As pessoas são invisíveis em Gotham City. Quando se deslocam pelas calçadas cinzentas, olham para baixo, para o lado, para o celular em suas mãos - todos os lugares, exceto o rosto de quem passa ao seu lado. E no meio do vácuo, entre faces transparentes, Coringa caminha incógnito. Sua pele rosada e seu cabelo castanho são o disfarce perfeito no meio da multidão de olhos embaçados.
Enquanto falam ao telefone, o som de suas palavras mecânicas o enoja. A indiferença generalizada o incomoda. O movimento dos dedos sobre teclados minúsculos o irrita. Ainda assim, ele não caminha com pressa. Seus sapatos gastos batem no concreto num ritmo tranquilo, que nenhum outro passante escuta. Ele atravessa um, dois, três quarteirões. Finalmente alcança a entrada do metrô. Ele cruza as escadas e deixa a luz do sol para trás. Passa pela catraca e enfia as mãos nos bolsos da discreta calça marrom. Quando as ergue novamente, está sentado num dos bancos da plataforma, segurando quatro pequenos potes de tinta entre os dedos.
Ninguém se senta ao seu lado. Talvez ele realmente possua uma aura negra. Talvez os habitantes de Gotham não sejam tão idiotas a ponto de ignorar a suposta insanidade que emana dele. Mas provavelmente não... Deve ser porque ele esqueceu o desodorante naquela manhã.
Sozinho em seu banco, ele gira as tampas das tintas e as põe de lado: primeiro a branca, depois a preta, a verde, e a vermelha por último. Homens e mulheres entram e saem apressados enquando a pele dele se transforma com rapidez. Seus dedos deslizam experientes sobre sua testa, nariz, olhos. Não hesitam quando chega a vez da cor vermelha.
Finalmente ele se levanta, e uma menininha o aponta para a mãe. A mulher não dá atenção à criança. Ele ri suavemente, por um único instante, e dá um passo para frente, parando sob uma lampada branca no meio do corredor. Ele é uma anomalia, um borrão de tinta num quadro, um bug no sistema. Os pares de olhos eventualmente viram-se em sua direção e arregalam-se instantaneamente.
Ele é agora o mais nítido habitante de uma Gotham embaçada, e quando as portas de um trem recém-chegado se abrem, as pessoas passam por ele correndo em direção à saída. Enquando centenas de covardes transparentes aglomeram-se no fim da plataforma, ele embarca e ri. Assiste pela janela a bomba de gás que deixou para trás ser detonada e preencher o ar parado da estação. Não tem tempo de ver o caos instalar-se no lugar, enquanto dezenas de pessoas vão ao chão intoxicadas ou simplesmente em pânico demais para se manter de pé.
Aha-ha. Ha.
É mais um dia de trabalho. Ah, e como o Coringa adora seu trabalho...