VENOM
N/a: Esta era para ser uma song, mas ficou comprida demais, então foi dividida em três partes, embora a música continue, dividida, cada pedaço na parte que lhe serve... A música chama What hurts the most, do Rascall Flatts, que eu descaradamente roubei de um vídeo sobre outro shipper. Eu não resisti.
Eu preciso agradecer a Sweet, amiga amada, que betou esse fic pra mim, e que acertou o tom dela, me ajudou a resolver problemas e a pensar no caminho certo! Valeu muito, muito, muuito!!! Nunca mais largo do teu pé!
E a Paty, amiga que não tinha lido Harry Potter antes de eu fazer ela ler as minhas fics e que foi quem teve a idéia final desta. Valeu mesmo Paty, pelas idéias trágicas depois das caminhadas!
Era isso, espero que gostem! E, claro, se gostarem, coments! Se não gostarem, coments também, pra eu saber se posso dar um jeito e melhorar! Beijos!
Disclaimer: O Harry não é meu, nem o Draco (infelizmente), nem nenhuma dos outros. São todinhos da J.K. A música também não é minha!!
CAPÍTULO I
I can take the rain on the roof of this empty house, that don't bother me
(eu posso agüentar a chuva sobre o telhado desta casa vazia, isso não me incomoda)
I can take a few tears now and then and just let them out
(eu posso agüentar umas poucas lágrimas às vezes e só deixa-las sair)
I'm not afraid to cry
(eu não tenho medo de chorar)
Every once in a while even though going on with you gone still upsets me
(de vez em quando embora continuar sem você ainda me entristeça)
There are days
(há dias)
Every now and again i pretend I'm okay but that's not what gets me
(freqüentemente que eu finjo que estou bem, mas não é isso que me aflige)
Sangue.
A chuva caía, mas ela ainda sentia o cheiro de sangue.
Estava a sua volta, espalhando-se pelo chão e cobrindo os feridos na batalha. Batalha que para ela e seus companheiros sobreviventes, seria a última. Agora suas vidas seriam continuadas, de onde haviam parado antes daquela loucura.
No entanto, para ele, foi seu último ato.
E, provavelmente, o único em sua vida que não visou benefício próprio...
Para quantos mais havia sido aquela a última luta?
O vento soprou mais forte, fazendo a chuva atingir de forma dolorida o seu rosto. Seus cabelos encharcados chicoteavam a sua pele que ardia, mas, ainda assim, ela não se levantava.
Fitava o rosto agora imóvel. Via o vento brincar com os cabelos dele, assim como com os seus.
Mas sabia que ele não sentia a ardência. Não se importaria com a dor. Não repugnaria o cheiro, porque ele já não estava ali.
Restava a casca.
Olhou em volta mais uma vez e viu o cemitério trouxa onde seus amigos ajudavam-se mutuamente. A cada lápide branca e fria ela via uma marca. Vestígios de feitiços que nem a força da chuva apagaria. O local mal iluminado e lúgubre enchia-se aos poucos com os aurores do Ministério aparatando em grande número.
Como sempre, tarde demais.
Baixou os olhos mais uma vez.
Por incrível que fosse, ela não chorava. Aquele tipo de dor lhe era tão estranha que ela não conseguia expressa-la em lágrimas.
Admirou a pele pálida. O traço delicado da boca. Os longos cílios sobre as pálpebras fechadas que escondiam os olhos cinzas que nunca mais se abririam. Nunca mais olhariam para ela com desdém ou desejo. Os cabelos loiro claros dançavam com a chuva e ela se deixava ficar a observa-los.
Ele se fora e não havia volta. Ele agora era menos que nada, seria apenas uma lembrança.
A lembrança de uma noite que mudou suas escolhas.
Uma noite que causou a sua morte.
Finalmente as lágrimas vieram.
Não fartas, nem rápidas.
Lentas.
Poucas.
Contínuas.
Lágrimas pelo que poderia ter sido, e não foi. Pelo que teria acontecido e não aconteceu.
Lágrimas pela saudade do que não era, mas que faria falta.
E pensar que fora apenas há três meses atrás.
...Parecia uma outra vida.
What hurts the most, was being so close
(o que mais machuca, foi estar tão perto)
And having so much to say
(e ter tanto a dizer)
And watching you walk away
(e assistir você ir embora)
Never knowing what could have been
(nunca saber o que poderia ter sido)
And not seeing that loving you
(e não ver que amar você)
Is what I was trying to do
(é o que eu estava tentando fazer)
Draco Malfoy era um Comensal da Morte. O que havia feito ele procurar a Ordem da Fênix e oferecer-se como espião, ninguém sabia ao certo. Mas muitos supunham que era apenas para salvar a própria pele.
O papel de agente duplo lhe cabia perfeitamente e, apesar dos riscos, ele só tinha a ganhar. Entretanto, depois do episódio com Severus Snape, todos estavam mais cautelosos e a confiança que depositavam no jovem Malfoy era bastante restrita.
Suas missões até então, tinham como único propósito o leva-e-traz habitual de informações não muito relevantes. Garantia sua posição de informante, sem se comprometer em demasia com os Comensais. Embora fosse desprezado como tal.
Isso porque Draco, apesar de talentoso como bruxo, era deficiente como Comensal. Não tinha a capacidade de matar e mesmo que pronunciasse "Avada Kedrava" milhares de vezes, a maldição não surtia efeito.
Matar era um dom, e Draco não o possuía.
Mas houve uma exceção em suas missões.
Harry Potter, que agora liderava a Ordem, buscava a última Horcrux, a última barreira que ainda se interpunha entre ele e Voldemort.
Malfoy, por descuido de alguns companheiros, que o consideravam um garoto fraco, soube que o Lord das Trevas enviaria dois homens de confiança para resgata-la.
A Ordem precisava da relíquia, a varinha de Ravenclaw.
Draco sabia a quem seguir e como faze-lo.
Assim, restava a Harry encontrar voluntários para a missão. Não queria enviar nenhum dos membros mais velhos, para que o rapaz não se sentisse intimidado, mas não confiava nele o suficiente para deixa-lo ir sozinho ou com apenas um companheiro.
Ronald Weasley não estava plenamente recuperado de sua última missão. Entre os voluntários, lhe restavam somente Ginevra Weasley e Hermione Granger. Ambas talentosas e excelentes bruxas. Esforçando-se para deixar seu coração de lado, Harry enviou os três para a missão.
Os primeiros dias de viagem seguindo os Comensais foram mais difíceis que o esperado. As jovens não pareciam dispostas a conversar com o antigo inimigo de escola e pareciam contrariadas a conversar entre si enquanto ele estivesse ali, tornando as longas horas de convivência forçada um verdadeiro tormento.
Ao fim do quarto dia, chegaram ao local que parecia ser seu objetivo.
O mesmo esconderijo dos gigantes, sobre o qual Hermione ouvira Hagrid contar há cinco anos atrás, revelava ser a localização do sexto e último pedaço perdido da alma de Lord Voldemort. Um acordo com os gigantes garantia a proteção adicional ao objeto, embora eles não fizessem idéia de que estavam guardando alguma coisa.
O acesso à varinha ainda era um mistério para as garotas. Por sugestão de Malfoy, instalaram-se em uma caverna quando a tarde chegou.
O lugar era amplo, e mal iluminado. Sua entrada, não era mais do que um buraco dentre tantos em meio às vastas montanhas.
Durante o tempo que antecedeu à expedição, os três colheram o maior número possível de informações sobre a área, possibilitando a escolha cuidadosa do local do acampamento, para que a entrada fosse de difícil percepção, possibilitando que acendessem uma fogueira, já que não sabiam por quanto tempo teriam que ficar ali, aguardando o momento oportuno para pegarem a Horcrux.
Os Comensais precisavam primeiro manter contato com os gigantes, para não levantarem suspeitas. Deveriam pegar a Horcrux sem que estes percebessem seu verdadeiro objetivo. Supostamente, esta era apenas uma visita diplomática, com a qual o Lord das Trevas estaria agraciando seus preciosos aliados.
A instalação no acampamento provisório consumiu boa parte da tarde. O verão estava no fim, o ambiente estava frio e úmido.
Malfoy foi vigiar os arredores para ver a localização exata do acampamento dos Comensais. Ginny começou a preparar os lugares onde iriam dormir, e Hermione acendeu uma fogueira, tudo sem auxílio de magia. Era um risco enorme utilizar-se de qualquer feitiço que pudesse denunciar sua posição aos Comensais ou seus aliados.
Levaria tempo para que o fogo realmente aquecesse algo, mas as duas foram atraídas para ele como um imã. Naqueles tempos sombrios, qualquer tipo de luz era bem vinda.
O silêncio pesou sobre elas durante alguns momentos até que Draco retornou à caverna. Agora precisavam concentrar seus esforços em seu maior objetivo: a última Horcrux.
- E então, Malfoy? Conseguiu descobrir mais sobre onde eles estão?
- É como eu imaginava. Rookwood e Nott estão acampados próximo ao esconderijo, não junto a ele. Eu vi o local, mas não pude chegar muito perto.
- Medo, Malfoy? Que seus companheiros o vissem fazendo algo que preste? – alfinetou a ruiva.
- Não, Weasley. – ele disse com desprezo.- Não me aproximei para não botar a perder esta missão. Eu tenho a Marca Negra. Mágicas poderosas como esta deixam vestígios. A presença de uma Marca é sentida por outros Comensais.- ele fez uma pausa- E esse será um grande problema.
- Por que, Malfoy? – indagou Hermione.
- O esconderijo da Horcrux é incrivelmente desprotegido. –continuou, como se não tivesse havido interrupção, deixando Hermione irritada –Os feitiços defensivos em volta dele deixam pouca presença, o que significa que não são fortes. Além do mais, boa parte deles já foram desfeitos pelos Comensais. O que me fez pensar que o principal deles está na própria varinha, que eu não gosto nem de imaginar o que será. O restante um de nós pode dar conta sozinho. –ele respirou fundo, como se tomasse fôlego –O verdadeiro problema é passarmos desapercebidos pelos dois. E isso tem que ser feito hoje à noite. Amanhã, talvez, eles deixem os gigantes.
- Então não vejo razão para seu comentário, Malfoy. Qual é o problema com a Marca Negra?
- Se não tivesse me interrompido, já saberia, Granger. Nós dois não temos como nos aproximar do acampamento deles. A minha Marca Negra seria percebida. E você, Granger, é uma sangue-ruim. E Comensais sentem isso tão forte quanto à presença da Marca.
Hermione contraiu a expressão demonstrando contrariedade, mas ela sabia que era verdade. Já havia estudado e lido muito sobre aquilo. Mas isso não impediu que ficasse brava.
- E o que faremos, então? Desistimos?
- Claro que não. – exclamou a ruiva. – Eu vou. Não tenho a Marca e sou sangue puro. Como Malfoy disse, um de nós pode contornar os feitiços sozinho e, se a magia maior está mesmo na varinha, só um poderia alcança-la de qualquer forma. E nem tente me deter, Hermione. –acrescentou, ao ver a amiga abrir a boca –Você sabe que eu não vou mudar de idéia.
A morena calou-se, mas ainda fitava Ginny com preocupação.
- Eu também acho que você pode lidar com isso sozinha. – disse Draco, fazendo a ruiva levantar as sobrancelhas em surpresa.
- Isso foi um elogio, Malfoy?- perguntou, zombando.
- Não. Foi uma constatação, Weasley. Você é pobre, mas não parece desprovida de inteligência. – replicou o loro, friamente. –Já disse que os feitiços são fracos. –ele sorriu com leve desdém –O Potter não vai gostar disso.
- O Potter já fez as escolhas dele. Agora eu faço a minha. –disse Ginny, ainda mais gelada.
- Toquei em alguma ferida? –alfinetou Malfoy.
Ginevra levantou-se da pedra onde estava sentada e deu um passo em direção ao loiro, que a encarava, como que divertido.
- Chega! –exclamou Hermione, fazendo Ginny estacar e desistir de responder e Draco alargar o sorriso. – Temos que elaborar um plano de ação e tentar identificar as possíveis situações de risco até o anoitecer. O nosso tempo é escasso, então não vamos desperdiça-lo com briguinhas infantis.
Ginny corou levemente, e sentou-se de novo. Draco olhou para Hermione com o rosto impassível, mas por dentro sentia admiração.
A mulher era forte, pensou. Poucas coisas a abalavam, embora se inflamasse demais ao defender suas convicções e isso fazia ele sentir uma espécie de atração indefinível. Sem querer, ele se pôs a imaginar como seria se ela baixasse a guarda. Não era a primeira vez que ele tinha esse tipo de pensamento. Hermione era atraente e se sentia atraída por ele, ele podia dizer pelo olhar dela. Analisando friamente, ela não era linda. Mas havia algo que o atraia.
Sempre havia tido.
Os constantes lembretes na escola de que ela era uma sangue-ruim eram a maior prova disso.
E a tensão crescente entre os dois durante os poucos momentos que passavam juntos na sede não deixava a situação de conviverem tanto tempo próximos melhor.
- Malfoy! –ele ouviu seu nome ser chamado com irritação.
- O que foi, Granger? –perguntou, despertando de seu devaneio.
- Eu perguntei quais os feitiços você pensa que eles ainda não desfizeram? Quais imagina que possam ter sido usados? Pode responder, ou está tão aliviado de não ter que arriscar a própria pele que perdeu a fala?
Ela perguntou, sarcástica.
Ele respondeu, impassível.
- Por incrível que possa parecer, Granger, há pessoas que pensam antes de falar. Eu estava considerando a pergunta.
Ela sabia que ele estava mentindo. Sabia que o loiro não estava prestando atenção. Assim como sabia que ele dissimulava isso perfeitamente.
Essa era a qualidade que ela mais admirava nele. Provavelmente a única, ela pensou.
Sempre frio.
Sempre dono de si.
Ela sentia a tensão que havia entre eles, quase que por instinto. Uma espécie de atração.
E ela não podia negar que não era unilateral.
Mas conhecia o absurdo da situação. Eles eram opostos, sempre haviam sido.
E isso não iria mudar agora.
Mas ainda assim lhe era impossível negar a tensão, o desejo.
Minutos sozinhos na cozinha da Ordem já eram suficientes para faze-los esquecer de quem eram.
Que ele poderia ser um traidor desprezível e pretensioso.
Que ela era uma sangue-ruim, de raça inferior.
Continham-se apenas porque algum companheiro aparecia para salva-los de si mesmos.
Impossível negar que ele não era mais o menino pálido e franzino da escola.
Agora ele tinha um ar mais misterioso que arrogante. Que seu corpo era de um homem, e não de um garoto. Acompanhado de um olhar decido e firme. Conseguindo dissimular seus medos através do ar frio. Por mais de uma vez já tinham chegado quase ao limite de suas vontades,
Assim como só um cego não veria que a morena tornara-se bela de corpo e que nem mesmo as roupas despretensiosas e o rosto sem maquiagem conseguiam desfavorece-la. Conservava a mesma inteligência afiada da escola, mas sem a mesma ansiedade, o que lhe conferia um charme que ultrapassava a aparência.
Desviando-se desses pensamentos, durante as próximas horas, tudo que ocupou a mente dos três foi dar a melhor preparação que Ginny pudesse ter. Hermione estava visivelmente abalada.
Conhecia a ruiva desde o primeiro ano dela em Hogwarts. Considerava-a uma irmã mais nova e ao longo dos anos acostumara-se a ter uma atitude protetora em relação a ela.
Entretanto, desde que Hogwarts fora fechada, há um ano e meio atrás, a caçula Weasley recusava-as a continuar com aquela situação. Alistara-se na Ordem e voluntariava-se para as missões mais perigosas, como que para provar a Harry que estava a altura dele.
Ele terminara o namoro para protege-la.
Ela arriscava-se por não ter ninguém que pudesse impedi-la.
Agora, Ginevra era um dos membros mais ativos da Ordem. E, naquela missão, mais do que nunca, indispensável.
Ginny estava silenciosa há alguns minutos vendo o sol se pôr. Já recebera todas as instruções possíveis de Malfoy sobre os Comensais. Todas as indicações de Hermione sobre situações de risco.
Agora, restava aguardar.
- Está tudo bem, Ginny?
A morena perguntou, afagando o braço da amiga e pondo-se ao seu lado. A ruiva sorriu.
- Já estive melhor... Mas não se preocupe. Pela manhã eu estarei aqui de volta, inteira. –completou, botando a mão sobre a da amiga.
- É, não vá me deixar aqui, só com o Malfoy.
Mione brincou, sorrindo de volta. Ginny sorriu de maneira maliciosa.
Malfoy, aproximou-se das duas.
- É bom você ir, Weasley. Antes que fique escuro demais e você não consiga ver o caminho até lá embaixo.
- É, eu sei.
Ginny suspirou. Virou-se e deu um forte abraço em Hermione. Pegou sua mochila e saiu.
- Cuide-se. – disse Hermione.
- É, Weasley, e boa sorte. – complementou Draco.
Ela acenou com a cabeça e começou seu caminho, desaparecendo rapidamente.
Os dois voltaram para perto da fogueira e sentaram-se lado a lado. Ele era um traidor, ela, uma sangue-ruim, mas há horas em que o calor humano é insubstituível. Mesmo vindo de alguém que você pensa odiar.
Os minutos arrastavam-se lentamente e o silêncio era quase palpável. O relógio indicava que fora há apenas duas horas que Ginny saíra.
Ela teria que ficar escondida, na base da montanha, até o que o sol começasse a surgir devido ao perigoso caminho que levava à caverna em que eles estavam. Mesmo que já estivesse com a Horcrux, teria simplesmente que aguardar. A pressa poderia acarretar um ferimento grave ou a perda do objeto, ambos incorrendo na falha da missão.
Hermione observava o fogo quase imóvel.
Era óbvia a preocupação e a angústia estampadas no rosto da jovem. Draco a observava e, por algum motivo, sentia que precisava conforta-la.
Só não sabia como fazer-lo.
- Olha, Granger, não tem motivo para ficar tão preocupada. A Weasley vai ficar bem. -
Ele tentou, desmanchando o propósito das palavras com o tom levemente irritado da voz.
- Como se você se importasse, Malfoy. Deve estar se preocupando é com seus companheiros Comensais.
Ela queria ofende-lo. Conseguiu.
- Não precisa falar assim comigo, Granger. Eu escolhi um lado. Eu sei que vocês pensam que eu devo estar trabalhando para os dois, mas eu não estou. Eu me dispus a essa missão porque quero que ela tenha sucesso e isso envolve que a Weasley volte com a Horcrux, sã e salva. Por mais difícil que seja de acreditar, eu me importo com a Ordem, ou eu não estaria aqui.
Hermione olhou para Malfoy, surpresa.
Era a primeira vez que ela ouvia aquele tom na voz dele. Não era desdém, irritação ou frieza. Soava mais como ressentimento, tristeza. Pela primeira vez, ela pensou que a vida dele também não era fácil.
A adolescência dela, de Ron, Harry e Ginny já havia escoado há muito tempo. Para eles, não havia as confusões amorosas normais, as brincadeiras e os risos sempre presentes nesta idade.
Eles haviam deixado tudo isso em Hogwarts e agora lutavam por um bem maior, esforçavam-se para permanecerem vivos e adiavam duas vidas para o pós-guerra. Para quando ela acabasse... se eles vencessem.
E naquele momento ela percebeu que para Draco não havia sido muito diferente.
Se houvesse alguma alteração, era para pior. Comensal da Morte, por falta de opção; a mãe morta em batalha; o pai preso em Azkaban. E ele, agente duplo e espião; sem ninguém que confiasse nele. Sua vida em risco a cada decisão que ele tomava.
Tudo isso se abateu sobre Hermione e ela sentiu-se cruel. Olhou para ele, que agora mirava o fogo, aborrecido.
- Desculpa, Draco. Eu acredito que você se importa. –ela disse, com voz fraca.
O loiro notou o uso do seu primeiro nome.
Ela nunca havia feito isso antes. Na verdade, ele sentia falta de ser chamado assim. Desde que sua mãe havia morrido, há quase um ano, ele não recebia esse tratamento. Havia se tornado apenas Malfoy, nada mais. Ele acenou com a cabeça e o silêncio estabeleceu-se novamente. Até que Hermione não agüentou. Precisava saber.
- Por quê?
O loiro a olhou com surpresa, mas entendeu a pergunta dela.
- Porque eu não quero acabar como meus pais. Não quero esses malditos Comensais vençam. Minha mãe foi morta por pensar que Voldemort não iria punir tanto eu e meu pai se ela também ajudasse. Meu pai está em Azkaban por ter lutado com esses desgraçados a vida toda. Se Voldemort vencer, ele será morto como punição pelo fracasso. Se ele perder, vai continuar naquela prisão até o fim da vida. –o loiro fez uma pausa e encarou Hermione, com uma expressão de dor no rosto –Eu não quero acabar assim, Hermione. Eu não quero.
Ela o encarou de volta e, sem pensar, o abraçou.
Ele ficou insensível, no primeiro momento, devido à surpresa, mas então relaxou e a abraçou de volta, apertando-a contra ele.
Draco nunca havia se sentido tão... seguro com alguém. Nem com seu pai, sempre frio; ou sua mãe, sempre hesitante, não querendo deixa-lo fraco; nem mesmo com Pansy, que vivia se pendurando nele, na época da escola.
Ele pressionou-a ainda mais e ela passou a mão pelos cabelos louro platinados dele, que brilhavam com a luz do fogo.
Toda a tensão entre eles aumentando e vindo à tona com aquela proximidade tão bem vinda.
Aproximando seu rosto da curva do pescoço dela, ele inalou seu perfume e, num gesto abrupto, sem planejamento, ele pressionou seus lábios contra os da garota.
Ela não pareceu contrariada e correspondeu, fazendo com que ele aprofundasse mais o beijo.
Passados alguns instantes, Hermione abriu os olhos e levantou-se rápido, como se tivesse tomado um choque.
Colocou-se próxima a uma das paredes rochosas da caverna, encarando a mesma com os braços cruzados, de costas para ele, balançando a cabeça, num gesto de negação.
- Não, Malfoy. Isso não está certo, nós...
Draco a interrompeu, chegando em passos rápidos até ela, virando-a para ele e segurando seus braços ao longo do corpo. Encarou os olhos castanhos da morena, vendo as labaredas dançarem refletidas neles.
- Uma vez na sua vida, Granger, pare de falar e siga seus impulsos. Com essa guerra lá fora, eles são tudo que nós temos.
A voz dele saiu firme, sem desviar o olhar cinza que Hermione encarava sem pestanejar.
Granizo nas chamas.
Ela sabia que o loiro tinha razão. E, por uma vez, deixou-se levar quando ele a tomou nos braços e lentamente a encaminhou para os sacos de dormir que lhes serviriam de cama.
Quando o sentiu em cima dela, beijando-a com um calor que ela jamais julgou possível em alguém com aqueles olhos tão frios, Hermione parou de pensar e deixou que seus impulsos a levassem para junto de Draco, mais próxima do que jamais esteve de outro ser humano.
Algum tempo depois, ambos adormeceram, aninhados um ao outro.
Como se buscassem por segurança e conforto em meio ao vazio que suas vidas haviam se tornado.
O sol tinha acabado de surgir em sua plenitude quando Ginny retornou à caverna. Ela havia aproveitado a luz fraca do amanhecer para chegar ao acampamento.
Assim que entrou no local, tirou a mochila das costas e sentou-se contra a parede, deixando escapar um suspiro de exaustão. Surpresa, pois achou que encontraria a amiga acordada a sua espera, olhou em volta à procura da morena e percebeu que apenas um dos sacos de dormir parecia estar ocupado.
Levantou-se e foi até o fundo do local, preocupada que a castanha pudesse ter saído atrás dela.
Estacando, em choque, ela contemplou a cena que nunca imaginou ver.
Com um dos sacos de dormir por baixo e tendo uma coberta até suas cinturas, jaziam Malfoy e Hermione. Uma das mãos dele passada pelas costas da blusa dela, na altura da cintura e a outra entre os fartos cabelos castanhos, como que a afagando.
Hermione repousava, virada para Draco, com a cabeça apoiada sobre o peito do loiro. Uma das mãos embaixo do próprio rosto, próxima à mão de Malfoy, e a outra segurava a ponta da camisa dele, que estava aberta e havia escorregado para o lado, fazendo o braço da jovem ficar estendido sobre a barriga desnuda dele.
Apreendendo aos poucos as implicações da cena, Ginevra não soube como agir. Deveria fingir que não havia visto nada? Que não tinha percebido? Depois da pior noite da sua vida, ela não tinha emoções restantes para lidar com aquilo.
Naquele momento, Hermione lentamente abriu os olhos e viu a ruiva.
-Ginny! –ela exclamou em um tom aliviado, enquanto levantava rápido e abraçava a amiga.
Apesar da estranheza da situação, Ginny retribuiu o abraço. Tudo que ela mais queria naquele momento era carinho. Deixou seus olhos se fecharem e repousou a cabeça no ombro de Hermione por alguns momentos.
- E então, Weasley, como foi lá? – perguntou o loiro, agora já de pé, a camisa novamente abotoada. A voz dele fez as duas se separarem.
- Tudo bem. – respondeu a jovem, com voz cansada. – A varinha está comigo, protegida, dentro da mochila. Tive que imobilizar Rookwood e Nott, então eles não me importunaram. Deveríamos sair logo daqui. – acrescentou, ansiosa. – Não há problemas em aparatarmos, já que temos a Horcrux agora, certo?
- Claro que não. – disse Hermione. – Vamos recolher nossas coisas e então partimos.
Acrescentou com um sorriso, tranqüilizando a ruiva. Draco parecia intrigado.
- Mas o que aconteceu lá dentro, Weasley? Como conseguiu pegar a Horcrux sem sofrer um arranhão?
- Eu não quero falar sobre isso. Ela está aqui e creio que sei como destruí-la. Isso é tudo que importa.
Ginevra respondeu com voz dura. Malfoy deu de ombros e afastou-se para recolher sacos de dormir e cobertas. Hermione, entretanto, notou algo mais na voz da garota.Um pesar contido, uma tristeza indefinível, que Ginny parecia lutar para esconder.
Aproximou-se da amiga e falou baixo para que apenas ela escutasse.
- Está tudo bem mesmo, Ginny?
- Está, sim, Mione.
A morena a encarou, perecendo descrente.
- Você nunca conseguiu mentir para mim, Ginny. Pode até ter segredos para Harry, Ron, até mesmo sua mãe, mas não para mim.
Ginny sorriu triste e apertou a mão da amiga.
- Façamos o seguinte: você guarda o meu segredo e eu guardo o seu. – e indicou Malfoy com um olhar.
Hermione sentiu pelo tom de voz da caçula Weasley que aquilo não era uma chantagem ou algo assim, era um pedido.
Ela retribuiu o sorriso e foi ajudar Draco a apanhar o restante das coisas espalhadas e empacota-las, sentindo que, sem sombra de dúvidas, o segredo de Ginny era mais valioso.
Antes de deixar a Ordem, já quase no fim da manhã, Draco procurou Hermione pela casa e encontrou-a sozinha, olhando para o dia chuvoso que estavam tendo em Londres, através de uma das janelas sujas da sala da tapeçaria na Mansão Black.
- Hermione. – ele chamou suavemente.
Ela virou-se e o encarou parecendo triste.
- Sobre o que aconteceu...
Ele tentou, mas ela apenas balançou a cabeça.
- Não vamos falar nisso, Draco. Não agora.
- Você se arrependeu?
O jovem perguntou, parecendo preocupado. Ela meneou a cabeça.
- Nem por um segundo. – ele sorriu, aliviado. – Mas vamos deixar tudo como está. Pelo menos até que tudo isso acabar. - Ele assentiu.
- Não deve estar longe do fim agora, não é?
- Espero que não. – ela disse, com uma voz cansada.
Ele se aproximou e a abraçou forte.
Ela se deixou abraçar e se permitiu um suspiro de contentamento. Depois de poucos minutos eles se separaram e, com um último olhar, apertou as mãos dela entre as suas, virou-se e foi embora.
Fora a última vez em que estiveram sozinhos. Trocavam olhares durante as reuniões da Ordem e algumas poucas cartas, vazias de conteúdo, mas apenas para deixar claro que algo ainda iria acontecer. Sentiam vontade de estar um nos braços do outro, mas tinham um acordo mudo de que o melhor era aguardar.
E quando todas as implicações das ações de Ginny naquela noite se tornaram claras, eles apenas reafirmavam a si mesmos que deveriam esperar pelo fim. Imaginavam o fim da Guerra, do sofrimento, do tormento vazio de emoções no qual sobreviviam. Mas o que sobreveio foi o fim da vida dele.
Mais uma vez ela contemplou o rosto pálido e se culpou.
Se ao menos tivesse conseguido esconder...
Se não o tivesse deixado perceber o que tinha acontecido...
Enrijecendo de frio, sentiu a mão de alguém pressionar seu ombro. Olhando para o lado através das lágrimas viu nos olhos de esmeralda de seu maior amigo refletidas como num espelho as mesmas emoções que ela guardava dentro de si.
Dor lancinante, sofrimento contido, desespero gelado.
- Será esse nosso destino, Mione? Assistir as pessoas que amamos morrerem sem que elas saibam tudo que sentimos por elas?
Harry perguntou, com a voz entrecortada pela dor, as lágrimas que ele vinha contendo dominando-o enquanto ele tomava Hermione nos braços e eles se deixavam ficar juntos.
A chuva lavando suas almas.
Como se ela fosse capaz de levar sua dor juntos com as marcas da última batalha.
N/a2: A fic já está terminada, cada parte vai ser postada a cada mais ou menos uma semana, de acordo com as reviews! Então, review e façam uma pessoinha aqui mais feliz! -Bjs!