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Antes havia imagens nítidas, sentimentos tão vivos que ás vezes se faziam delirantes.
Aos poucos – sem perceber – foi sumindo, e sumindo, e sumindo.
Até que sumiu.
Não havia nem branco, nem preto.
Não havia nada em mim.
Quem me roubou de mim?
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Nihil
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Um mês depois da carta de aviso.
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Nevava tão delicadamente que nem era possível sentir os flocos de neve caindo sobre mim. Admito, não sou a pessoa certa para falar sobre o que sinto – afinal, mortos não sentem nada.
E isso era medonho.
Eu coloquei os livros no chão e me ajoelhei ao lado deles. Não sei quanto tempo fiquei naquela mesma posição apenas olhando a neve, mas deve ter sido um tempo considerável. Eu devia estar tomando coragem para tocá-la e ver que eu não sinto nada. Estiquei meus dedos esqueléticos e coloquei sobre a neve e com a pressão ela cedeu um pouco. Mas não foi pelo calor que vinha da minha mão – ossos e carne pútrida não são quentes – e eu também não sentia frio. Doía de ver, doía de pensar.
Doía uma dor nova também, a de não lembrar.
Eu estou me esquecendo de tudo.
Eu não me lembro de nada.
Quase nada...
Por que me sinto tão vazia?
Deve ser por que eu estou me esquecendo de como é ser humana.
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Uchiha Sasuke só queria saber quem iria à sua casa no meio do nada, longe da cidade, às dez da noite e socar a porta como se fosse bife. Estava muito puto com isso, muito mesmo. A ponto de querer cometer um homicídio do ser que havia praticamente lhe tirado da cama e feito sua mulher ficar assustada lá em cima. Desceu as escadas resmungando e pisando com força. Iria mandar o indivíduo que estava atrapalhando seu sono. Abriu a porta com rudeza e logo falou:
- O que você... – Suas palavras morreram. Ele deve ter ficado gelado da alma pra fora quando viu novamente aqueles cabelos ruivos. Pensou ter dado a luz pela orelha¹ de tão estupefato que ficou – Ka - Karin? – Estava realmente surpreso com isso. Infernos, ela estava morta! Como ela conseguiu sair viva daquele lugar, naquela temperatura? Nada fazia sentido, nada - Como...? Não, espera...!
- Tudo aquilo são águas passadas, não é? Virei delegada daqui do condado de Cheshire² algum tempo depois. Posso entrar? Eu preciso falar com você...
Demorou um pouco para assimilar as palavras dela, mas mesmo em choque, deixou-a passar. Estava realmente frio ali fora e parecia que ela não sentia. Tudo bem, nem ele estava entendendo direito nada, aquilo tudo parecia ter surgido simplesmente... Do nada! Era melhor ele perguntar a ela do quê ficar se perguntando e não saindo do lugar.
- Sente-se...
- Obrigada.
Olhou pra ela como se quisesse ter certeza de que estava acordado. Tinha os mesmos cabelos, o mesmo tom de pele, os mesmos óculos de armação quadrada. Era ela mesma.
- Não sei se você soube, mas está acontecendo uma série de assassinatos e todas as vítimas são seus amigos...
- Seus também.
- Não mais.
Um silêncio desconfortável surgiu, mas nenhum dos dois pareceram preocupados com isso.
- Você soube da vítima mais recente?
- Se não estou enganado, foi o Shikamaru não é?
- Não... – Ela abriu o casaco e tirou um envelope marrom e entregou a ele -... Foi o Suigetsu. Se você não tem estômago forte, sugiro que não veja.
- Suigetsu? Como... – Abriu o envelope e viu as fotos. Era medonho. Seja o que for que o matou, deveria ter muito sangue-frio pra fazê-lo. A carta que ele havia escrito, suas palavras... Tudo passou como um tufão em sua mente. "Tem alguém perseguindo seus amigos pra chegar até você." Foi o que ele tinha escrito. Oh, Deus. Então era verdade? – Ele havia mandado uma carta sobre isso há um mês, mais ou menos. Ele estava desconfiando exatamente disso.
- Acha que ele sabia a identidade do assassino?
- Sinceramente? Não sei mais de nada.
Era extremamente estranho ficar de frente a uma pessoa que você julgou como morta durante anos. Era muito estranho mesmo. Sentia como se ela não pudesse estar nesse lugar.
- Sou considerado o principal suspeito, suponho?
- Correto, mas é por outro motivo. E você também é suspeito do desaparecimento de Mitsashi Tenten.
- Tenten desapareceu?
- Há um mês... Hinata não sabe?
- Hinata havia mandado uma carta pra ela há duas semanas. Ela queria saber como estava depois da morte do Neji.
- É bom começar a perder as esperanças, por que nesse momento ela deve estar morta também.
- Como você sabe?
- Se o assassino fez sushi de Suigetsu, churrasco de Shikamaru, lançamento de Gaara, picadinho de Ino e Neji, com ela não deve ter sido diferente.
E ela estava certa.
- Mas por que outro motivo eu sou o principal suspeito?
Ela suspirou lentamente. Abriu o casaco e tirou um segundo envelope, mas este era branco, como se fosse uma carta. Mas havia sangue nele.
- Essa carta foi encontrada junto ao corpo de Suigetsu. Leia, por favor.
Ela estendeu a carta pra ele, e Sasuke ficou imaginando o que poderia estar escrito nela para que ele fosse o principal suspeito. Observou que tanto o envelope quanto a carta pareciam ser antigos por causa do leve amarelado do papel. Virou o envelope e na parte da frente havia escrito:
"Para Sasuke."
Era uma letra feminina, era óbvio. Era delicada e bem desenhada. Decidiu ler de uma vez aquilo. Abriu o envelope, desdobrou a carta e leu.
"Não sei se te amo ou te odeio. Acho que não posso fazer ambos ao mesmo tempo, mas é isso que sinto. Você foi aquele a quem eu me entreguei de corpo e alma e mesmo toda a devoção que eu tinha não serviu para nada, afinal. Não fui boa o suficiente? O que mais você queria de mim? Te dei meu corpo, minha alma, meu coração... Você levou tudo o que há de bom em mim! Como pôde virar as costas depois de tudo que eu fiz por você? Eu te odeio por isso, mas também te amo. Estou escrevendo isso por não saber se vou sair viva dessa loucura. Com certeza não, mas eu não ligo mais, já perdi tudo mesmo. Por que você me roubou de mim?
Não importa aonde esse caminho vai me levar, ele não vai ter volta mesmo. Se eu morrer, quero que saiba que foi por você que eu passei acordada muitas noites da minha vida miserável chorando e pedindo por um pouco de sua atenção, que foi por você que eu fiz o que fiz, e que foi por você que eu morri. Quero que quando for dormir, meu fantasma te assombre e não te deixe em paz. Eu irei sempre atrás de você, Sasuke. Seja nos seus piores pesadelos, ou reencarnando para ir até você. Serei sua cruz, sua sina e seu carma. Por toda a eternidade.
Daquela que mais te amou e mais te odiou,
Sakura."
- Foi escrita no dia que aquilo aconteceu, essa carta deve ter uns cinco anos, por ai. – A voz de Karin soou como um despertador para sua mente que estava dopada com o que leu.
Dessa vez, o silêncio tinha um peso maior. Ele não sabia o que pensar, nem o que deveria fazer, muito menos o que dizer. Sua mente estava em branco. Ele havia perdido a noção do tempo, então não sabia quanto tempo havia ficado relendo aquela carta – muito menos quantas vezes a releu -. Estava atônito.
- Eu tenho que ir... – Olhou para ela e entregou a carta, ainda meio perdido. As coisas estavam acontecendo muito rápido para seu raciocínio acompanhar.
Ele a levou até a porta e quando abriu o vento frio lhe deu um choque térmico que o fez se arrepiar. Sasuke queria falar alguma coisa pra ela, mas nada saía de sua garganta.
- Até um dia, quem sabe. – E foi andando, andando, andando. Até que sumiu. Quando fechou a porta, sua mente ainda estava vazia.
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Não era isso que eu queria? Mandar todos eles para o Inferno? Não entendo... Devo estar ficando muito tempo com os humanos. Por que agora, quando estou quase conseguindo tudo o que sempre arquitetei por anos, parece estar desmoronando dentro de mim? Estou ficando emotiva demais, até fiquei me lamentando com a morte deles.
Estou passando a me perguntar se era isso mesmo que eu queria, se tomei a decisão certa... Eu deveria ter aceitado aquele contrato?
Será que eu... Me arrependi? Logo agora, depois de tudo? Não, não posso. Não tenho mais escolha, não mais. Por que meu ódio está sumindo? Eu não posso terminar assim! Eu tenho que continuar, matar todos eles, todos...
"Você vai se atrasar, anda logo criatura!"
"Ah, dá logo um abraço aqui!"
"Seremos sempre amigas, não é?"
"Eu te amo..."
Senti uma súbita vontade de chorar.
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"Uma vez feito, nunca mais poderá voltar atrás. Você poderá se vingar de quem atormenta teu sono, quem dilacera seu peito e mata seu espírito. Você poderá voltar à vida, mas por pouco tempo. Depois de feito, sua alma pertencerá para todo o sempre ao mundo dos mortos. Seu trabalho será único e perene. Você perderá o direito de reencarnar e tu serás a guardiã das almas que já completaram sua jornada, guarde-as com carinho. Aquela jornada que você nunca irá poder fazer. A escolha é sua"
E depois, só restara esse vazio.
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¹ - Isso que dá conversar com a Aiko enquanto digita o capítulo. Só sai merda. XD
² - Foi no condado de Cheshire que Lewis Carroll nasceu. Maldito vício. ._.
Nihil – ''Nada'' em latim. :3
N/a: A atualização mais rápida do mundo, HÁ.
Povo, eu vou querer que vocês mandem o nome da personagem que vocês acham que é a Enma, depois de mandado, ele não poderá ser desfeito, okay? Mandem por que estamos próximos de saber quem é que se esconde sobre o pseudônimo de Enma. :D
Lembrando, aqueles que acertarem ganharão uma oneshot. Todos ganharão, sim? :)
Reviews para uma autora mais feliz. *-*