Caminhava calmamente pelas ruas do Bronx. Era o inverno do ano de 1957, tinha apenas 18 anos. Milo Portokalos era descendente de uma família grega e pobre que foi tentar vida nova nos E.U.A fugindo dos desempregos causados pela Segunda Guerra Mundial na Europa.

Ele morava sozinho. Voltava de Manhattan, estava tentando abrir seu negócio próprio. Era solteiro e tinha cicatrizes do passado, não tinha muitos amigos. Quase um anti-social convicto.

Caminhava pensando nisso, quando ouviu barulho de tiros. Correu na direção deles, apesar de seus instintos lhe dizerem para fugir dali.

Chegou a um beco onde dois corpos jaziam. Um homem e uma mulher. Usavam alianças, eram casados. Nas bolsas ainda havia dinheiro e documentos, aquilo não havia sido um assalto. Levantou a cabeça bruscamente ao ouvir o choro de um bebê.

Ele estava em um carrinho que o rapaz loiro não havia reparado antes. Se aproximou e olhou para o interior, enxergando assim, a criança.

Sabia que era ilegal pegar a criança sem passar por um processo de adoção. Mas sabia também que não ia conseguir sua guarda e que, se o deixasse ali, provavelmente iria morrer.

O menino tinha cabelos loiros e olhos azuis grandes. Balançou seus bracinhos na direção de Milo, que lhe deu um sorriso gentil.

"Vem, eu já sei um bom lugar para você ficar nessa selva de pedra."

Milo pegou-o no colo e correu para o ponto de ônibus mais perto, não sem antes chutar o carrinho no chão. Não se preocupou com suas digitais, pois usava luvas de couro.

Passou em casa e pegou o cesto de palha que usava para fazer feira e mais algumas mantas de lã para aquecer o bebê, que não devia ter mais do que oito meses.

Se encaminhou a pé até a casa de seu amigo Aiolia, que regulava de idade com ele, porém já era casado com a adorável Marin e tinham tido filhos há pouco tempo. Deixou o bebê na porta e tocou a campainha, saindo correndo logo após isso.

Não tinha receios de que os dois não quisessem o pequeno, ambos adoravam crianças.

Dez anos se passaram.

De quando em quando ele visitava a criança, que recebera o nome de Hyoga.

O menino era vivaz e inteligente. Seus olhos azuis e brilhantes revelavam uma mente sagaz.

Milo adorava crianças e era fascinado por Hyoga. Ensinara-lhe tudo o que sabia de brincadeiras. Tudo o que Athina lhe ensinara. A irmã sempre brincou com os meninos e, muitas vezes, ganhava deles em jogos como bafo e baseball. Por isso e por outras coisas, Athina era considerada uma menina esquisita.

Hyoga lhe lembrava ela.

Ela era daquele jeito, tão desprendida, tão amável, tão inteligente.

Ela morrera em um acidente e Milo se culparia eternamente por aquilo.

"Milucho, você está bem?" Perguntara-lhe a irmã ao telefone.

"Não estou nada bem, Tina, nunca mais vou estar!" Respondera-lhe Milo, desesperado, segurando uma garrafa de vodca em uma das mãos.

"Vocês brigaram de novo, não brigaram...?" A pergunta de Athina era retórica, Milo só bebia quando brigavam.

"Brigar?! Quem dera que tivesse sido só uma briga! Aquele... ser é um verme! Me traiu! Eu o vi nos braços de outro! E tinha me jurado que eu era o único! Que eu era especial! Mentira! Tudo mentira! Eu o odeio! Odeio muito mesmo!" Milo estava aos berros no telefone. Ele chorava.

O "Escorpião" só chorava por uma pessoa.

"Milucho, não se preocupe, não faça nenhuma bobagem. Eu estou indo para o bar, viu?"

"Tá, Tina. Nada que ninguém faça vai mudar nada mesmo..."

"Não faz nada Milo, lembra que eu te amo, a mamãe te ama. Não faz nenhuma bobagem..."

"Tá, Tina." Ele não ligava.

Deus podia amá-lo como seu favorito que ele não ligaria. Se ele não o amasse, ele não ligava para nada.

Athina agarrara a bolsa e fora salvar seu irmãozinho caçula dele mesmo.

Mas a Morte é implacável. Para cada alma que perde, ela leva outra em seu lugar.

Ao atravessar a rua, Athina estava tão perturbada que não viu o caminhão, fora atropelada e morrera no hospital.

Milo divagava na sala, imerso em lembranças, quando Aiolia entrou no cômodo, com o semblante transtornado.

"O que foi?" Perguntou, se levantando e caminhando até ele.

Aiolia o olhou com um brilho fosco em seus orbes azuis. Balançou a cabeça em desalento.

"O que foi, Aiolia?!" Milo segurara o braço do amigo para chamar-lhe a atenção.

"Giovanni Malacicci foi solto." Sentenciou.

Camus arregalou os olhos.

"Esse homem não é da..."

Aiolia acenou afirmativamente com a cabeça. Giovanni Malacicci fazia parte da elite da Máfia, como um dos assassinos mais frios e cruéis daquela geração.

Seu codinome era Maschera della Morte, Máscara da Morte, pelo fato de seu rosto permanecer desconhecido durante muitos anos, já que nenhuma de suas vítimas sobrevivia para testemunhar contra ele.

"Mas... mas em que isso interfere nas nossas vidas?"

Aiolia sentou-se no sofá com um suspiro e Milo imitou-o. Os cabelos loiros do amigo caíam sobre os olhos dando-lhe um aspecto desleixado.

"Eu e ele tivemos uns desentendimentos quando eu era mais novo... Além de eu tê-lo denunciado. Tenho certeza de que ele vai querer se vingar. O Giovanni sabe que o Hyoga é adotado, eu tenho certeza de que vai querer se vingar em cima dele. É típico." Aiolia soltou mais um suspiro. "Milo, meu amigo, posso te pedir um favor?"

Milo balançou a cabeça, incentivando seu amigo a prosseguir.

"Leva o Hyoga embora, cuida dele para mim? Eu já falei com um orfanato na Califórnia onde Oros trabalha e vai garantir que o Hyoga fique bem protegido. Eu e Marin vamos para a Grécia com os outros." Ao ver a sobrancelha erguida de Milo, Aiolia prosseguiu "O patriarca daquele ramo da família disse que já seria uma imensa exceção receber a mim e minha família não-grega, ele não quer um 'bastardo' também."

"Mas Hyoga não é bastardo." Retrucou Milo.

"Para ele, filho adotado e ilegítimo dá no mesmo. Ainda mais nas condições que o pequeno foi adotado. Então, Milo, você é o padrinho de Hyoga, a pessoa em quem eu mais confio, cuida dele?"

Ele fez tudo o que poderia fazer em uma situação como aquela, concordou.