Disclaimer: personagens e lugares pertencem a JK Rowling e à Warner Brothers, excepto aqueles criados por mim. Fanfiction escrita sem fins lucrativos.

Baseada no filme de 1991 O Pai da Noiva, com Steve Martin e Diane Keaton. Quaisquer semelhanças com o argumento são mais que meras coincidências.

Produção: Agosto 2010 – Abril 2011

Avisos: fanfiction apropriada para todos

Spoilers: DH

Sumário: Rose Weasley regressa a casa com uma notícia surpreendente: ela vai casar! Mas a notícia, aparentemente feliz, promete fazer estragos no coração de uma das pessoas que ela mais ama…


Para a Pandora, pelos últimos oito anos.


O PAI DA NOIVA

CAPÍTULO I: Papá, vou casar!

Esta semana correu maravilhosamente bem:

- As minhas horas extraordinárias no Quartel-General permitiram-me, por fim, deitar mão ao escorregadio Timmy, o Mancha Negra, que durante meses pôs de sobressalto a noite das aldeolas em redor;

- Fui convidado para ser cara da nova publicidade aos cromos dos Sapos de Chocolate, que arranca já no próximo Verão;

- O George lá se viu obrigado a admitir que as vendas no Magias Mirabolantes dos Weasley diminuem quando eu não estou ao balcão;

- O Hugo recebeu um convite para se juntar ao plantel dos Pride of Portree;

- Todos os dias tive a mulher mais fantástica do mundo e arredores em casa para me fazer esquecer o trabalho e as atribulações diárias;

- E, para terminar em beleza, hoje a Rose está de volta a casa.

Que posso eu dizer? Sou um homem de sorte! A verdade é que as coisas me correm de feição há tanto tempo que já nem sei o que é elas correrem-me mal!

Claro que ainda não me esqueci de sítio de onde venho. Ainda me lembro de partilhar o quarto com os gémeos quando o Bill e o Charlie nos vinham visitar porque a casa era pequena de mais para tanta gente, tal como me lembro de ir para Hogwarts com mantos, varinha e até um rato de estimação em segunda mão porque não tínhamos dinheiro. Até a pior versão de "O Weasley é o Nosso Rei" às vezes ainda ecoa na minha mente. Mas são estas memórias que me dão vontade de desbobinar quando aperto a mão a um desconhecido:

«Olá, Ronald Weasley, muito prazer. Auror, herói de guerra, casado com a bruxa mais inteligente da sua geração e melhor amigo de Harry Potter, sim, ele mesmo, O Eleito, apesar de ele continuar a dizer que prefere que eu o trate simplesmente por 'chefe'. Tenho dois filhos maravilhosos, obrigado por perguntar, um está no Ministério da Magia e o outro é uma promessa do Quidditch, sim, estou muito orgulhoso…»

«Inveja a minha vida? Eu também

Nunca o fiz, contudo. Porque lá no fundo continuo a ser um tipo como qualquer outro: terças, quintas e sábados são os meus dias de cozinhar, arrumar a cozinha e levar o lixo à rua, a minha mulher ainda me chateia porque tenho o hábito irritante de deixar a roupa espalhada pelo chão da casa de banho, já não consigo ler as letras miudinhas no jornal e por três vezes o meu filho se referiu a mim como 'o meu velhote'.

Um tipo normal, portanto.

Mas pronto, hoje é um dia muito importante e não é por minha causa.

Hoje a minha filha está de regresso a casa e ao país.

A Rose é o tipo de filha que todo o pai quer ter. Uma criança amorosa, uma aluna brilhante, uma mulherzinha responsável e trabalhadora. Nunca me deu chatices nem dores de cabeça. Terminou Hogwarts como uma das melhores do seu ano e livre para ser tudo o que quisesse. Escolheu o Ministério e, aqui para nós, acho que não podia ter escolhido melhor, o chefe dela não lhe poupa elogios. A prova de confiança final está aqui: a minha filha está hoje de regresso de uma viagem de cinco meses a França ao serviço do Departamento Internacional de Cooperação Mágica, operação que ficou a cargo de um grupo selecto de jovens membros do departamento.

E eu mal posso esperar por ter a minha menina nos braços outra vez.

Cá em casa todos entendem o meu estado de espírito. Acho que é por isso que ainda ninguém me chateou a cabeça por estar a andar em círculos por entre os sofás da sala, consultando o relógio de pulso de cinco em cinco minutos, parando apenas de vez em quando para mirar o meu próprio reflexo no espelho do vestíbulo e estudar a minha aparência geral.

- Achas que estou bem? – perguntei de novo, tentando espreitar-me de todos os ângulos possíveis e imaginários. – Esta gravata combina com o manto, não combina? Achas que devia dar um jeito diferente ao cabelo? Talvez tenha abusado no perfume…

Mesmo sem querer, afastei um pouco do manto e dei duas ou três snifadelas para comprovar ou não a minha última teoria.

- Estás óptimo, Ron! – comentou Hermione, que nem sequer olhara para mim. Ela andava numa roda-viva pela cozinha, de onde nos expulsara sob a desculpa de que demasiados cozinheiros estragavam o caldo.

- Porquê essa preocupação toda, afinal? É só a Rose – Hugo espreitou pelo meu ombro e encarou-me pelo reflexo no espelho. – Nunca poderás parecer mal aos olhos de quem andou a vasculhar os álbuns de família da avó Molly!

A minha resposta foi interrompida por um estampido agudo que se fez ouvir nesse preciso momento no jardim. Não tive dúvidas: Rose chegara.

- Fala-se no Diabo… – apesar do comentário não parecer propriamente simpático, Hugo esboçou um sorriso. Também ele estava ansioso por reencontrar a irmã.

Sem esperar pela campainha, corri para abrir a porta. Mas o meu filho, muito mais ágil do que eu, conseguiu ultrapassar-me e foi o primeiro a estender os braços para ela, deixando-me a servir de porteiro.

- Rosie, que bom ver-te outra vez! Bem-vinda de volta!

- Wow, que recepção entusiástica!

Esquecendo as malas atrás de si, Rose abraçou o irmão e ficaram ali os dois, no vestíbulo, saltitando juntos e rindo alto como dois tontinhos.

Claro que a algazarra atraiu Hermione, que lá veio da cozinha limpando as mãos ao seu avental de flores.

- Olha só quem ela é…

- Olá, mãe! – as duas cumprimentaram-se com dois beijos e um grande abraço.

Achando que devia fazer alguma coisa mais do que simplesmente observar, apesar de estar contente por testemunhar o reencontro, trouxe para dentro as malas dela e depois fechei a porta. Afinal de contas, os vizinhos não precisam de saber o que está a acontecer em nossa casa.

- Pai! – Rose afastara-se da mãe e avançava agora para mim, de braços abertos e uma expressão de semi-incredulidade disfarçada por um sorriso aberto no rosto. – Tão elegante que nós estamos! Vais a algum grande evento?

- Ora, o teu jantar de boas-vindas é um grande evento!

- Isso é o teu manto de cerimónia?

- Não – menti eu sem pestanejar. – É só parecido.

Um pai tem o direito de se aperaltar para a sua filha, certo?

Ela, que parecia vencida mas não convencida, riu-se e preferir mudar de assunto:

- Hum, cheira mesmo bem! Estou cá com uma fome…

- Óptimo, vamos para a mesa – Hermione começou a empurrar-nos para a sala de jantar, parecendo tão entusiasmada quanto uma criança em dia de Natal. – Estava só à tua espera para começar a servir o jantar, fiz aquele empadão que tu adoras…

E lá foram os três, ela e os miúdos, em alegre galhofa.

Deixei-me ficar para trás propositadamente, arrastando as malas para outro lugar que não o meio do vestíbulo, onde alguém (nomeadamente eu) facilmente poderia tropeçar nelas e esparramar-se ao comprido. Uma desculpa apenas. A verdade é que, apesar de estar muito feliz por tê-la de volta, não consigo deixar de sentir uma certa nostalgia perante a cena a que acabara de assistir.

Rose estava tão crescida! Havia uma segurança na sua postura, um brilho adulto no seu olhar que nunca lá estivera antes. Ou pelo menos não de maneira tão viva! E isso mostrava-me que as habituais roupas joviais, a cabeleira de caracóis castanhos apanhada por um elástico atrás da cabeça como sempre, até o sorriso alegre de menina que lhe chegava ao olhar eram puro engano para os inocentes de alma.

Há cinco meses apenas acenei de despedida a uma criança. Hoje recebi de volta uma mulher feita.

E por muito bonito que seja ver os nossos filhos crescer, é algo que não deixa de ser também muito doloroso!

- Ron – chamou Hermione, que voltara atrás sem eu dar por isso. – Estás bem?

- Estou, claro.

Não ia perder tempo a tentar explicar-lhe o que estava a sentir. Era sua opinião que eu tinha grandes dificuldades em aceitar que um dia teria de deixar as crias sair do ninho.

- Ainda bem. Vai lá sentar-te à mesa, vá…

Avançou para a cozinha, começando a desapertar o avental enquanto andava. Decidido a esquecer estes pensamentos mais enevoados, entretanto, segui para a sala de jantar, ansioso por novidades.

Rose e Hugo estavam já sentados nos seus lugares habituais, entretidos em amena cavaqueira:

- Lembras-te que o James andava muito misterioso e cheio de segredinhos antes de te ires embora? Nós suspeitávamos que ele tinha arranjado uma namorada e tinha vergonha de o assumir… – contava Hugo, cujos olhos brilhavam de entusiasmo. – Pois era isso mesmo! Eles têm andado a sair juntos em segredo!

- E tu não me contaste? – o tom parecia ofendido mas a expressão era alegre e convidava a mais informações. – Seu monstro!

- A Dominique encontrou-os há dias num bar, muito in love, de mãos dadas e tudo! Adivinha só quem era…

- Quem?

- A Wood! – Hugo estava visivelmente feliz por partilhar aquele assunto, sobre o qual palrara ininterruptamente durante os últimos dias.

- A Emma Wood? – estranhou Rose, cuja boca se abrira num O perfeito. – Mas eles detestavam-se, só faltou atirarem-se da vassoura abaixo durante os jogos!

- Pelos vistos agora adoram-se…

Riram-se maliciosamente da história e pelas caras deles eu facilmente deduzi que o pobre James, na certa já farto do gozo dos primos e do discurso emocionado do pai sobre os muitos anos de amizade com Oliver Wood, tinha uma nova dor de cabeça a caminho.

- Então, filha – já sentado à mesa, aproveitei um breve momento de pausa entre as suas risadas para desviar o assunto de conversa. – A viagem correu bem?

- Odeio botões de transporte – respondeu ela com uma careta. – Mas podia ter sido pior. Pelo menos não vomitei, como quando fui para lá… – e riu-se envergonhadamente. – O chefe Anderson estava à nossa espera, disse-nos que estava muito contente com o nosso trabalho. Parece que ele se manteve em contacto com os franceses e que eles não tiveram queixas a apresentar. Aliás, alguns deles até pareciam interessados em ficar connosco, Monsieur Guillot sugeriu-o várias vezes…

Rose falava enquanto alisava o guardanapo que amarrotara ainda há pouco no meio da brincadeira, sem olhar para ninguém em especial. Mas houve algo nas suas palavras que me deixou alerta e a sua atitude aparentemente despreocupada não ajudava às minhas suspeitas: teria ela recebido um convite?

Os meus pensamentos foram interrompidos pela chegada de Hermione, que colocava o pirex acabado de sair do forno sobre a mesa:

- Hora de jantar!

Hugo estendeu logo o prato mas ela desencorajou-o com o olhar.

- Primeiro a tua irmã – e aceitou o prato que Rose lhe passava.

Serviu-nos a todos quantidades generosas de empadão, deixando-se ficar para o fim. Depois sentou-se e começou também a participar na conversa. Uma diferente, contudo:

- O Ministério tratou da vossa Materialização até casa?

- Hum-hum – acabada de meter uma garfada na boca, Rose acenou com a cabeça e apressou-se a mastigar para responder. – Vi um deles ao fundo da rua quando cheguei, mas não o reconheci.

- Óptimo! A última coisa que precisava era ter Mrs. Holloway à perna…

Mrs. Holloway é uma velhota viúva que vive na nossa rua, a única completamente Muggle e também a única que é verdadeiramente abelhuda. Apesar de todos os cuidados, passa a vida a alertar toda a gente sobre corujas, pessoas que aparecem e desaparecem de repente e objectos voadores. O que vale é que a sua fama de aldrabona faz com que ninguém acredite nela.

- Ainda não percebi – comentou Hugo após um gole de água. – Porque é que o Botão de Transporte não vos podia trazer directamente a casa?

- Porque é um Botão de Transporte, minorca, não um autocarro!

O resto do jantar decorreu de forma bem tranquila. Penso que o facto de estarmos os quatro juntos outra vez ajudava à sensação de bem-estar, aquela que nos tinha faltado durante os últimos meses por sermos uma família incompleta.

O empadão de Hermione – um dos poucos pratos que ela sabe confeccionar na perfeição, uma vez que a culinária não é um dos seus pontos fortes e nem pensar que ela aceitaria ter um elfo doméstico a trabalhar cá em casa (não que eles não a tivessem tentado convencer a mudar de ideias) – estava simplesmente divinal e abri a garrafa de vinho velho que o meu pai me tinha oferecido e estava a guardar para uma ocasião especial. Brindámos ao regresso de Rose, à nova página do Hugo no Quidditch, à minha captura do Mancha Negra e, para não a deixarmos de fora, a Hermione, a melhor chefe do Departamento de Aplicação das Leis Mágicas que alguma vez existiu.

Estávamos a comer o doce quando Rose interrompeu timidamente:

- Bom, tenho uma coisa a dizer-vos.

O seu tom de voz e a sua linguagem corporal, pois mexia-se no assento como se tivesse comichões por todo o corpo e mordia o lábio inferior com a ansiedade, fizeram-nos parar de comer. Hugo, o alarve, que ia já na segunda sobremesa, abrandou o ritmo sem nunca baixar a colher.

- Não é fácil e não sei bem como dizê-lo, por isso vou simplesmente dizê-lo…

Senti o coração cair-me aos pés perante as suas palavras. Eu sabia! Eu sabia que aquela conversa sobre o Monsieur Não-Sei-Das-Quantas trazia água no bico! A minha Rose, sempre tão certinha e aplicadinha, não passou despercebida aos franceses, eles vão querer levá-la lá para o Ministério deles e nunca mais a vejo outra vez…

Mas ela estava agora a rir-se com um ar meio aparvalhado, como se não acreditasse no que tinha a anunciar. Corada de excitação, mostrou-nos a mão esquerda: num dos dedos brilhava um anel no qual ainda ninguém reparara.

- Vou-me casar! – disse, felicíssima.

Não sei ao certo como é que aconteceu – no seu lugar já não estava a Rose de agora mas a Rosie de sete anos, desdentada e despenteada, tão pequenina no vestido de xadrez que ela mais adorava, com a boneca preferida nos braços e a mesma expressão de felicidade ao anunciar, na sua vozinha de criança, "Papá, vou casar!"

Três segundos e já estou com alucinações!

Espreitei as outras reacções. Hugo parara por fim de comer mas esquecera-se de tirar a colher da boca e olhava alternadamente para a irmã, para a mãe e para mim. Hermione, cujo queixo caíra com a revelação, foi a primeira a recompor-se:

- Uau… isto foi inesperado!

- Merlin! – foi o que disse, juro. Mas pela cara que me fizeram, duvido que tenha sido o que ouviram.

Rose começou a gesticular com as mãos enquanto se tentava justificar:

- Eu sei que parece tudo muito rápido, mas…

- Vais casar com um ça va? – perguntou o Hugo, se consegui traduzir bem aquele "Vaich cachar cum chá vá" que saiu da boca dele, ainda com a colher a atrapalhar.

Se isto é karma, é muito injusto! A Fleur veio de França para casar com o Bill, não comigo! Porque é que não é a filha deles a casar com um francês?

Ela rolou os olhos nas órbitas.

- É claro que não vou casar com um francês, Hugo! – suspirei de alívio ao ouvir a sua resposta. – Isto pode parecer precipitado, mas não é!

- Nós nem sabíamos que tinhas namorado…

Fala por ti, Hermione, eu nem sequer sabia que ela tinha idade para beijar rapazes!

- Não é bem assim, mãe – Rose soprou de impaciência perante as três caras aturdidas com a novidade e começou a explicar-se: - Conhecemo-nos há anos e somos amigos desde então. Pensamos e agimos da mesma maneira, temos gostos em comum, sempre nos demos muito bem, mas nunca questionámos os nossos sentimentos porque não queríamos perder o que tínhamos. Agora, enquanto estivemos em França…

- Ah, ele foi contigo para França?

- Sim, ele faz parte do meu grupo de trabalho.

Reparei que Hermione torceu os lábios numa demonstração de interesse. Amiga da onça! Para ela todos os funcionários do Ministério são boas pessoas!

- De qualquer maneira – continuou Rose. – em França, sozinhos num país e numa cultura diferentes, integrados no nosso mundo, longe dos nossos amigos, as coisas alteraram-se. Não sei explicar como ou porquê… acho que o descobri verdadeiramente depois de todos estes anos. E ele descobriu-me a mim. Apaixonámo-nos. Quem sabe, talvez estivéssemos apaixonados há anos mas fossemos demasiado cegos para o ver!

- E só por isso decidiram casar? – atirou Hugo, franzindo o sobrolho, desconfiado.

Este é cá dos meus! Não fica como a mãe, que me está ali plantada com um sorriso meloso e estúpido na cara só por ouvir meia dúzia de palavras bonitas! Mulheres… comovem-se com facilidade…

- Sim. Para quê esperar, certo? – Rose olhou para nós. Os seus olhos brilhavam tanto que ela parecia ligeiramente maníaca! – Ouçam, eu sei que parece loucura…

- Não parece. É loucura!

Consegui por fim verbalizar os meus pensamentos. E desta vez penso que todos me compreenderam na perfeição. Ela parecia desesperada, como quando era mais pequena e eu lhe dizia que ainda não tinha idade para ir para Hogwarts com os primos.

- Pai…

- Pai nada! – retorqui eu sentindo um calor súbito nascer-me no peito. – Que estupidez, Rose, és muito nova para casar!

- Nova? – troçou ela. – Vou fazer vinte e dois anos!

- Exactamente, és uma miúda!

- Pai, por favor, sou dois anos mais velha que o tio Harry quando ele casou!

- O tio Harry sobreviveu a duas Maldições da Morte, é óbvio que aquela cabeça não funciona a cem por cento!

- Ronald!

Engasguei-me na fúria e nas palavras que ficaram por dizer. Mas quando Hermione me chama pelo nome completo e ainda me dá uma canelada por debaixo da mesa é porque estou prestes a ficar com a língua colada ao céu-da-boca, portanto mais vale calar-me antes de despertar a fera que existe dentro da minha mulher.

Rose estava amuada, corada de fúria e de embaraço. Os seus olhos azuis ainda brilhavam, mas agora de uma maneira diferente – sabia que ela estava à beira de um pranto. Hugo, que detestava discussões, mirava o seu prato de cabeça baixa, atitude que reflectia o calmo carácter que eu não sabia de quem ele herdara.

- Então – atalhou Hermione, pronta a mudar de assunto. – quem é o sortudo?

Sim, ainda faltava isso. Com a minha sorte deve ser algum daqueles tarados que pintam o cabelo de várias cores ao mesmo tempo, furam o corpo todo e gostam de se Materializar em cima das pessoas que passeiam inocentemente por aí.

Ela hesitou antes de responder. Reparei que respirou fundo antes de começar a falar. Algo me diz que não vou gostar do que vou ouvir.

- Somos amigos há onze anos. É tempo suficiente para conhecer uma pessoa. Metade de uma vida… - continuava ela a justificar-se. É impressão minha ou está a evitar olhar para mim? – Ele é o tal, posso senti-lo!

- Óptimo, querida – Hermione ria nervosamente. – Então e esse "o tal", tem nome?

Emborquei o resto do vinho de um só trago. A garganta seca parecia queimar à passagem do líquido. Rose ainda me deitou um último olhar, se bem que não percebi se era de culpa, de perdão ou se apenas uma reacção ofendida à maneira indecente como esvaziei o copo.

- Talvez as coisas pudessem ter sido feitas de maneira diferente, mas o Scorpius e eu…

- SCORPIUS?

Levantei-me de um salto, como se tivesse descoberto de repente que tinha estado todo este tempo sentado em cima de um ouriço-cacheiro. Qualquer coisa que tinha descido até ao meu estômago parecia querer fazer o caminho inverso e senti uma pontada no peito tão forte que por momentos pensei que fosse morrer ali mesmo com um ataque.

Talvez não passasse de um mal-entendido. Talvez tivesse percebido mal. Talvez fosse outro rapaz com o mesmo nome.

Mas ao mesmo tempo, quantos idiotas no mundo é que se lembrariam de chamar o próprio filho de Scorpius?

- Scorpius? – repeti-me. – O filho do Malfoy?

Rose bufou de impaciência, de olhos fixos no tecto.

- É claro que é o Scorpius Malfoy, quantos Scorpius é que conheço?

- Quer dizer que com os dez BILIÕES de rapazes que existem neste maldito PLANETA, tu foste logo escolher ESSE para CASAR?

Mas ela cerrou fortemente os punhos e levantou-se também:

- Olha, pai – a voz tremia-lhe ao falar e sabia que ela se estava a esforçar para não me gritar em resposta – estou muito cansada e não tenho cabeça para isto agora. Admito que toda esta situação é um choque e que precisam de assimilar a ideia. Porque é que não vamos dormir e amanhã logo falamos melhor, pode ser? Boa noite – e virou-se para a mãe: - O jantar estava óptimo!

Mas quem é que ela pensa que é?

- Ó minha menina – chamei eu, furioso. – Volta aqui imediatamente!

Ela fingiu não ouvir, contudo, e só a vi sair da sala de jantar sem olhar para trás. Segundos depois ouvi-a galgar os degraus da escadaria como um cavalo em fúria e ainda atirou com a porta do quarto quando lá chegou.

- ROSE! – gritei, porque sabia perfeitamente que ela me conseguia ouvir. – Esta conversa não fica por aqui!

Respondeu-me o silêncio.

Sabem que mais?

Ela herdou este péssimo feitio da mãe!

Continua…


N/A: erros de digitação, pontuação, conjugação verbal e demais ofensas à língua portuguesa são culpa minha e peço perdão pelos mesmos. A minha beta tirou férias e eu fiz o meu melhor, mas às vezes isso não é suficiente. Espero que gostem e até à próxima! =D

No próximo capítulo:

«Tive uma súbita visão de mim mesmo a pegar na varinha e a transformá-lo num sapo com cornos, fazendo-o voar por todo o quarteirão. Mas depois alguém me dá um encontrão e a imagem idílica desaparece. Scorpius continua especado à minha frente, sinto o olhar de Hermione a queimar-me as costas, e então sei que não tenho outro remédio senão responder-lhe…»