Francamente, Harry…!

Versão em português da fic "¡Honestamente, Harry…!"

Autora: Bet-HPG Galaxia

Tradução (autorizada): Inna Puchkin Ievitich


1. A poção revitalizadora não leva baunilha

Aquela era uma tarde normal; se é que, acaso, algo do que havia lhe passado nos últimos seis anos podia ser considerado normal. Caminhava em direção à biblioteca; necessitava de um livro para estudar poções.

Isso deveria ativar um alarme. Se numa frase estavam inclusas as palavras "biblioteca", "livro", "estudo" e "poções" era porque algo de mau estava acontecendo.

Em sua mão apertava um pedaço de papel com o nome do livro do qual precisava, Hermione pessoalmente o anotara. Estava ao pé das escadas. Tinha que subir um andar para chegar ao seu objetivo. Ele sabia. Estava tão seguro e consciente desse fato como de que seu nome era Harry. Dirigia-se à biblioteca, essa era sua intenção, motivo pelo qual era necessário subir as escadas, chegar ao andar seguinte e caminhar até o final do corredor.

Mas... não o fez.

Seguiu pelo corredor à sua esquerda e seus pés o levaram até à quinta porta do lado direito. Não soube por que mas, com toda a docilidade, deixou-se levar por esse estranho impulso; abriu a porta, que se fechou de um golpe imediatamente depois de ter entrado.

O recinto estava totalmente às escuras. Nunca estivera ali, mas seus pés sabiam exatamente para onde guiar cada passo. Vinte no total. Doze para dentro e oito mais à esquerda. Era como se o tivessem programado para chegar a esse lugar em específico.

Não era capaz de distinguir, sequer, seus próprios sapatos, não sabia o que estava fazendo nesse lugar. Pôs-se a esperar; não sabia o que, mas esperou. Não por muito tempo. Escutava os ponteiros de um relógio o qual não podia ver, com seu insistente tic-tac.

Um leve ranger de madeira pode ser ouvido. Depois, uns passos aproximando-se dele. Um par de segundos mais tarde, um par de mãos suaves se apoderou de suas bochechas. Sentiu um tênue alento acariciando seu rosto. A surpresa o paralisou quando, por último, seus lábios se contagiaram com um sabor de baunilha, ao terem feito contato com outros, cálidos e doces.

Sem tempo para reagir, sentiu o frio que aquelas mãos haviam deixado em suas bochechas ao soltá-las. Aos seus ouvidos chegou o som dos mesmos passos, que agora se afastavam enquanto ele agitava sua varinha repetindo, inutilmente, "lumus". O quarto continuava totalmente escuro. Houve outro rangido de madeira e depois silêncio absoluto.

Tentou seguir a mesma direção daqueles passos ao desaparecerem, mas depois de se chocar com um móvel de madeira sólida, golpear o joelho e lançar um par de maldições, desistiu dessa idéia.

Totalmente confuso, foi capaz de recordar o local aproximado onde estava a porta, e depois de se chocar com o que, graças ao tato, deduziu ser uma poltrona, sua mão encontrou o trinco e o girou com firmeza. Rapidamente suas pupilas reagiram à luz e seu cérebro começou a trabalhar com maior velocidade.

Não tinha idéia do que acabara de passar ali dentro. A única prova de que tudo fora real, era o formigamento em seus lábios e o persistente sabor de baunilha.

Com passos lentos e vacilantes, chegou à Sala Comum. Com uma das mãos sobre os lábios, como se tentasse evitar que a única evidência do que acabara de viver desaparecesse.

Rony murmurava, sem parar, fragmentos do livro que transcrevia num longo pedaço de pergaminho. Hermione, próxima dele, tirava seus livros de sua mochila e começava a espalhá-los sobre a mesa. Ninguém prestou a menor atenção quando chegou e sentou-se entre eles. Por um momento, agradeceu. Porém, logo começou a sentir a imperiosa necessidade de contar o que havia se passado consigo; compartilha-lo com alguém, com alguém que pudesse ver, o faria mais real.

Por entre suas meditações sobre o que havia acontecido naquele aposento, pode perceber que Hermione lhe dirigia um e outro olhar dissimulado, cada vez que folheava as páginas de seu livro de Aritmancia. Imaginou as broncas que ela lhe daria se contasse que, de algum modo, havia chegado na estranha sala ao invés de ter ido diretamente para a biblioteca. Imaginou as piadas de Rony ao saber que tinha sido beijado por alguém, que bem poderia ter o nariz tão torto quanto o de Snape, e acabou mudando de opinião. Há coisas que é melhor não compartilhar.

Começou a sentir-se nervoso, como se estivessem a ponto de descobrir seu terrível segredo. Sentiu sua testa umedecer-se com um suor frio.

- Você encontrou o livro? Ocorre algo, Harry? - perguntou-lhe Hermione, com uma mescla de preocupação e diversão ante sua expressão.

Simplesmente negou com a cabeça. Rony presenteou-lhe um olhar distraído. Ao comprovar, depois de uma breve análise, que não se passava nada, continuou acrescentando seus enormes garranchos no pergaminho.

- Se não está ocupado, ajude-me a encontrar os ingredientes da poção revitalizadora. - disse sem olhá-lo. Arremessou-lhe um velho livro de poções com capa já gasta, que qualquer um haveria jurado ter sido propriedade do próprio Merlim.

Harry ignorou-o totalmente. Sua mente estava concentrada num único pensamento. Cravou seu olhar num ponto qualquer e distanciou-se do restante dos acontecimentos ao seu redor. De algum lugar, aparentemente muito longínquo, chegou-lhe uma espécie de eco que lhe recordava vagamente a voz de Rony. Mas ele continuava preso à mesma idéia.

- Baunilha. - sussurrou, umedecendo os lábios para lembrar do sabor.

- Baunilha? A poção revitalizadora leva baunilha? - perguntou, por fim, levantando a cabeça e olhando primeiro Harry e, em seguida, Hermione. Esta observou Harry por um instante antes de começar a rir.

Finalmente, a expressão confusa de Rony e as gargalhadas de Hermione o fizeram voltar à realidade.

- Francamente, Harry! Não sei em quê você está pensando, mas espero que não tenha posto essa atrocidade em seu trabalho de poções. - declarou Hermione, divertida.

Harry sentiu seu rosto ruborizar rapidamente. Rony passava as folhas do livro a toda velocidade para verificar se baunilha era ou não um ingrediente para essa poção. Por fim, o viu percorrer com o dedo uma lista de ingredientes que ocupava três folhas e entre os quais, definitivamente, não se encontrava a baunilha.

- Raios, Harry! Ainda tenho que fazer um ensaio de Transformações e um resumo de Feitiços... Não estou para brincadeiras agora! - gritou Rony, irritado.

Hermione rolou os olhos e deu um ligeiro bufido.

- Bem, se você tivesse começado a fazer tudo isso na semana passada, não estaria assim agora. Você bem que poderia ter ocupado o fim de semana com outra coisa, que não levar Luna à Torre de Astronomia e a quantos quartos escuros encontrasse pelo caminho! - reclamou Hermione, com ar indiferente.

As palavras "quarto" e "escuro" incendiaram, novamente, o rosto de Harry. Sentiu os olhos de Hermione fixos nele e ficou profundamente agradecido a Rony, quando este fechou o livro de um golpe e dirigiu-se a Hermione muito ofendido.

- Diferente de você, eu, sim, tenho vida...

Aproveitou a discussão para escapulir para o dormitório. A toda velocidade subiu as escadas. Fechou as cortinas de sua cama antes de deixar-se cair nela, enquanto pensava em quem poderia ser a misteriosa "garota-baunilha". Continuava acariciando os lábios e, sem dar-se conta, adormeceu.

Com toda a consciência que podia ter dentro de seu sonho, começou a percorrer todos os rostos femininos de Hogwarts. Talvez, Cho se arrependera, talvez Gina ainda sentia algo por ele. Quem sabe, Parvati. Talvez, aquela garota loira do quinto ano. Quem sabe, Hermione... uma forte risada se apoderou dele diante desse pensamento, um absurdo, inclusive, tratando-se de alguém que o tem enquanto está adormecido. Ninguém em seu juízo perfeito, consciente ou inconsciente, acreditaria que Hermione fosse capaz de algo assim.

Não foi um sonho tranqüilo. Sonhou com o mesmo quarto escuro. Com as mesmas mãos suaves sobre seu rosto. Os mesmos lábios doces e o mesmo sabor de baunilha... e em seguida... a fuga.

Era de madrugada quando acordou sobressaltado por um terrível descobrimento: tinha gostado daquele beijo.

E muito.


Continua...