Disclamer: Todo mundo já sabe mas não custa nada repetir. Saint Seyia e seus personagens não me pertencem e este texto não tem fins lucrativos.

Agradecimentos Especiais: Áries Sin, 1. por ter me ajudado a desempacar este capítulo e 2. por tê-lo betado. Amiga muito obrigada mesmo.

Agora... sem mais delongas, boas risadas, digo, boa leitura.


Estou eu cá de volta a relatar a minha convalescença. Uma história como essa precisa ser contada, para que pelo menos outras pessoas possam se divertir com ela. Afinal garanto que nós não nos divertimos nem um pouquinho.

Vou começar por descrever a partir de nossa volta para casa. Como já disse fui entrevistado à saída do hospital. Reclamei da saúde pública, da omissão do governo, do despreparo do sistema de saúde, da natureza que nos brindou com tal "bichinho"... Confesso que não foi agradável tamanha exposição, mas espero ter conseguido ser o porta-voz de tudo que está engasgado na garganta de cada morador desta cidade.

Fui novamente colocado dentro do carro. Anotação mental 2: "trocar de carro tão logo saia da cama. Como não gastei dinheiro nas férias, posso me dar ao luxo de trocar aquela lata velha desconfortável".

O trajeto até minha casa pareceu uma viagem de trem fantasma. A cada buraco que passávamos, que não eram poucos, eu gemia. Agora sei como se sente uma carne moída. Camus foi um amor, mas ele era o único ser vivente perto de mim. Minha ira acabou por recair sobre ele.

- Onde você aprendeu a dirigir? Na escola de circo? Pára de catar todos os buracos desse inferno! Eu estou doente, cassete! Tudo me dói!

Camus apenas resmungava algo tipo: "A culpa não é minha. Relaxa."

Eu nada ouvia, continuando a reclamar. Aos poucos conseguia minar o humor de meu marido, que nunca foi exatamente dos melhores, até ao momento que veio o primeiro estresse.

- Milo! Ou você cala essa porra dessa boca ou te deixo na casa da sua mãe!

A ameaça foi séria! Ser abandonado doente à mercê de minha mãe e meu irmão era uma visão mais aterradora do que as filas de todos os hospitais pelos quais passamos. Mantive-me em silêncio, apenas gemendo baixo a cada solavanco. Chegamos finalmente ao edifício onde Mu e Shaka entraram logo após nossa passagem. Estacionaram no espaço reservado para visitantes e prontamente se propuseram a ajudar um casmurro Camus a me tirar do carro. Quando chegamos ao hall dos elevadores, percebemos que estes ainda não haviam sido consertados.

Eu chorei… Um homem do meu tamanho, só de pensar na quantidade de degraus, começou a chorar como um bebê.

- Eu não tenho condições de chegar em casa.

Camus bufou e proferiu uma série de palavras que não sei bem o que eram e era melhor não saber, porque certamente não eram agradáveis ou educadas. Calculou mentalmente a quantidade de degraus e chegou a mesma conclusão que eu.

- Ele não tem condições de chegar em casa e nós não temos condições de levá-lo.

Jogaram-me sobre o sofá do hall de entrada, enquanto eu continuava a chorar. Era incontrolável. A dor em minha cabeça e em todas as uniões ósseas de meu corpo me enlouqueciam! Eu só queria me deitar e esquecer da minha própria existência. Eu definitivamente estava reduzido a subnitrato de coco de cavalo de bandido de filme mexicano de quinta categoria. Ouvi vozes exaltadas no interfone, mas não dei muita atenção naquele momento. Só mais tarde Mu me contou a "conversinha" de Camus com o síndico.

- Sr. Maia, quando esses elevadores vão ser consertados?

- Não vão ser, até que tenhamos dinheiro em caixa, o índice de inadimplência está alto.

- Eu não quero saber, isso não é problema meu. Pagamos todos os nossos compromissos em dia e um dos direitos que nos assiste é ter ao menos um elevador que funcione nessa pocilga!

- Vocês são jovens, saudáveis, ainda estou colaborando com a forma física de vocês. Não sei do que está reclamando.

Nesse momento Camus mudou de cor. Shaka começou a abanar o amigo e Mu quis tomar o interfone das mãos de Camus, mas este não permitiu.

- Pois bem sr. Maia, estou com Milo aqui embaixo, com dengue, queimando em febre. Preciso colocá-lo na cama para repouso absoluto, caso contrário ele pode vir a ter uma complicação ainda maior. Não tenho como carregá-lo no colo dez andares: se eu pudesse o faria, mas não sou o super-homem! Nós iremos agora para um hotel 5 estrelas e a conta será enviada para o condomínio. Meu advogado que se encontra aqui do meu lado já está tomando as devidas providências. Agradeço a sua prestativa colaboração.

Bom... mais uma vez fui colocado dentro do carro.

Mu fez uma série de contatos e um quarto de hotel foi reservado em nosso nome com faturamento para o condomínio. Não era a minha cama, mas era uma cama limpa e confortável. Até que a quebra do elevador não foi de todo ruim… Camus preparou-me um banho de imersão que, além de baixar um pouco a febre, a água morna e a hidromassagem aliviaram um pouco as dores nas juntas. Deitei-me e dormi.

Não sei por quanto tempo fiquei adormecido, mas acordei batendo queixos. O quarto estava escuro, Camus encontrava-se adormecido a meu lado. Me encolhi sob seu corpo procurando por calor, apesar do pesados edredons que me cobriam. Meu amado acordou sobressaltado quando minha pele quente o tocou.

- Milô, mon Dieu, você está com febre novamente! Vou pegar um remédio.

Eu não agüentava olhar mais para os comprimidos de paracetamol! Minha boca tinha um gosto de cabo de guarda-chuva velho. Eu sentia sede.

- Camus, você poderia me dar um pouco de água? – pedi quase sussurrando. Não estava fazendo drama, apenas não queria esforçar-me para falar mais alto.

Ele me trouxe o comprimido e um copo de água. Dei apenas alguns goles e meu estômago ficou mais embrulhado que brinquedo em época de natal. Levantei-me o mais rapidamente que consegui e "corri" em direção ao banheiro, mas não sem antes tropeçar nas coisas: afinal era um local completamente estranho para mim. Tentei colocar algo para fora, mas não tinha nada em meu estômago, além da sede permaner e o gosto ruim na boca ir aumentando. Resolvi apelar. Enchi novamente o copo com água e coloquei várias colheradas de açúcar. Bebi com prazer, o que fez Camus olhar para mim abismado, não entendendo nada.

- Acho que estou vendo coisas... Você bebendo água com açúcar? Não entendi…

- Estou com um gosto horrível na boca e morrendo de sede. Resolvi apelar e funcionou!

- Acho que isso tudo está afetando é o seu cérebro que nunca foi muito bom mesmo.

- Não fale assim do seu escorpiãozinho de estimação dodói.

Camus revirou os olhos. Milo em seu pior humor negro estava de volta, com a corda toda e ele não podia maltratá-lo como costumava fazer nesses casos. Meu humor, apesar da febre e do cansaço por sei lá o que, não estava dos piores. Já voltara até mesmo a gracejar. Sabem aquela velha história "se não pode com eles, junte-se a eles."? Pois é, este é o caso. Não tinha outro jeito. Eu estava doente, tinha de ficar de cama, as dores e a febre só passariam a seu tempo, por mais que eu quisesse que terminassem antes, ou que nunca tivessem começado.

- Milo, você está se aproveitando de mim porque está doente…

- Pelo menos alguma vantagem o fato de estar mais arrasado que noiva abandonada no altar eu tinha de ter, não?

Camus colocou a mão na cabeça. Ainda estava na dúvida do que era pior: aturar Milo doente resmungando como uma velha esclerosada, ou aturar Milo fazendo piadas infames. Olhou para o relógio que marcava três e meia da madrugada. Não teria de trabalhar no dia seguinte, mas o dia anterior fora duro o suficiente para deixá-lo exausto.

- Milô, não sei quanto a você, mas eu estou morto. Vou dormir.

- Não sabe quanto a mim? Se você está morto eu só posso estar em avançado estado de decomposição! Vamos nos deitar.

Camus deitou-se, acomodou-se, fechou os olhos e dormiu imediatamente. Eu ainda demorei algum tempo para conciliar o sono. As dores pelo corpo continuavam a incomodar, a febre começava a baixar pelo efeito do remédio, o que me fazia começar a suar. É irritante. Acomodei meu corpo próximo ao de Camus. A simples presença dele era suficiente para me fazer melhor. Eu sabia que naquele dia, em poucas horas, eu tornara a vida dele um inferno. Mas assim é o amor. O padres não dizem "na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, até que a morte nos separe"? Bom, nós escolhemos partilhar a vida juntos, e não foi por arroubo de paixão: afinal nos conhecemos desde sempre. Beijei suavemente a face adormecida... É, meu amor… você vai ter que me engolir.