Remoendo o passado
Teria dado um braço ou dois naquela noite só para ver no rosto dela o que estava sentindo. Nem naquela noite nem em outra qualquer. Já fazia quanto tempo? Cinco anos talvez. Ou seria mais? Teria dado tudo para ter visto qualquer coisa daquele rosto durante todos aqueles anos.
Ia acabar perdendo o juízo cedo ou tarde se continuasse remoendo o passado daquela maneira. Ela era uma criança na época, ou quase isso, e ele não era muito melhor. Começou por uma tradição obscura e deturpada, mais uma prova de que não havia respeito algum para uma mulher dentro do santuário que não fosse Athena. Sabia que não havia sido o primeiro a cometer o erro de se apaixonar, tão pouco seria o último e Milo existia para provar isso.
Cavaleiros e amazonas deviam estar preparados para tudo. Ele acabara de receber a armadura de Leão e a despeito de tudo o que pudesse ser dito sobre "o irmão do traidor", sabia-se que Aiolia era sim digno da honra. E "Honra" era seu nome do meio, o último era "Orgulho". Não tinha mais que dezessete anos quando foi informado do que deveria fazer.
Aprendizes de amazona haviam chegado há pouco tempo no santuário e a batalha para adquirirem suas armaduras ocorreria ainda naquela semana. Num mundo dominado por homens elas eram pouco reparadas por sua inatingibilidade conferida pela mascara inexpressiva. Elas deviam estar preparadas para tudo, inclusive para situações pouco prováveis no caso de serem capturadas e torturadas. Era uma desculpa suja para mascarar um hábito que os antigos cavaleiros tinham de se aproveitarem delas. "Ensiná-las" como se aquilo realmente precisasse ser aprendido de uma maneira tão vergonhosa. Mas antes de pensar nessas pobres criaturas ele tinha que cumprir as ordens que lhe eram dadas pelo Grande Mestre.
Ele e Milo desceram as doze casas em direção aos campos de treinamento onde elas ficavam. Escorpião não era lá a pessoas mais simpática do mundo naqueles tempos e estava encarando a missão com tanto entusiasmo que chegava a dar nojo. Contar vantagem era seu real dom e não havia Antares que superasse isso. A conversa dele estava tão irritante que a vontade era de dar-lhe um soco na boca e começar uma guerra de mil dias, mas não faria isso. Havia uma imagem a construir, longa daquela que já possuía como "irmão do traidor".
Quando chegaram ao acampamento das amazonas foram recebidos por uma instrutora. Aliás, se tratava de Cibele e, se não lhe faltava à memória, seu próprio irmão havia sido o responsável por "ensiná-la" no passado. Ela costumava tratar Aiolia muito bem naquela época, mas agora se dirigia a ele com todo respeito que um cavaleiro de ouro merecia. Ela os conduziu até onde se encontravam duas garotas com rostos cobertos por mascaras.
Ambas tinham cabelo castanho, ainda que em uma delas fosse evidente o tom avermelhado nas mechas. Apenas as que se destacavam em treino eram entregues aos cavaleiros de ouro, as outras eram dadas aos menos expressivos cavaleiros de prata e bronze. Então deveriam escolher uma delas e cuidar para que "aprendessem".
Milo deu um passo à frente e se pôs a analisá-las como se fossem mercadoria. Aiolia cerrou os punhos tentando conter a indignação. Ele se deteve em uma delas por um tempo, parecia ser a mais bem desenvolvida de corpo.
- Como se chama? – Escorpião perguntou a garota mascarada.
- Shaina, não que isso seja da sua conta. – a garota disparou desaforada. Milo raramente era tratado assim por alguém "inferior" e seu orgulho normalmente lhe impedia de ser racional quando desafiado.
- Não lhe ensinaram como deve tratar um cavaleiro, garota? – ele disse ríspido enquanto segurava o braço dela firmemente.
- Me larga! – ela rosnou contra ele. Milo trincou os dentes de raiva.
- Eu vou levá-la, Cibele. – ele disse à instrutora – Vou ensinar a essa cobra boas maneiras.
- Como desejar, cavaleiro. – Cibele respondeu – Aviso para não a subestimar. Shaina é surpreendente com sua astúcia.
- É o que veremos. – ele agarrou a menina pelo braço e a arrastou floresta a dentro – A outra é sua Aiolia. Faça bom proveito. – eles desapareceram atrás das arvores, mas os protestos e desaforos da menina foram ouvidos por algum tempo.
Aiolia sentiu o constrangimento pesar sobre si ao ser deixado para trás com Cibele e a outra garota mascarada. Dificilmente ela teria mais que quinze anos e ele se sentia um monstro por ter de fazer isso com ela. Ele deu um passo à frente e a observou melhor. Ela tinha curvas delicadas, talvez ainda faltasse algum tempo para atingir a maturidade de corpo, mas via-se beleza ali.
- Como se chama? – ele perguntou tentando parecer seguro. Ela encolheu os ombros timidamente.
- Marin. – ela respondeu baixo e ele notou o sotaque estranho dela. Uma amazona estrangeira!
- Ela é japonesa, mas asseguro que é disciplinada e forte o bastante para confrontar qualquer grega em pé de igualdade. – Cibele disse com tom arrogante – Ao contrário de Shaina, ela não me dá trabalho algum e tem um rendimento físico invejável.
- Não estamos falando de uma égua, ou qualquer outro animal, Cibele. – Aiolia falou num tom repreensivo – Eu vou cuidar dela, mas gostaria que não tornasse esse rito mais desprezível do que já é.
- Cuidado, Aiolia. – Cibele o alertou à medida que ele indicava o caminho tomado pelo outro casal à menina mascarada – Está ficando muito parecido com seu irmão.
- E você deveria guardar a língua dentro da boca, se não quiser fazer companhia a ele no outro mundo. – o cavaleiro de Leão retorquiu mal humorado enquanto guiava e menina – Vamos, Marin.
Eles seguiram em silêncio entre as arvores. A noite estava estrelada, mas sem lua o que obrigava o cavaleiro a usar o próprio cosmo para iluminar o caminho. A menina ao seu lado não deu uma palavra, parecia realmente ser dócil e avessa a contestar ordens, mas a energia ao redor dela estava bem longe de ser suave. Ela tinha sim força o bastante para se tornar uma amazona de prata e se permitissem ela seria a melhor delas.
Chegaram a uma cabana isolada, como eram as casas das amazonas. Entraram no casebre escuro e simples, a pequena sala e os demais cômodos eram iluminados por lampiões o que dava um aspecto fantasmagórico ao lugar. Foi à vez de ela conduzi-lo ao pequeno quarto onde havia uma cama ampla de madeira, dois criados mudos e um pequeno armário. Com a mão ela indicou a cama para que ele se sentasse. Aiolia não protestou, fez o que ela pedia retirando sua capa enquanto isso.
Ele retirou a armadura dourada com cuidado e levando muito mais tempo do que de costume. Marin não o olhava, preferia ficar encarando a porta.
- Devo lhe trazer alguma coisa? – ela perguntou timidamente – Deseja comer, ou beber algo? – Aiolia ponderou por um segundo.
- Água seria bom, tenho sede durante a noite. – ele respondeu e ela saiu do quarto em direção a cozinha.
Ela não demorou mais do que alguns minutos para trazer uma moringa e dois copos de cerâmica. Colocou-os sobre a mesa enquanto Aiolia se livrava da última peça da armadura. Ela se sentou do outro lado da cama, sem encará-lo ou lhe dirigir a palavra. A ausência de som era desconfortável para ambos então ele julgou ser seu dever amenizar aquilo.
- Conhece o ritual, Marin? – ele perguntou de costas para ela.
- Sim... – ela murmurou sem graça – Eu devo me deitar com o senhor, mas não devo permitir que veja meu rosto. Todo resto eu devo obedecer. – o cavaleiro soltou um suspiro pesaroso. Como alguém poderia aceitar aquilo tão bem?
- Já esteve com algum homem? – ele perguntou – Já recebeu carinho, ou algo parecido?
- Não senhor. – ela respondeu.
- Muito bem. A primeira coisa que deve fazer é parar de me chamar de senhor. – ele disse – Eu me chamo Aiolia, cavaleiro de Leão. Vou precisar retirar sua mascara, mas não vou conseguir ver o seu rosto com as luzes apagadas, não se preocupe.
- Devo fazer alguma coisa? – ela perguntou objetiva. Aiolia passou a mão pelos cabelos, nervoso.
- Tire suas roupas antes de apagar a lamparina. – ele respondeu.
Sem dizer mais nada, Marin retirou a roupa de treinamento, deixando-se vulnerável na presença do cavaleiro de ouro. Aiolia não se virou para observá-la por respeito, ao invés disso ele também retirou suas roupas até que estivesse totalmente nu. Ele pensou que teria sorte se conseguisse cumprir sua tarefa até o fim naquelas circunstâncias.
- Estou pronta. – ela disse baixo deitando-se de costas na cama. Aiolia se virou e então pode vê-la nua. Era de fato muito jovem, mas nem por isso a visão lhe parecia menos atraente. Em outra situação ele não veria qualquer problema em estar com ela, em seduzi-la, em compartilhar a cama. A máscara o incomodava profundamente, estava ali para lembrá-lo de que ela não era uma mulher comum e seus deveres eram grandes fardos eternos. Se ela fosse apenas uma garota e ele apenas um rapaz nada seria tão complicado, ou tão vergonhoso, talvez até gostassem da companhia um do outro.
- Pode apagar a luz, Marin. – ele disse a ela e foi obedecido imediatamente. Marin voltou a se deitar estática ao lado dele. A menina não movia um músculo se quer e tão pouco desejava fazê-lo.
Aiolia tocou o braço direito dela com suas mãos, sentindo a textura delicada da pele. Marin enrijeceu ao sentir o contato. Ele deslizou os dedos pelo braço exposto, ombros e clavícula até chegar à base do pescoço dela e depois o início da fria máscara de metal. Na escuridão daquele quarto nada se via se não o fraco contorno um do outro e somente o tato conseguiria guiá-los.
- Vou retirar sua mascara agora. Garanto que mal consigo ver você do meu lado, então acho que não terá que me matar esta noite. – ela acenou positivamente com a cabeça e então ele retirou a máscara de metal com muito cuidado e a colocou no criado mudo.
Aiolia a sentou na cama e puxou para seus braços. O coração de Marin batia forte, como um pássaro batendo suas asas. As mãos do cavaleiro desciam e subiam pelas costas dela até alcançar sua nuca e se enlaçarem em seus cabelos avermelhados. Ela podia sentir cada milímetro da pele dele contra a dela, a textura das mãos grandes e ásperas sobre seu corpo e estremeceu quando ele lhe beijou o pescoço e respirou pesadamente.
Aiolia levou as mãos ao rosto dela, quase desejando que pudesse vê-lo e saber se estava fazendo o certo. Talvez ela estivesse assustada, ou o achasse feio, ou até mesmo não estivesse sentido prazer algum ao lado dele. Não queria machucar aquela garota e faria o possível para que aquela noite não acabasse como uma lembrança a ser esquecida e encoberta por vergonha e dor. Beijou-lhe a face pequena e então procurou os lábios dela e os sentiu macios contra os seus. Sua língua pediu passagem e Marin cedeu a ele rapidamente. Movimentos sinuosos e os sabores que se misturavam causavam nela sensações estranhas e quentes, enquanto Aiolia se deixava levar pelo calor do corpo feminino colado ao seu.
Ele voltou a beijar o pescoço dela, descendo calmamente até sentir um dos mamilos da garota em sua boca. Ele o beijou, mordiscou de leve e lambeu provocando os gemidos dela. Era um sinal de que estava no caminho certo. Então uma das mãos dele alisou a pernas exposta dela, deslizando até alcançar a coxa, arranhando e apertando possessivamente. Marin enlaçou o pescoço dele com seus braços, deixando que suas mãos se perdessem nos cabelos do cavaleiro de ouro.
Aiolia segurou uma das mãos dela e a levou ao baixo ventre dele, instigando-a a tocá-lo de maneira mais íntima. Marin sentiu a rigidez dele com sua mão e guiada por Aiolia massageava de maneira a dar prazer ao cavaleiro de ouro. Aiolia gemeu contra o pescoço dela a medida que a garota aumentava a velocidade de seus movimentos. Então foi a vez dele deitá-la de uma vez na cama e seus dedos alcançaram o ponto sensível entre as pernas da menina.
Aiolia deslizou dois dedos dentro dela, sentindo-a quente e apertada. Ele fez movimentos sinuosos dentro dela, estimulando-a e arrancando gemidos dos lábios entreabertos da amazona. Marin se agarrou aos lençóis ao sentir a proximidade do orgasmo. Todo corpo dela se contraiu em uma onda de prazer desconhecida para ela. Marin sentia a pressão do membro dele entre suas pernas, latente. O cavaleiro abriu espaço entre as pernas da garota e lá se acomodou.
- Isso pode doer um pouco. – ele disse com a voz rouca, sem esconder que já não conseguia mais agüentar tamanho desejo. Ele beijou o pescoço dela mais uma vez e puxou o corpo dela de encontro ao seu, penetrando-a lentamente. À medida que ele entrava, Marin arranhava as costas largas do cavaleiro sentindo a dor mencionada. Era forte e já havia sentido dores piores em seu treinamento, mas não conseguiu conter a única lágrima que escapou de seus olhos. Aiolia sentiu o gosto do sal quando beijou-lhe a face. Por um momento ele entrou em pânico. – Relaxe. – ele disse.
- Mais... – ela murmurou – Mais rápido. – ela pediu. Aiolia tentou se concentrar no que devia fazer e então voltou a se movimentar dentro dela de maneira ritmada. Marin o enlaçou com suas pernas pela cintura instigando-o a continuar.
Aiolia gemia pesadamente ao ouvido dela, beijava-lhe o pescoço e a boca e estocava cada vez com mais força e mais fundo. Marin ajudava-o mexendo o quadril contra o dele. Ela começava se contrair ao redor dele em outro orgasmo. O cavaleiro resistiu por mais três estocadas e por fim se rendeu dentro dela enquanto Marin gritava alto de prazer.
A exaustão daquele momento não era nada parecida com a de um combate, sentiam os corpos pesados, mas o cavaleiro de Leão sentia-se estranhamente satisfeito a pesar de suas ressalvas no início da noite. Deitou-se ao lado dela e sentiu quando Marin se ergueu para pegar a máscara. Aquilo o irritou, a sensação de que jamais saberia o que ela estava sentindo. Ela o odiava por ter sido designado a cumprir aquela ordem? Ela daria as costas a ele para que não precisasse encarar o homem que cumpriu a tarefa de deflorá-la? Estava machucada, ou havia sentido algum prazer?
Quando ela voltou a se deitar ao lado dele, Aiolia a puxou para seus braços novamente. O cavaleiro sentiu um arrepio ao sentir a máscara fria contra seu peito. Ele pegou uma mecha do cabelo dela entre seus dedos e começou a brincar com ela.
- Não poder ver o seu rosto é desconfortável para mim. – Aiolia disse em tom de confissão – Me sentiria mais tranqüilo se algo em sua expressão me dissesse que está bem depois disso.
- Eu estou bem. – ela murmurou. Ele riu.
- E eu sei que uma amazona nunca diria aquilo que o cavaleiro que a "ensinou" não deseja ouvir. – ele disse – Acho que jamais saberei o que você está sentindo, não é?
- Jamais é muito tempo pra se ter certeza. – ela respondeu baixo.
- Isso ao menos me dá alguma paz no momento. – ele disse ainda brincando com o cabelo dela. – Quando será sua luta pela armadura?
- No primeiro dia da lua crescente. Lutarei pela sagrada armadura de Águia. – havia uma dose de orgulho na voz dela.
- Vai se sair bem. – Aiolia respondeu gentil – Não é qualquer uma que agüenta um cavaleiro de ouro, só as melhores. – se ele pudesse ver o rosto dela teria visto o rubor em sua face – O ritual só termina na véspera da sua batalha, mas se não quiser, podemos ignorar isso. Direi que tudo foi feito pela tradição e não a obrigarei a dividir a cama comigo.
- Se descobrirem terá problemas. – ela respondeu tímida. Ele bufou.
- Eu não sou conhecido por ser o mais disciplinado dos cavaleiros, sabe? – Aiolia disse rindo – Não me importo de ouvir sermões por ter me recusado a forçar uma mulher. Só aceitei esta noite por saber que se não fosse eu seria outro qualquer e talvez não tivesse a menor consideração pela sua integridade. Se não quiser que eu toque em você outra vez, vou entender.
- O Leão tem sua honra. – ela disse rindo – Achava que exageravam sobre isso.
- Não mesmo! – ele retrucou divertido – Honra e orgulho, coisas que alguém me ensinou há muito tempo. – a voz dele se tornou mais sombria.
- Seu irmão? – Marin perguntou tímida. Ele respirou fundo.
- Exatamente. Acho que ele mesmo acabou esquecendo-se da própria lição. – o cavaleiro disse ressentido – Ainda acho difícil acreditar que Aiolos tenha feito isso. Não meu irmão, que sempre foi correto com seu dever. Ele só faria algo assim se estivesse louco. Às vezes passo noites tentando achar uma brecha, uma incoerência na história e nada.
- Louco ou não, era seu irmão. – ela sussurrou – Lembre-se dele nos momentos bons, quando vocês não eram cavaleiros, só irmãos. Ao menos você sabe que fim ele teve, eu talvez nunca saiba o que aconteceu com o meu.
- Acho que família tem sido nosso problema, não? – ele riu ainda que a lembrança fosse triste. Marin bocejou. – Você devia dormir um pouco, vai amanhecer logo. – sem mais palavras eles dormiram um sono sereno, mas o cavaleiro de ouro não sabia que havia entregado seu coração de Leão a uma Águia.
Na manhã seguinte ele despertou sem ter nenhum sinal dela ao seu lado. Aiolia passou a mão pelo cabelo, bagunçando-o ainda mais. Levantou-se da cama e notou a mancha de sangue no lençol, mas Marin havia desaparecido antes que ele pudesse se certificar de que ela estava bem.
O cavaleiro colocou suas roupas e armadura. Não tinha mais nada o que fazer ali se não pensar em uma aprendiz de amazona. Saiu da pequena casa rumo ao santuário, esperava não encontrar ninguém em seu caminho para que não tivesse que dar explicações sobre o que estava fazendo naquela área de treinamento tão cedo. O mais provável é que Marin estivesse em sua rotina de treino e ele não tinha porque agir como se ela lhe devesse qualquer explicação.
Infelizmente os desejos de Aiolia foram frustrados no exato momento que alcançou o primeiro degrau da escadaria que levava às doze casas. Milo também acabava de retornada de sua "missão de ensino" e o sorriso em sua cara era no mínimo revoltante para o cavaleiro de Leão. Comentários sobre a noite anterior seriam inevitáveis e o irmão de Aiolos só podia esperar que o Escorpião fosse alguém digno o bastante para não ter feito mal a pequena amazona desaforada.
- Que noite! – o Escorpião começou rindo – Aquela garota desbocada é uma cobra! Imagine só, ela tentou me morder!
- Poupe-me dos detalhes, Milo de Escorpião. Não quero saber o que fez com a menina. – Aiolia rebateu seco e Milo deu de ombros.
- Tive que amarrá-la pra que ficasse quieta e dei uns bons tapas pela falta de modos. – Milo ria, provocando asco em seu companheiro de armas – Mas tenho que admitir que a noite foi boa, com um pouco de experiência Shaina ficará...Perfeita. – o Escorpião acrescentou com tom desejoso. – Aposto que a sua foi bem mais mansa.
- Não é da sua conta, Milo. – Aiolia rebateu mal humorado.
- Huhuh! Pior que um leão com dor de dente. – Milo debochou do humor do cavaleiro – Do jeito que você é, sou capaz de apostar que você não fez nada com ela. Ficaram conversando a noite toda e quando o sol raiou você se cortou para deixar uma marca de sangue nos lençóis e a pequena lhe será eternamente grata por tê-la poupado do ritual. Isso é tão...VOCÊ! – antes que Milo se desse conta, Aiolia o agarrou pelo pescoço e o ergueu do chão. Furioso, o Leão armava o golpe contra seu suposto "amigo".
- CALE A BOCA! – Aiolia rugiu – O que fiz com Marin não lhe interessa e eu não a desonraria ao contar a você o que se passou entre nós. Não questione, não imagine, não faça especulações a respeito dela ou vou acabar ignorando as regras do santuário e lhe partindo essa cara debochada! – então ele largou Milo no chão e lhe deu as costas.
- Tome cuidado, Leão! – Milo alertou – Se começa a defender muito alguma coisa pode acabar se apegando a ela. E eu não estou falando da honra de uma amazona.
- Vá pro inferno! – foi a única resposta que o Escorpião recebeu. Aiolia continuou subindo as escadas através das doze casas até atingir a casa de Leão.
Naquele dia o Leão não deixou sua casa, tão pouco conversou com qualquer pessoa que não fosse seu criado Garan. Estava de péssimo humor depois da discussão com Milo e era revoltante pensar que um Cavaleiro de Ouro, alguém que devia servir de modelo, poderia ser tão repulsivo ao tratar uma garota como ele havia tratado Shaina. Pior era pensar que ele próprio, Aiolia, havia aceitado aquela ingrata missão.
Não que a noite tenha sido ruim. Aliás, já fazia algum tempo que ele não ficava a sós com uma mulher. Normalmente era uma serva ou outra do santuário, romances sem futuro ou importância alguma. Mas submeter uma amazona, alguém que fora treinada como ele foi, parecia mais do que errado. E apesar de tudo Marin não havia lutado, nem ao menos protestou quando estiveram juntos, não esboçou reação alguma e talvez fosse isso o que estava incomodando tanto.
Se ele ao menos tivesse a certeza de que ela havia sentido algum prazer, não só físico, mas na companhia dele, Aiolia se sentiria bem mais confortável. Eles teriam que se encontrar de novo, e o Leão havia dado sua palavra de que não a tocaria se ela não desejasse. E subitamente ele esperava que ela o quisesse outra vez.
Aiolia voltou a cabana ao cair da noite. Luzes acesas indicavam que o lugar estava ocupado. Ele bateu na porta rudimentar de madeira e esperou até que alguém viesse atendê-lo. Marin abriu a porta e deu um sobressalto ao vê-lo ali, parado no umbral, usando roupas de treinamento apenas. Silenciosa, ela fez sinal para que ele entrasse.
- Você tinha sumido quando eu acordei. – Aiolia disse encarando as costas da pequena amazona enquanto ela entrava na cozinha. – Fiquei preocupado. – Marin parou por um momento.
- Fui tomar um banho e beber a "infusão". – ela respondeu timidamente. Aiolia corou por ela ter dito algo tão pessoal e por não ter pensado nisso antes.
- Não queremos acidentes antes da sua batalha pela armadura, não é mesmo? – o Leão respondeu sem graça – Não sou muito bom com as palavras, então me perdoe se soar rude ao ir direto ao assunto. – ela acenou positivamente – Devemos seguir com o ritual, ou prefere que eu faça o que lhe propus noite passada? – Marin ficou calada por um tempo, até criar coragem para responder.
- O Leão tem sua honra e eu também tenho a minha. – ela respondeu ao se virar para ele – Você foi bom para mim e eu não posso arriscar colocá-lo em problemas caso descubram que trapaceamos.
- Não tem que fazer isso por mim, Marin. Não me importo. – ele desejou tocá-la, mas manteve-se no lugar onde estava.
- Mas eu me importo. – ela retrucou firme – Além do mais, talvez me traga alguma sorte. Cumprir meu dever, mesmo quando uma proposta como essa surge, pode convencer os deuses de que sou merecedora da sagrada armadura. – ela disse convicta. Aiolia se aproximou com cuidado e a abraçou. Ela cheirava a flores secas e sândalo. O cavaleiro deslizou as mãos pelas costas dela e afastou uma mecha de cabelo para trás da orelha da garota.
- Muito bem então. – ele sussurrou junto ao ouvido dela – Serei seu amuleto da sorte. – então lhe beijou o pescoço exposto – Apague as luzes e venha para o quarto sem máscara, eu estarei esperando você no escuro.
E ele a esperou no escuro pelos seis dias anteriores a batalha pela armadura. Por seis dias cumpriram o ritual que Aiolia tanto abominava a princípio. Por seis dias, enquanto estavam no meio da escuridão, não eram cavaleiro e amazona, eram apenas humanos. Talvez fosse ela, seu jeito sério e responsável, seus surtos de sensibilidade e uma dose de instinto materno. Talvez fosse ele que há muito tempo não sabia o que era ser aceito e receber carinho.
Na véspera da luta Aiolia havia deixado o Santuário para zanzar pela cidade. Ele se passava por um garoto normal, ninguém a ser reparado, entre as lojas. Numa vitrine algo lhe chamou a atenção. Uma faixa de linho branco, com franjas e sem detalhe algum. Era simples, ela pura, era bela e seria perfeita para um presente à Marin. Queria dar a ela um amuleto de boa sorte para a batalha e queria que ela sentisse que ele estava junto dela na arena.
Comprou a faixa e voltou para o Santuário com um entusiasmo incomum. Estava quase anoitecendo e Aiolia nem mesmo se deu ao trabalho de voltar pra casa de Leão. Seguiu direto para a área de treinamento das amazonas, para a pequena cabana que Marin ocupava. O sol acabava de se por quando ele a viu parada diante da porta com um cesto de roupa.
Mais uma vez ele se viu refletido na máscara quando desejava ver algum sinal no rosto dela que indicasse que ele era bem vindo. Se perguntou se ela estaria sorrindo para ele por traz do metal. Ela deixou o cesto no chão.
- Boa noite. – ela o saudou e Aiolia sentiu uma onda inexplicável de alívio. Caminhou até ela, num movimento rápido enlaçou-a pela cintura usando a faixa branca enquanto seus corpos se colavam – O que é isso?! – ela perguntou assustada e o cavaleiro riu.
- Um presente de boa sorte para você. – ele disse enquanto amarrava a faixa ao redor da cintura dela.
- Não precisa me dar presentes. Isso não é parte do ritual. – ela disse num tom constrangido. Ele desejou arrancar a mascara dela e mandá-la longe, poder beijar aquela garota em plena luz do dia e as mãos dela sobre o tórax dele não ajudavam muito.
- E eu já disse que não ligo pra regras. Eu quis lhe dar isso. Não é grande coisa, mas eu gostaria que usasse. Isso é, se você quiser. – ela abaixou o rosto.
- Obrigada. – ela disse.
- Não há de que. – ele respondeu com um sorriso digno de Apolo e Marin sentiu seu coração vacilar uma batida. – Vai me convidar pra entrar ou vamos terminar o ritual ao ar livre? – ela desviou os olhos dos dele.
- Eu... – ela ponderou um segundo – Se não se importa, vou aceitar a proposta que fez na primeira noite hoje. – cavaleiro ou não, Aiolia não pode deixar de sentir o golpe no ego. Então ela não o queria naquela noite. Ele a teve por cinco dias, poderia conviver com isso, não? Talvez, se essa não fosse a última noite em que ela era "obrigada" a aceitar um homem. Ele disfarçou o desapontamento.
- Entendo. Amanhã é um grande dia pra você, precisa descansar. – e ele desejou que este fosse o motivo. Ela acenou com a cabeça positivamente – Mas eu gostaria de passar esta noite em sua companhia, nem que seja só pra conversar.
Ela não protestou. Aiolia entrou na cabana ainda sentindo o golpe no orgulho, mas Marin tinha todo direito de rejeitá-lo. A pesar de tudo, a conversa foi boa e longa como se eles se conhecessem há séculos ou coisa parecida. Eles se entendiam e não era só na cama, o problema era a distância que ela impunha, enquanto tudo o que o cavaleiro mais desejava era arrancar aquela maldita máscara e beijá-la, arrastá-la para aquele quarto e esquecer que algum dia existiu um Santuário a ser protegido, um dever a ser cumprido, uma mulher a ser esquecida.
Queria acreditar que havia algo mais ali além de obrigação. Que Marin sentia alguma afeição pelo homem que a respeitava a cima de tudo e estava sentado diante dela. Quem sabe aquela não fosse à última noite e a amazona ainda o aceitasse. Tê-la por perto, andando pela casa de Leão com sua graça natural, dando ares femininos àquele lugar. Ele não se queixaria, ele não poderia desejar uma vida melhor do que aquela que o sonho lhe mostrava.
Já era madrugada e Aiolia via as luzes da lamparina produzirem sombras dançantes sobre a máscara. Lembrava-se da textura da pele dela, de como ela gemia quando ele a tocava de maneira intima. Queria abraçar aquele corpo pequeno mais uma vez e sentir o cheiro dela misturado ao dele. Não era de seu feitio ignorar uma promessa, mas por uma noite, a última noite, ele precisava de Marin.
Ela estava de costas, lavando um resto de louça suja que estava na pia. Apenas uma lamparina acesa ao seu lado. Tão pequena, tão vulnerável, tão querida. Aiolia caminhou até ela decidido e sorrateiro. Marin não ouviu quando ele se aproximou, ignorou o cosmo incandescente dele, queimando em suas costas, a mão dele apagando a chama da lamparina e o momento em que ele a abraçou forte.
Ela não reagiu e o cavaleiro a girou em seus braços, colando o corpo dela ao seu. Num movimento rápido livrou-se da máscara fria e insensível e num único sopro de insanidade ele a beijou, sabendo que o mundo deles estaria acabado no dia seguinte.
Acabaram no quarto dela, gemendo e chamando um pelo outro em meio às carícias. Aiolia a amou, como a amava dês da primeira noite. Desesperado por ela e seu rosto incógnito. Por uma noite, ele se livrou de seu fardo, de sua armadura, de seu passado e apenas a amou, como um humano, como um homem.
Quando acabaram ele a abraçou forte, beijou suas costas sentindo o toque de cetim contra seus lábios e notando o arrepio que causava nela. Queria poder ver seu rosto naquele instante.
- Eu estive pensando. – ele disse baixo num esforço de iniciar uma conversa – Amanhã você será uma amazona de prata e poderá andar livremente pelo Santuário.
- Ainda não sei se vou ser uma amazona. – ela retrucou meio entristecida.
- Será sim. – ele beijou sua nuca – Tenho certeza que será. E quando for, gostaria que viesse a minha casa. Garan ficaria satisfeito de ver outra pessoa que não seja eu andando por lá. Isso é, se você quiser me visitar.
- Eu adoraria... – ela murmurou em resposta.
Se fosse possível teria usado todo seu cosmos para parar o tempo naquela noite, mas o sol nasceu e eles se despediram silenciosos. No coração do Leão pairava uma esperança desconhecida e quente, um desejo firme de estar sempre próximo a ela. Ele não poderia assisti-la na batalha, mas estaria esperando ansioso por notícias. Sonhando acordado com o momento em que ela subiria as escadas do Santuário e entraria em sua casa, ostentando o brilho prateado da armadura sagrada e pela primeira vez mostrando seu rosto.
Garan o irritou durante toda manhã porque tinha que repetir a mesma pergunta várias vezes para que o mestre respondesse. E tudo que Aiolia conseguia pensar era nela. Milo de Escorpião entrou na casa de Leão por volta das duas da tarde. O escorpião trouxe consigo notícias da arena. Shaina era a nova amazona de Cobra, o que soava irônico, e Marin foi a eleita da armadura de Águia. Afinal ela era uma amazona de prata, exatamente como ele disse que ela seria.
Aiolia se levantou de uma vez e sem pensar a respeito começou a descer as escadarias do Santuário. Milo correu atrás do companheiro de armas sem entender a euforia do amigo.
- Aiolia! – ele chamou – Onde você está indo?! Louco!
- Preciso vê-la! – o leão respondeu – Quero dar os parabéns pessoalmente. – o escorpiano continuou sua perseguição incrédulo com aquilo que estava vendo e ouvindo.
- Perdeu o juízo?! –Milo perguntou enquanto parava Aiolia na altura da casa de Câncer – Ela é uma amazona agora e você um cavaleiro de ouro! Se envolver com ela é proibido!
- Também era há uma semana isso não impediu nem a mim e nem a você de cumprir o maldito ritual! – o leão rugiu.
- Era diferente! – Milo retrucou – Semana passada eram candidatas a amazonas e o que fizemos foi "ensiná-las", ou pelo menos foi o que eu fiz. Você obviamente extrapolou suas obrigações!
- Por que não vai dar lição de moral na sua mãe!? Eu pelo menos não bato em garotas e as forço a fazer nada. – Aiolia rebateu e Milo trincou os dentes.
- Eu fiz o que me era de direito fazer! Olhe pra você, Leão! Está agindo como um idiota apaixonado! – Aiolia parou instantaneamente.
- Não diga asneiras. – o leão respondeu baixo.
- É isso, não é? Se apaixonou por ela! – Milo disse venenoso – Sabe que isso coloca os dois em problemas, não sabe? Você, mesmo sendo irmão do traidor, tem obrigações com o santuário! Vai acabar arruinando a vida dela também. – num ato reflexo Aiolia desferiu um poderoso soco contra o amigo. Milo caiu sentado na escadaria e tudo o que viu foi o Leão correndo. Um leão com um coração apaixonado, correndo para alcançar uma águia.
Ele a encontrou próxima a cabana. A armadura lhe cobria o corpo esguio e o cosmo dela era esplendoroso. O sol estava se pondo e tudo o que ele mais queria era abraçá-la por sua conquista. A pesar dele não ter feito esforço para ser discreto, Marin não se virou para recebê-lo.
- Eu disse que você conseguiria. – Aiolia disse sorrindo ao notar que ela não havia tirado a faixa que ele havia dado – Meu amuleto funcionou muito bem.
- É verdade. – ela murmurou – Obrigada por isso.
- Gostaria de subir comigo até a casa de Leão? Poderíamos comemorar sua vitória, Garan cozinha bem e...
- Eu não vou até a casa de Leão. – ela disse morbidamente.
- Entendo, você deve estar cansada. Podemos ir outro dia. – ele deu um passo em direção a ela.
- Eu não irei até sua casa, cavaleiro. – ela disse fria – Eu sou uma amazona agora e não posso ser vista com um homem pelo Santuário. O ritual acabou e tudo o que existe agora é o respeito entre guerreiro.
- Marin... Eu... – o Leão perdeu a fala.
- O dever vem em primeiro lugar. – Marin começou a caminhar até a entrada da cabana – Até a vista, cavaleiro de Leão. – ela entrou na cabana e fechou a porta, enquanto o leão era deixado do lado de fora, sozinho com sua dor.
Vendo tudo em vermelho ao seu redor, ele subiu novamente a escadaria e a teria lavado com sangue pela infâmia da amazona. E ele, logo ele, que havia lhe dedicado tanto cuidado e tanto respeito era tratado agora como um estranho, um cão sarnento que alguém chuta no meio da rua. Mas ele não era um cão, ele não era um animal inferior para ser rejeitado daquela maneira. Ele era o Leão Dourado, a elite dos doze, ele era Aiolia.
Garan não se meteu em seu caminho, tão pouco chegou perto quando o mestre se pôs a destruir tudo o que via pela frente. Ele estava perturbado, ferido de morte. Tudo nele era ódio cego e surdo. Com dentes trincando de raiva e punhos cerrados, não houve pilastra ou pedaço de mármore que não sofresse golpes. O cosmo atordoado e explosivo era assustador e nem mesmo Aiolia se reconhecia naquele acesso de fúria.
Passado o surto, passado o momento de descontrole, o leão recobrou sua calma e sua razão. Por que ela tinha que ser tão fria? O que havia feito de errado? Ele sabia a resposta, mas relutava em aceitar que tudo aquilo que tinham vivido na ultima semana não passou de um "dever" para ela. Se recusava a admitir que houvesse sido o único a cometer o maior erro de todos, se apaixonar por uma amazona.
Por que ninguém o avisou que doeria tanto amar? Por que ninguém lhe disse que aquilo que se passa entre homem e mulher nem sempre é superável ou fácil de esquecer? E por que agora havia tanta dor, raiva e desejo de voltar até lá e agarrá-la a força, como Milo teria feito? Arrancaria-lhe a máscara e só restaria a ela a opção de matá-lo ou amá-lo e, se ela escolhe-se a primeira opção, era certo que não conseguiria cumprir.
O tempo não ajudou a amenizar. Ele tinha seu orgulho de leão e o teria sempre. Não seria ele quem daria o primeiro passo, não bateria na porta dela outra vez depois de ser rejeitado daquela maneira e se ela o quisesse saberia o caminho da casa de Leão. E toda vez que se esbarravam pelo Santuário pairava no ar o desconforto e o ressentimento. Marin era educada, o que tornava tudo muito pior. Antes ser um inimigo declarado do que um "passado" tratado com educação e cortesia.
Jurou pelo Estíge que nada o faria voltar atrás em sua promessa. Nada o levaria aquela cabana outra vez para oferecer qualquer sentimento à amazona. O coração dela era tão frio e duro quanto à prata de sua armadura. Marin não tinha qualquer sentimento além de subordinação ao seu dever sagrado. Pois que assim fosse. Aquela missão divina não significava nada para ele. Odiava o Santuário, os cavaleiros, os códigos, tudo aquilo que um dia levou seu irmão a morte e agora levava a ruína ao guerreiro de Leão.
E o tempo passou. Vieram os titãs e fatidicamente ele e Marin lutaram do mesmo lado. Ele morreria negando que correu até o campo de batalha no minuto que sentiu que ela estava em perigo. Morreria negando que seu coração falhava toda vez que a via passar.
Relutar era sua sina e a desculpa era o orgulho. Foi só quando Seiya surgiu como pupilo da amazona que Aiolia se convenceu de que poderia ser útil no treinamento do garoto. E Seiya era um bom menino e nem de longe desconfiava que o grande cavaleiro de ouro que observava seu treinamento estava ali para manter os olhos e o coração bem próximos de Marin.
A convivência, ainda que formal, era inevitável e a cada dia o cavaleiro de Leão se convencia que a única chance que teria com a amazona chegaria no dia em que aquela máscara não mais existisse.
Mas o destino quis que Seiya desse as costas ao Santuário para proteger Saori Kido, a suposta reencarnação da deusa Athena. Aiolia odiaria Saga pelo resto da vida por vários motivos. Gêmeos foi o responsável pela condenação de Aiolos, tentou matar Athena, colocou todos os cavaleiros sob seu comando, ordenou que o Leão Dourado lutasse contra Seiya e isso levou a relação de Aiolia e a amazona de prata a um momento crítico.
Ele não a culpava por odiá-lo. Tinha se levantado contra o pupilo dela, o garoto que ambos haviam treinado e que Marin amava como a um irmão. Foram noites de sono perdido, se culpando por não ter notado a farsa de Saga. E agora a mulher que ele amava lhe daria as costas para sempre.
Depois da batalha das Doze Casas, Athena o perdoou e ele lutou em nome da deusa em tantas outras batalhas que perdeu as contas. A cada vez que confrontava um inimigo Aiolia desejava a morte ou a redenção, na esperança de que um dia Marin o amasse, ou perdoasse seu erro infeliz. A pesar de se falarem, de se verem pelo Santuário e sempre agirem com cordialidade, a frieza dela o feria muito mais do que qualquer guerreiro seria capaz, mas um dia ele daria o próprio sangue por ela sem pensar duas vezes.
Ele e Milo tinham voltado a se falar e podiam dizer que acabaram amigos depois de tantos conflitos. Foi numa tarde qualquer, quando as coisas pelo Santuário estavam calmas, que Aiolia se deu conta de que não foi o único a sofrer cicatrizes daquela maldita semana. Milo olhava o por do sol aborrecido.
- Se aquele maldito não tivesse sido tão útil e Athena não o tratasse como um herói, juro que ficaria muito feliz se você tivesse matado Seiya na primeira luta de vocês. – Milo resmungou e Aiolia encolheu os ombros, aquela não era uma lembrança agradável.
- Eu provavelmente teria feito isso, se Shaina não tivesse entrado na briga. – Aiolia respondeu – Ela não é muito racional quando está com raiza.
- Se fosse raiva o que ela estava sentindo eu teria ficado muito satisfeito. – Milo murmurou – Alguma vez você sentiu vontade de voltar no tempo, voltar àquela semana e fazer tudo diferente?
- Do que está falando? – Aiolia fitou o rosto do Escorpião.
- Às vezes eu penso que devia ter visto o rosto dela. – Milo respondeu desanimado – Ela agora vive essa obsessão por aquele moleque irritante e sem graça, só porque ele a viu sem máscara. Fico imaginando o que teria acontecido se fosse eu quem a tivesse visto.
- Ela teria cortado a sua garganta enquanto você dormia. – Aiolia respondeu rindo.
- Fala como se ela não tivesse tentado. Acordei bem a tempo e nos outros dias eu não dormi. – Milo retrucou – Eu digo, será que ela passaria o resto da vida tentando me matar, ou ela escolheria a outra opção.
- No caso dela com Seiya, acho que ela tenta matá-lo pra não admitir que o ama. – Aiolia falou sem dar grande importância – Demorou todo esse tempo pra entender que gosta dela? – Milo não disse nada, apenas confirmou com a cabeça. – É, eu penso nesse tipo de coisa às vezes. Cada dia que passa tenho mais vontade de arrancar aquela máscara.
- Pelo menos suas chances são maiores que as minhas. – Milo retrucou – Marin sempre teve motivos para gostar de você.
- Eu realmente gostaria que você estivesse certo sobre isso.
Não importava mais quantos anos haviam passado até aquele momento. Não importava mais quantas vezes ele tivesse imaginado o que aconteceria. O destino havia guiado o Leão até aquela cabana isolada. Ele observou a silhueta dela ao pôr- do- sol e sentiu que o fato dela ainda usar a faixa que ele havia dado era o sinal de que tudo daria certo. Depois de tudo, Aiolia estava cansado de máscaras, estava cansado de esperar por ela no escuro.
Nota da autora: Pensem num projeto antigo! É este! Minha primeira fic de cdz, mas isso não significa que eu seja uma novata no ramo. Tenho fics de Harry Potter e Twilight publicadas, mas esta é uma idéia que eu cultivo a anos! Fic dedicada ao casal Aiolia e Marin, mas tenho planos de fazer um capítulo dedicado ao Milo e a Shaina também. Espero que gostem e comentem.
Bjux
Bee