Encaminhei-me até a escrivaninha. Sempre detestei essa maldita mobília. A garrafa parecia estar na metade, quando ele adentrou o quarto dando passos reservados. Recostou-se à moldura da janela e mirou-me, mantendo nosso pacto de silêncio. Bebi deliberadamente; o conteúdo alcoólico a esvair-se terminantemente, deixando o líquido trilhar meu queixo e pescoço. Pousei a cabeça sob os braços cruzados e perdi a consciência por meros segundos. Charles subitamente encontrava-se ao meu lado. Demorou estudando-me os detalhes da face e fiquei agradecido por estar com a cabeça apoiada no mogno; olhos cerrados. Não deveria fitá-los. Veria verdades e angústias embaçadas por atrás daquelas íris sujas. Veria o medo reprimido. O mesmo que me mutilava gradualmente, dia após dia. E, não se importando em destruir-me, mantinha-se intacto. Charles, completamente alheio a todos esses fatos, abraçou-me enlaçando os braços ao redor do meu peito. Acariciou minha nuca com a ponta do nariz e certamente aquilo bastara para que meus pêlos eriçassem. Tremi, mas não abri os olhos. O medo não estragaria nada desta vez.