San Puerna

As pessoas me diziam que eu era rebelde, e talvez eu fosse mesmo. As regras simples e o senso comum não eram para mim – ele era para meninas puras e intocadas, inteiras e conformadas. Eu não era nada disso – não depois de você.

Eu era toda paixão e ardor, revolta e desejo, impulso e irracionalidade me jogando em uma aventura atrás da outra em busca de algo que tinha perdido – algo que você me tirou com a maior das crueldades.

Esconder fazia parte do jogo, a tensão do momento, o êxtase do segredo – segredos e mentiras, eu tinha aprendido isto no teu colo, e bem demais – e qualquer pequena transgressão era excitação o suficiente.

Eu puxava a fumaça e tragava, forçando-a até minha garganta, a respiração presa por segundos intermináveis. E quando eu assoprava, com força para fora, era você quem eu tentava afastar de mim – sua memória.

Mas a fumaça demorava a sair, aquecendo meus dentes e lábios, o cheiro me impregnando os cabelos e as mãos – como você, Tom, que mesmo tendo partido nunca deixava de me assombrar, se fazer presente em cada momento da minha vida.

Você estava atrás de meus olhos, no fundo de minha mente, no tom cortante de minhas tiradas sarcásticas, na firmeza que eu forjei depois que você se foi. Você era a fumaça que eu tragava e expulsava em doses iguais, um vício maldito que só poderia me levar à perdição – como você me levara.

Eu podia amassar o filtro, sufocar a brasa, esvanecer a fumaça.

Mas nunca pude fazer o mesmo com você – escondido dentro de mim como a nicotina no meu sangue, o alcatrão em meus pulmões. O câncer maldito que marcava minha alma ao invés do meu corpo. Eu era a fumaça e o fumo – você era a brasa, eu estava sendo consumida pelo beijo da sua presença destruidora, ao mesmo tempo em que você me criava como sou agora.

Faz tantos anos agora – mas não faz tempo nenhum. Você está destruído além de qualquer chance de reparo, mas me levou contigo antes mesmo disso. Então eu puxo, trago e assopro, como se não houvesse esperança – não há nenhuma esperança depois de você.

Como uma marca visível, surgem manchas amarelas em meus dedos, em minhas unhas – doentias e destruídas, como eu depois de você, que foi incapaz de aceitar que como todo mundo chegaria um dia ao seu fim.

E as pessoas diziam que eu era rebelde.