TRY – Capítulo 7

WANDA SCARLET

- Obrigada. – disse a moça para o chofer enquanto saía da limusine.

- Boa noite Senhorita. – desejou ele fazendo uma leve reverência.

- Boa noite. – respondeu ela com um leve sorriso.

Saori começou a subir o pequeno lance de escadas que levava à entrada da mansão Kido. Antes que chegasse à porta, essa foi aberta e a moça foi saudada pelo mordomo.

- Boa noite Senhorita Saori. Seja bem vinda.

- Obrigada, Tatsumi. – entrando já foi tirando o casaco que usava, imediatamente foi ajudada pelo mordomo.

Ela não queria mais ver ninguém pelo resto da noite, estava particularmente cansada por causa da festa. Comparecera a um evento social do qual não conseguira se livrar. Ultimamente não estava com cabeça para comemorações ou festividades, causavam-lhe um mal estar e não tinha a mínima vontade de conversar com ninguém. Só queria ficar em paz sozinha ou trabalhando. E como vinha trabalhando! Desde que retornara da Grécia era só nisso que pensava, era só isso que fazia a maior parte do tempo. Com a mente ocupada teria muito menos tempo para pensar em uma certa pessoa que vinha tentando esquecer há um mês. Mas pelo estado de seu coração, um mês ou um século não fariam diferença, sabia que não poderia esquecê-lo. Pelo menos não enquanto vivesse, enquanto vivesse ainda pensaria nele e ainda sofreria. E para sua (má) sorte havia um verdadeiro exército de cavaleiros e amazonas especialmente treinados para assegurar que ela vivesse durante muito tempo.

- Os rapazes voltaram para a Grécia? – perguntou ela ao mordomo.

O mestre do Santuário havia solicitado a presença desses dois cavaleiros para uma missão, mas ao mesmo tempo avisava que estava designando outros protetores para ficarem com ela. Não adiantava rebelar-se com esse tipo de coisa, detestava ter sempre um ou dois cavaleiros "tomando conta" dela enquanto estava fora do Santuário, sentia-se como uma criança cuja babá usava armadura! Mas ela é a reencarnação de Athena, e como tal zelava pela segurança da Terra assim como seus cavaleiros zelavam pela sua segurança. Há muito tempo aprendera a entender e aceitar isso, aprendera a conformar-se tanto com sua condição quanto suas responsabilidades, não era mais criança (mesmo que tivesse babás com armadura).

- Sim. Seiya e Hyoga partiram assim que o outro cavaleiro chegou.

- "O" outro cavaleiro? Achei que Shion mandaria dois cavaleiros de bronze.

O mestre do Santuário preocupava-se muito com a sua segurança, por ele, onde quer que a moça fosse haveria pelo menos metade dos cavaleiros de ouro para protegê-la até de ar poluído. Fora muito difícil convencê-lo a diminuir a escolta quando retornara para o Japão, dois cavaleiros foi o máximo que ele permitiu.

- Segundo o enviado, o Mestre achou adequado substituir dois cavaleiros de bronze por um cavaleiro de ouro.

Saori parou no momento que escutou a palavra "ouro". Com o pé no primeiro degrau da escadaria que levava ao segundo andar onde ficavam os quartos, ela tentou ignorar o início de nervosismo pela possibilidade que aquela informação abria. De costas para o mordomo ela perguntou:

- Ele já está aqui?

- Sim. Assim que chegou cuidei para que fosse acomodado num dos aposentos designados pela Senhorita. Quer que o chame a sua presença?

- Não. Isso não é necessário. – e começou a subir as escadas se convencendo de que não tinha motivos para ficar nervosa, cuidara pessoalmente para que não houvesse oportunidade dele estar sequer no mesmo hemisfério que ela – Atenda todas as solicitações que o cavaleiro fizer e depois pode se recolher, Tatsumi.

- A Senhorita não deseja mais nada?

Parou quando chegou ao topo do último degrau.

- Não. Isso é tudo por hoje. Se chegar a precisar de algo mando chamar-lhe.

E continuou a andar desaparecendo no corredor que levava aos seus aposentos enquanto fazia uma prece mentalmente, porque ao contrário do que dissera ao mordomo, ela desejava uma coisa sim. Desejava que o cavaleiro não fosse geminiano...

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Meia-noite e quinze! Essa era a hora que o relógio sobre o criado mudo mostrava.

Quando chegara da festa sentia-se inteiramente cansada, só queria deitar e dormir. Mas a partir do momento que ouvira o mordomo dizer que um cavaleiro de ouro estava em sua casa o cansaço a abandonara e encontrava-se mais desperta do que nunca. Ficara deitada na cama por horas e o sono ainda não vinha. Não conseguia parar de pensar, sua mente martelando sempre a mesma idéia "E se for ele?".

Ao mesmo tempo em que desejava ardentemente que não fosse Saga, queria e não queria encontrá-lo. Queria encontrá-lo porque sentia necessidade de estar com ele, mas não queria encontrá-lo porque sabia que o sentimento não era o mesmo para os dois. Saori não fizera nenhuma tentativa de contato com o geminiano desde aquela noite, e ele tampouco poderia tentar qualquer aproximação, como esperado. Sabia que não a procuraria, mas ainda assim sofrera por querê-lo ao mesmo tempo que o afastava.

"Eu sabia que seria assim" pensou conformada "É isso que ganho por não escutar a razão". Um sorriso curvou os seus lábios, nem tudo era só dor e sofrimento. A noite que passaram juntos é algo que ela jamais teria experimentado caso não decidisse ficar surda para razão, mas a vontade de tê-lo junto de si novamente e saber que jamais seria seu como gostaria, afogava-a em agonia.

Levantou-se da cama e vestiu o hobe de seda para proteger-se do frio. Não pegaria no sono tão cedo e decidiu fazer algo para ocupar a mente até lá.

Saiu do quarto sem fazer barulho, atravessou o corredor que levava aos quartos e desceu as escadas silenciosamente para não acordar ninguém. Estava tudo às escuras àquela hora da noite, os criados já haviam se recolhido e não encontraria ninguém "Ótimo". Foi direto para a biblioteca, ler seria uma ótima distração e, quem sabe, a fizesse cair no sono.

Entrou no aposento e acendeu uma luminária que encontrava-se sobre a escrivaninha, obteve uma claridade sobre o aposento que permitiu divisar os títulos que cobriam as paredes até quase o teto. Aproximou-se de uma prateleira e foi passando o dedo pelos livros enquanto tentava decidir-se por qual. Deteve-se em um.

Contos. Histórias breves e sem pretensão que agradavam por serem tanto imprevisíveis quanto belas. Ótimo para passar o tempo.

Retirou o livro da estante e levou-o até a escrivaninha sob a luz da luminária para examinar melhor. Conhecia aquele autor, estrangeiro claro, mas seus contos eram seus preferidos. Abriu o volume e folheou as primeiras páginas até encontrar o índice, queria saber se continha uma história em especial. Deparou-se com o título que buscava, sorriu satisfeita e leu:

- "O Rouxinol e a Rosa" de Oscar Wilde. – fez uma pausa lembrando-se daquela história. Um pássaro com um canto belíssimo fez de tudo para que uma roseira produzisse, da noite para o dia, uma rosa vermelha que seria usada por um rapaz para presentear sua amada, uma garota fútil e mesquinha. Acabou que o Rouxinol morre com um espinho atravessado no coração, mas conseguindo que uma rosa vermelha fosse produzida e assim o rapaz tivesse com o que presentear a moça. Tanto a flor quanto os sentimentos do jovem foram pisoteados, e o sacrifício da ave aparentemente fora em vão. – Não poderia ser mais adequado...

- Concordo plenamente. – disse uma voz grave vinda da porta.

Saori paralisou-se com o susto, os joelhos fraquejavam e sentia um frio arrepio descer-lhe a espinha. Aquela voz... Com os olhos muito abertos virou a cabeça na direção em que ouvira as palavras desejando ardentemente que fosse sua mente pregando-lhe peças, fazendo-a imaginar coisas.

Seus temores se confirmando com a visão da personificação de seus desejos. Era ele mesmo, Saga, em carne, osso e arrogância que a encarava com um sorriso e de braços cruzados encostado na porta.

Os dois se olharam por vários minutos em silêncio. As lembranças daquela noite ocupando a mente de ambos.

Ele arqueou uma das sobrancelhas interrogativamente e perguntou zombeteiro:

- Está vendo algum fantasma?

- Queria estar... - Saori estava estática, não sabia o que fazer. Só quando soltou o ar que estava em seus pulmões é que percebeu que prendera a respiração. Sabia que aquele momento chegaria, algum dia se encontraria com Saga e não poderia fazer nada para evitar isso.

Recuperou-se do choque e adotou uma postura indiferente. Ela não poderia deixar de sentir o que sentia, mas não precisava deixar ele saber disso.

- Então foi você o cavaleiro de ouro que Shion indicou no lugar de Seiya e Hyoga. – concluiu ela calmamente sem conseguir disfarçar o tom de desagrado na voz.

- Decepcionada, minha deusa? – perguntou sorrindo.

- Não. Contrariada talvez.

- Não acredita que sou capaz de assegurar sua segurança?

- Você é capaz de assegurá-la, não tenho dúvidas. – Saori virou-se para a escrivaninha, fechou o livro e continuou ainda sem conseguir disfarçar a irritação apesar da calma voz – Mas não existe nada ameaçando minha segurança. Por isso não ha razão para manter uma escolta permanente de cavaleiros.

- Será que não existe nada ameaçando-a? – fez uma pausa para depois atacar – Resolveu mudar-se da Grécia para o Japão da noite para o dia, literalmente, por nada? – comentou tentando provocá-la – Parecia que estava fugindo de algo perigoso... nada mais natural que haja algum cavaleiro por perto que possa protegê-la.

Ela nada respondeu, não ia ceder às provocações dele.

- E então? É isso? – fez uma pausa – Existe algum perigo no Santuário que tornou necessária sua mudança para o Japão?

Olhou para ele e sorriu de leve.

- Não existe mais... – então ficou séria – Se me der licença... – andou até a porta em que Saga encontrava-se encostado e tentou passar por ele para sair dali, mas foi em vão.

Ao ver que aquele homem não ia mover-se do lugar resolveu ser mais explícita:

- Quero voltar para o meu quarto, poderia sair da frente da porta, por favor? – era mais uma ordem do que um pedido.

- Poderia sim, mas não vou.

"Ele não vai facilitar" concluiu Saori.

- Pretende me manter trancada aqui?

- "Trancada"? Não... de forma nenhuma! – falava com sarcasmo – Só quero conversar um pouco com a senhorita...

- A essa hora da noite!

- Acredito que o momento seja o mais apropriado.

- E eu acredito que você seja louco! – fez uma pausa e suspirou – Já está tarde e tenho compromissos amanhã bem cedo. Que tal deixar para conversar quando um de nós não estiver querendo muito voltar a dormir?

Sorriu de forma sedutora e respondeu sarcástico:

- Você pode querer muito qualquer coisa nesse momento, mas dormir com certeza não é uma delas. Está com tanto sono quanto eu e sabe disso, caso contrário não teria encontrado-a aqui.

"Como ele é irritante!"

- O que você quer Saga? – perguntou de uma vez.

- Já disse, quero conversar com você... – mas o olhar sombrio contradizia o sentido simples de suas palavras.

- Espere até que amanheça para isso!

Ficou em silêncio por alguns instantes só analisando o rosto e a postura ofensiva dela. Parecia que Saori estava mesmo determinada a continuar com aquele joguinho...

- Da última vez que esperei até amanhecer para conversarmos, acordei sozinho só para descobrir que você tinha viajado para o outro lado do mundo!

Ela baixou o olhar e virou o rosto, não queria encará-lo.

- Talvez seja um sinal dos deuses, a conversa não era para acontecer.

- Talvez seja um sinal de uma deusa em particular, a conversa a assusta.

Sentia o olhar dele sobre seu rosto e rezava para que não estivesse ruborizada. Detestava sentir-se assim, como uma garotinha assustada. Ergueu o rosto para encará-lo, altiva e desafiadora ao mesmo tempo.

- Você não me assusta, muito menos uma conversa!

- Então por que fez tudo o que pôde para evitá-la? Ou vai dizer que todas as missões que me mantiveram ocupado e bem longe de você não tiveram nenhuma ordem sua por trás?

- Não tenho nada a ver com suas ocupações. – respondeu friamente fingindo não saber ao que ele se referia, claro que era mentira. Realmente dera ordens para o Mestre do Santuário que mantiveram o cavaleiro de Gêmeos ocupado o suficiente para não ter oportunidade de procurá-la ou encontrarem-se por um bom tempo. E estava tudo correndo como o planejado, até agora quando descobrira que ele fora designado para substituir Seiya e Hyoga.

- Você mente muito mal...

- E você me irrita muito bem...

Não queria iniciar nenhuma discussão porque com certeza acabaria acordando outras pessoas na casa, era a última coisa de que precisava. Desistindo de sair e de discutir, deu as costas ao cavaleiro e foi até uma poltrona onde se sentou. Ligou o abajur ao lado e abriu o livro começando a lê-lo e tentando ignorá-lo.

Alguns minutos depois ele deixou a porta e caminhou para onde Saori se encontrava, sentou-se na poltrona em frente. Não tirava os olhos dela nem por um segundo, a luminosidade do abajur mal chegando onde se encontrava e deixando-o encoberto pela penumbra.

Ficaram assim, um silêncio mórbido carregado de tensão invadindo o aposento inteiro. Saori com os olhos grudados nas páginas do livro de contos e Saga com os olhos grudados no rosto dela. Os dois sabiam que ela não estava lendo nada, mas nenhum deles dizia coisa alguma. Era o típico impasse indissolúvel, ambos tendo motivos de sobra para conversar, mas não demonstravam estar a fim de iniciar qualquer conversa. De repente um dos dois resolveu que o momento para as análises haviam acabado.

- Sei que não está lendo. – começou ele calmo – Então pare de fingir.

- Seria indelicadeza de minha parte. – sem tirar os olhos das páginas.

- Porque mostraria faz isso só para me evitar?

- Que tipo de dama eu seria se deixasse coisas como essa serem tão óbvias? – perguntou sarcástica.

Saga riu da sinceridade da moça, o som do riso dele fazendo com que Saori ficasse ainda mais nervosa do que já estava, mas não deixaria isso transparecer de maneira nenhuma.

- Claro. Manter sua vontade escondida de todos é essencial, certo? – disse bem humorado – Não ha dúvidas de que é uma dama, Senhorita. – então o sorriso morreu no rosto e continuou ameaçadoramente – Sou um homem paciente, mas receio que toda a paciência de que sou capaz se esgotou. Por isso vou direto ao assunto. – fez uma pausa – Você me deve respostas!

Fechou o livro com um pouco mais de força do que o normal demonstrando o estado de irritação dela e olhou-o geladamente através das sombras.

- Mesmo? – desdenhou a moça – E que tipo de respostas eu devo a você?

Saga viu que aquilo seria mais difícil do que pensara, ela parecia determinada a fingir que não sabia do que falava.

- Do tipo que não dá nem para si mesma. – respondeu ele com calma – A não ser que tenha tanto medo de seus sentimentos que tenha resolvido ignorar que eles existem.

- Do jeito que fala parece conhecer meus sentimentos melhor que eu! – disse sorrindo com falsa gentileza.

- Pelo menos melhor do que você admite.

Ela estreitou os olhos e adquiriu uma expressão sombria.

- Você não saberia nem por onde começar a conhecê-los...

Nada respondeu, apenas ficou observando-a. A tensão na sala era quase palpável com o pesado silêncio.

- Sou obrigado a discordar. – Saga levantou-se – Conheço muito bem o que é de meu interesse. E você, bem como seus sentimentos, me interessam muito. – começou a caminhar na direção dela devagar enquanto continuava falando calmamente, uma calma que fazia as palavras tornarem-se perigosas – Com toda a certeza não entendo seu modo de agir desde que acordei na manhã em que você deixou a Grécia sem dizer uma palavra. Mas isso pode ser mudado em poucos minutos com algumas explicações... – parou frente à Saori, inclinou-se sobre ela apoiando as mãos uma em cada braço da poltrona prendendo-a – Agora, antes que comecemos realmente a falar sério... – aproximou o rosto do dela até que ficassem a centímetros de distância um do outro - ...sugiro que não me subestime, minha cara. Você não faz idéia do esforço que estou fazendo para controlar-me diante de sua insistência em fazer de conta que não houve nada entre nós dois...

A proximidade, a voz baixa e controlada, as palavras ditas em tom de ameaça, os olhos azuis tão perto e tão escuros não se desviando nem por um instante dos seus, tudo tinha a clara intenção de intimidá-la. Mas nada disso importava para Saori naquele momento, não que pudesse ignorar um ataque tão direto assim, só a presença daquele homem e a consciência do que sentia por ele deixava-a sem fôlego. Detestava sentir-se pressionada, e no momento estava sendo.

- Acredite quando digo que nem por um ínfimo segundo fiz de conta que não houve o que aconteceu entre nós dois. – sustentou o olhar dele sem qualquer sombra de temor.

- Bem... então parece que aquela noite tem um significado diferente para ambos.

- Isso porque você complica demais as coisas quando na verdade elas são bem simples.

- Então, esclareça-me, por favor. – sorriu malignamente – Adoraria saber o que aquela noite realmente foi.

- Não vem com essa, Saga! – a paciência dela estava acabando – Como se você não soubesse...

Usando as duas mãos espalmadas empurrou-o com força para que se afastasse dela, algo que o cavaleiro não ofereceu nenhuma resistência recuando alguns passos. Saori levantou-se deixando o livro que ficara o tempo todo em seu colo sobre a poltrona onde estivera sentada, deu as costas a ele e caminhou até a escrivaninha onde apagou a luminária que havia acendido deixando assim o aposento mais escuro ainda. Apoiou as mãos espalmadas sobre a escrivaninha juntando todas as forças de que era capaz para conseguir dizer o que estava preste a falar. Sentia-se como o Rouxinol que enterrava o coração mais e mais contra o espinho de uma roseira.

- O que foi? Não tem coragem para admitir o que nós dois sabemos que é verdade? – estava provocando-a, forçando-a a ter uma reação explosiva. Somente quando ela se mostrasse com raiva, brigando com os sentimentos à flor da pele, poderia obter algumas respostas sinceras daquela mulher, sabia disso por instinto – Que você não está tão indiferente a mim quanto parece, que colocou toda essa distância entre nós porque tem medo dos sentimentos que a faço experimentar, que a nossa noite...

- Não significou nada! – interrompeu ela exaltada ao extremo, fechando as mãos em punhos com força tentando aliviar a raiva sem descontrolar-se – Não tenho medo dos meus sentimentos, jamais tive! Nunca pareci indiferente a você, é uma façanha da qual infelizmente ainda não sou capaz! Por que não pára de me torturar com sentimentos que você não sente de verdade? Será que não é o bastante eu ser apenas mais uma na sua vida! – estava quase chorando, tentava a todo custo conter as lágrimas, mas era inútil àquela altura, elas já abandonavam seus olhos e corriam lentamente pelas faces.

Ele postou-se ao seu lado e com uma das mãos fez o rosto dela voltar-se para si, os olhos tristes e as lágrimas mudas sendo fracamente distinguidos em meio à penumbra que reinava sobre a sala.

- Por que? – ele perguntou baixinho

- Por que o que?

- Por que as lágrimas? – com a ponta do dedo traçou o caminho molhado deixado desde o olho até quase o queixo – Dói tanto assim gostar de mim?

Virou o rosto para o lado desvencilhando-se do toque dele.

- Eu não gosto de você... – a voz saindo mais como um sussurro triste - ...é muito mais do que isso. – ficou em silêncio por um instante e continuou agora mais firme – A dor vem da frustração de saber que... – as palavras morreram na garganta, não entendia bem como, mas não conseguia dizer que ele nunca poderia ser seu, machucava-a demais.

- Saber que... ? – incentivou-a a continuar.

Nada respondeu, permaneceu quieta durante algum tempo que pareceu uma eternidade. Então bruscamente deu as costas a ele e dirigiu-se para a porta, ia sair dali. Mas Saga a impediu segurando-lhe a mão.

- Não vou deixar que você me escape. – avisou – Por que sempre está tentando fugir? Do que tem medo?

- Você não entenderia...

- Por Zeus, Saori! – a exclamação pegando-a de surpresa – Depois de tudo, você ainda não confia em mim! O que é preciso para fazê-la perceber que ninguém poderia entendê-la melhor do que eu! – estava exaltado e indignado com aquela atitude. Suspirou longamente tentando acalmar-se, aproximou-se dela até que estivesse bem próximo logo atrás da moça sem interromper o contato das mãos – Naquela noite você confiou em mim, não foi? – perguntou devagar.

- Sim... – respondeu baixinho.

- Arrepende-se disso?

- Não.

- Então qual o problema em confiar novamente?

- Não é uma questão de confiar ou não.

- É uma questão de quê?

- É... é... – suspirou – Eu não sei como explicar...

- Tente.

Desvencilhou a própria mão e voltou-se para encará-lo. Aqueles olhos... profundos e sagazes! Não conseguia ficar imune àquele encanto, não importava o quanto já os tivesse visto. Ela não desviaria o olhar dos olhos dele, isso mostrava a seriedade de suas palavras.

- Eu sinto algo muito forte por você, Saga. Não sei bem desde quando, nem me interessa. Mas o fato é que eu te amo demais! – fez uma pequena pausa antes de continuar – É impossível deixar de te amar. Quero você só para mim, que esteja comigo o tempo todo e que goste de mim tanto quanto gosto de você. Se não puder tê-lo por completo por toda a vida, não quero tê-lo de nenhuma outra forma. – levou a mão ao rosto dele numa carícia leve – E você... estar com uma mulher por tanto tempo não é do seu feitio. – recolheu a mão e fechou-a sobre o próprio peito – Eu não suportaria ser deixada de lado tão logo você perca o interesse em mim, e sei que um dia o perderá. – deu um passo para trás colocando alguma distância entre ambos – Por isso me aproximar é doloroso, por gostar tanto de você e saber que não posso tê-lo. É isso que dói, é isso que me faz sofrer. – sentia os olhos arderem em antecipação pelas lágrimas que voltavam a se formar – Se você realmente é a única pessoa que pode melhor me entender, deve ser capaz de entender isso.

Após alguns segundos ele respondeu:

- Eu entendo.

- Que bom... Não tenho mais nada para dizer.

E dito isso virou-se para a porta, precisava sair dali o mais rápido possível, não agüentaria mais nem um minuto junto com ele sem começar a chorar novamente. Verbalizar aquilo tudo era demais para seu coração. Quando se ama profundamente uma pessoa e sabe-se que jamais conseguiremos mais do que alguns momentos de paixão sem qualquer sentimento mais profundo, isso nos dilacera por dentro.

Antes que chegasse à porta Saga a deteve circundando sua cintura com os braços e abraçando-a carinhosamente. Sem dizer uma palavra ele ficou assim, o rosto enterrado nos cabelos dela entre o pescoço e o ombro.

Sentir a respiração em seu pescoço e o calor do corpo dele aquecendo o seu naquele abraço faziam-na esquecer-se de pensar. Entregou-se àquilo, não conseguia esboçar qualquer reação para romper aquele contato, não tinha forças e agora não tinha mais vontade para isso. Somente fechou os olhos e desejou que aquele momento nunca passasse.

Saga moveu a cabeça um pouco até que sua boca ficasse bem próxima ao ouvido dela e disse baixinho:

- Eu entendo, mas não aceito! Já falei que não vou deixar que você me escape. – fez uma pausa e apertou mais o abraço fazendo com que seus corpos colassem mais ainda um ao outro – Já que não tem mais nada para dizer, agora escutará tudo o que tem para ouvir... – ele falava com calma, sem qualquer sarcasmo ou ironia – Subestima demais os meus sentimentos, subestima demais a mim. Fez-me sofrer como nunca havia sofrido durante todo esse tempo que fui obrigado a ficar longe de ti. Você não é "só mais uma na minha vida" e jamais será. O que sinto por ti é muito forte também, forte demais para ser ignorado ou esquecido. Lutei demais contra esse sentimento durante muito tempo por pensar não ser digno de sua atenção, até aquela noite quando o brilho que pude ver em seus olhos me deu esperanças. E quando te beijei tive certeza que o sentimento era recíproco, você sentia algo por mim. – fez uma pausa e respirou profundamente antes de continuar – Naquela noite percebi com clareza cada sentimento por trás de seus olhares, seus gestos, seus toques e guardei-os bem no meu coração. Concentrei-me totalmente em você, não queria perder nem sequer o mais leve suspiro, pois sabia que naquele momento seu corpo inteiro, assim como o meu, estaria demonstrando mais do que ações, demonstravam sentimentos. Aquela noite significou muito para mim e eu sei que significou muito para você também.

De olhos ainda fechados, Saori deixou-se guiar pelas palavras dele. Não podia contradizê-lo, aquela noite significou muito para ela sim, e seus olhares, gestos e toques realmente foram mais do que apenas ações, deixara todo o amor que sentia aflorar em cada um deles.

- Mesmo sabendo de tudo isso você quis negar seus sentimentos, fugiu de mim o máximo que pôde. E continua tentando fugir... Você disse que não pode aproximar-se de mim porque sofre, mas não é verdade. Você não quer aproximar-se de mim porque tem medo, medo de confiar seu coração a mim como fez naquela noite e eu a decepcionar. – ficou em silêncio uns instantes – Zeus! – suspirou – Não tem idéia do inferno que passei com sua insistência em me afastar, foram os piores dias da minha vida! Precisava desesperadamente conversar contigo, mas você fez questão de garantir para que não houvesse chance disso acontecer...

- Tem sua chance agora... – murmurou ela falando pela primeira vez desde que o cavaleiro a abraçara.

- Sim... tenho minha chance agora... – deixou a frase perder-se no silêncio – Mas você ainda tenta fugir. Eu não deixarei que consiga! Agora que tenho você junto de mim farei de tudo para mantê-la ao meu lado, para sempre... Eu te amo, você é minha vida.

HAPPY END

WANDA SCARLET

Nota da autora: FINALE! Nem acredito! Enfim estou livre! Bem... me pediram um final feliz, e aí está. Sei que pode parecer meio brusco e nem de longe com cara de final. Mas como diz a "mais que poderosa" Jane Smith: "Finais felizes são histórias que não foram terminadas." E esse é o final que eu queria, afinal de contas, só precisava fazer o geminiano dizer que a amava né! Espero que tenham gostado, porque pra mim essa história terminou no capítulo anterior quando separei os dois (sim, eu sou maligna mesmo!). Obrigada a todos por lerem essa fic...

E obrigada especial para Petit Ange que gentilmente me cedeu uma frase maravilhosa e que foi o motivo pra esse capítulo ser escrito em primeiro lugar (ela sabe qual é...)

Beijos