Disclaimer: As referências não me pertencem, mas o soldado é meu.

Soldado

"I got no one to send a letter to
Would you mind if I sent one back here to you"

O dia estava ensolarado, mas não havia ninguém na rua. Estava quente e abafado, mas ninguém se arriscava a abrir a janela. Ninguém esperava que um vizinho ou um amigo batesse na porta, eles não viriam. Ele também não bateria, todos sabiam, ele invadia.

A casa estava praticamente vazia com alguns móveis espalhados pelos quartos. Vários jornais velhos estavam jogados na mesa da cozinha servindo como apoio para as garrafas de vinho e de vodca. Um cigarro estava apagado em um pote azul, mas o cheiro da sua fumaça estava ainda muito forte.

Telegramas jogados pelo chão diziam tanto quanto os jornais; nada. O terror e o pânico disseminados pelo ar falavam mais. Mesmo fechando as cortinas, trancando as portas e tapando a lareira, o medo invadia os lares e não havia como escapar.

Muitos haviam partido, dado suas costas para suas casas e ido sem esperança de voltar. Estes eram os corajosos. A razão para ir não importava, mas a vontade de vencer era essencial. Não escapavam, no entanto, enfrentavam.

Ela ficara e não se arrependia. Não era uma Grifinória enlouquecida. Escondia-se entre os lençóis e andava nas pontas do pé. Mesmo nos braços de Charles, seu namorado, seu coração não batia menos rápido e seus olhos não conseguiam fechar por dois segundos em paz e segurança.

As únicas vezes que sorria (e sorria por pouco tempo para que não a vissem) era quando recebia uma carta dele, do seu corajoso soldado. Chamava de "seu" o soldado, mas não sabia seu nome. Lembrava-se da voz dele quando pediu se podia mandar-lhe cartas, era de medo. Não tinha para quem mandá-las, disse. E ela aceitou, afinal, não tinha de quem receber cartas.

As cartas eram curtas, mas ela aprendeu aos poucos sobre suas esperanças - as poucas que restavam, isto é – seus medos e sonhos. A letra dele era bonita e ela não conseguia evitar as lágrimas que escorriam. Eram lágrimas pelo que fora, por Charles, por ela mesma, pelo seu soldado, pelo futuro que viria destroçado.

Ela sonhava, de vez em quando, durante o dia – as noites serviam para as orações e para o desespero – sobre os olhos cinzentos de seu soldado. Ele voltaria algum dia?, perguntava-se, embora soubesse a resposta.

Terça feira, quarta feira, quinta... passaram e nenhuma carta chegou com o leve cheiro de couro e morte que lhe era tão precioso. Em épocas como aquela, tudo era razão de desconfiança e pessimismo.

Estava chovendo levemente, acalmando o calor devastador do fim de agosto. Ele, o seu soldado, havia partido em mais uma viagem. Mas dessa vez levava apenas sua coragem; era o que lhe restava.

Ela ficaria para trás até que parasse a chuva e ela pudesse abrir as portas e janelas e respirar com segurança. O terror teria se dissipado, os covardes estariam alegres e os corajosos marcados – de mais formas do que se poderia imaginar.

Ele havia partido sem marcas, apesar de sua coragem, deixando para trás uma mulher com um coração rachado e cartas manchadas.

º º º

A/N: Uma oneshot sobre a primeira guerra. Note as referências as marcas, a Setembro, etc. Inspirado em "Travelling Soldier", das Dixie Chicks. Vale a pena baixar. Pensei um pouco no Sirius quando eu escrevi, embora ele não tenha morrido. Alguma idéia de quem possa ter sido o soldado? Review?