvia era o de sempre estar atento ao que ninguém mais estava. Ele sabia ver em Minerva o que ela mais tentava esconder e a aconselhava de maneira empática, compreendendo a sua dor e não a julgando.

Naquela noite, fragmentos do passado de Dumbledore foram esclarecidos, ao mesmo tempo em que Minerva contava coisas sobre si mesma que nenhuma outra criatura viva ou morta soubesse. Naquele pequeno espaço de tempo, eles deixaram de ser mestre e aluna para transformarem-se em duas almas machucadas que ansiavam pelo mesmo conforto impossível.

Eles compartilhavam algo muito íntimo e tinham muito em comum, dentre fatos e pensamentos. Eles conversavam em silêncio, sabendo que o que foi dito ali não poderia ter mais significado para qualquer um dos dois, e ao mesmo tempo seriam confissões a serem enterradas junto a seus corpos. Como se o destino tivesse de unir extraordinariamente duas pessoas, algo os juntava como partes de uma estátua.

x

Dias mais tarde, Minerva estava sozinha no escritório, procurando algo. Ao abrir um baú empoeirado, deparou-se com um antigo espelho. Era o presente de despedida de sua mãe e ela havia se esquecido dele até agora.

"Este é um artefato especial" Sua mãe lhe disse. "Há quem diga que quando fizeram o Espelho de Erised, outros objetos semelhantes foram deixados para trás. A maioria deles perdeu o encanto, outros nunca foram achados. Mas este, este é uma relíquia da nossa família. Há muito da mesma mágica de Erised nele."

McGonagall aceitou-o, mas no mesmo momento jurou que não olharia nele. O que ela pudesse ver ali era a materialização de seus pesadelos, algo que talvez ela não fosse capaz de superar.

Porém agora não a assustava o que seu coração pudesse desejar. Não havia mais um turbilhão de impulsos lutando dentro dela e tentando levá-la a lugares diferentes. Mente e coração seguiam em paz, e ela sabia que no final tudo ficaria bem.

Quando ia guardá-lo, reflexos de lilás e dourado iluminaram a superfície do espelho, mostrando por um instante um certo senhor de barba branca, óculos meia-lua, sorrindo enigmático.

Minerva sorriu também.