O sol se pôs rápido, trazendo uma noite tranquila. Não havia estrelas, mas em compensação o mar escuro era deslumbrante. Mesmo com pizza e coca-cola, ficou muito melhor do que qualquer restaurante chique, mais íntimo. Havia algumas flores rosas e brancas na mesa redonda, taças de cristal e três velas.

Eu olhava dentro dos olhos verde dele a cada minuto, desejando que o momento nunca acabasse.

Não parecia tão fácil? – perguntava para mim mesma, com esperanças vãs, pois eu sabia a resposta: Não, não era fácil. Pois eu sabia que quanto mais eu ficasse perto dele, mais iria me doer depois, quando tudo acabasse. A impressão era como uma droga, quanto mais temos, mais queremos – e no meu caso era prejudicial.

- Para você, qual é a pior parte de ser um lobisomem? – perguntei.

- Ficar pelado com freqüência – fez uma careta – Ah, e não conseguir se controlar, com medo de ferir as pessoas ao seu lado.

- É, é a pior parte para todos também.

- Mas ficar pelado também irrita. Deve ser mais chato para você, não é?

Suspirei.

- Sim, mas poder correr naquela velocidade, sentir-se livre de tudo e todos compensa.

- Tem razão, a velocidade é a melhor parte – ele abriu um sorriso que poderia iluminar a cidade toda – Mas não tem como se sentir livre de todos.

- Ah, é verdade, essa é a pior parte. Ter todos os seus pensamentos expostos para todo mundo ouvir, poder ouvir o que os outros pensam sobre você... – estremeci, depois eu sorri – Sabe, no início, ninguém me suportava, eu enchia o saco de todos.

- Como assim?

Mordi a língua, eu e a minha boca grande...

- É, você sabe, com esse negócio de se mulher e tudo isso - menti.

- Sei, deve ser difícil para você.

- Antes sim, agora não tanto. Eu pensava que isso era como uma maldição, que eu era uma aberração. Agora acho que isso é um presente que Deus me deu, e não posso ficar mais agradecida, não sei como minha vida seria sem ser lobo... Mas não tem como você saber disso, já que é lobo há tão pouco tempo - acrescentei, pois ele pareceu confuso.

Ele me encarou por bastante tempo, até me deixar constrangida.

- Você é misteriosa, sabia disso? Eu tento te desvendar, mas nunca consigo. Suas palavras e expressões dizem uma coisa, os olhos uma coisa totalmente diferente.

- E em qual você mais crê? Nos olhos ou nas palavras e expressões?

- Nos olhos, é claro. Mas isso me deixa meio confuso, já que posso não te ler muito bem e odeio fazer suposições.

Mastiguei um pedaço da pizza, feliz que ele não me entendesse.

- Você é também bem reservada, não é? Reparei que não falasse nada da vida pessoal, nada revelador. E eu já falei de tudo! Da minha escola, da minha casa, da minha cidade natal, da minha irmã, dos meus sonhos, dos meus gostos pessoais...

- Isso é muito injusto – reclamei – Você conhece meu irmão, você conhece minha casa e minha escola não tinha nada demais.

Ele balançou a cabeça, negando.

- Mas você não falou sobre eles – ele me lançou um olhar penetrante e sua voz ficou séria – Eu quero te conhecer melhor, Leah, eu realmente quero.

Um tremor passou no meu rosto com a intensidade daquela frase. Sentia meu rosto quente, mais quente do que o usual.

No meu cérebro, uma palavra em neon piscava e brilhava com intensidade: ERRO, ERRO, ERRO.

- Nós temos a eternidade para isso – falei, indiferente, tentando mudar o clima da conversa.

Mas aquelas palavras me afetaram mais do que eu achava ser possível. Uma eternidade, uma eternidade de vassalagem! Mordi meus lábios e belisquei meu braço, tentando focalizar minha dor em outro lugar.

- Sim, temos – ele me olhou, desconfiado.

Continuamos conversando durante a noite toda, e provavelmente ficaríamos mais tempo se eu não tivesse visto no relógio que já passara das onze, e expliquei que, mesmo já sendo adulta o suficiente para não ter horário para chegar em casa, eu não queria deixar minha mãe preocupada.

Desta vez fiquei de olhos abertos a viagem inteira e meus olhos lacrimejaram por isso, mas a paisagem era linda demais para ser desperdiçada. O vento estava glacial, eu estava quase com frio.

Ele dirigia rápido, quando chegamos em casa as luzes da cozinha ainda estavam ligadas.

- Então – falou ele enquanto descíamos da moto -, por que no dia em que nos conhecemos você saiu tão depressa? Eu podia jurar que era algo comigo...

Apertei o punho. Droga, então ele percebeu.

Argh, quem não perceberia, idiota?

- É... hm... – pensei em algo para falar – Eu tinha uns assuntos pendentes com minha mãe para resolver – menti.

- Mentirosa – acusou com um sorriso malicioso.

- Por que você acha que estou mentindo?

- Eu não sou idiota, Leah.

- Pensei que você não gostasse de fazer suposições.

Revirou os olhos.

- E não gosto, mas quando todas as vozes na sua cabeça acham o mesmo que eu, então eu posso duvidar se alguém me diz o contrário.

Eu suspirei.

- Não vai me dizer, né?

- Eu não vou te dizer outra coisa além do que eu já disse.

Ele se aproximou e pegou na minha mão. Eu senti meu corpo inteiro pegar fogo de novo, e temi do que o meu rosto demonstrava. Tentei parecer indiferente, mas sabia que minha respiração irregular me denunciava.

- Então, o que você achou desta noite?

Eu podia sentir seu hálito doce; mordi os lábios, tentando reprimir um suspiro.

- Foi... – tentei me lembrar das palavras certas – Legal.

- Legal? – ele sorriu maliciosamente e chegou mais perto, pegou uma mecha do meu cabelo e disse: - Isso não foi muito convincente, Leah.

Oh, Deus, ele estava perto demais. Engoli a seco e tentei recuperar o bom senso.

- Foi divertido, muito divertido, Zac. Agora tenho que entrar, tenha uma boa noite, até outro dia - as palavras saíam com rapidez da minha boca.

Dei as costas a ele, e senti a corda me puxar novamente. Eu ia bater minha cabeça no concreto por isso.

- Leah? – ele me chamou antes de abrir o portão da casa.

Eu virei hesitantemente.

- Sim?

- Por que você tem medo de me beijar?

Meu queixo caiu com sua pergunta direta; fiz questão de fechá-lo.

- Eu não tenho.

- Agora sim eu irei te chamar de mentirosa.

- Ah – arfei – Você não pode dizer isso.

- Oh, sim, eu posso - seu sorriso malicioso se alargou.

- Eu não estou com medo de te beijar, eu não quero – menti.

- Ah... - suspirou, com uma falsa frutração - Tantas mentiras.

- Eu estou falando sério – menti novamente.

- Está certo – ele deu um sorriso torto, que quase me fez desfigurar todas as minhas mentiras – Se você não quer me beijar, eu não vou te beijar, não se preocupe com isso.

Agradeci que Zac deu as costas para mim e saiu rapidamente, assim eu poderia ficar imóvel na calçada por um minuto sem ter que mentir novamente.