Amores e Traições

Gênero: YAOI-LEMON, ANGST
Casal: Heero x Duo
Comentário da Empresária (isso é, meu ): Isso aí gente boa! Euzinha (Goddess Of Death GW) estou aqui representando a Carol Yui (não me perguntem o porque de ela não estar aqui pessoalmente, eu também não faço a mínima), fui contratada para a postagem de fics dela no -soltando foguetes – Emocionante né? Também acho! E uma grande honra pra mim também! A postagem desse fic é semanal, isto é, de sábado em sábado XD e como ele está completinho bonitinho e eu não preciso mexer em nada vai ficar tudo assim mesmo!

Esse fic é o primeiro que a Carol-sama escreveu e está na minha lista de fics favoritos! Já li muitas vezes, por isso decidi por colocá-lo primeiro! Espero que os fãs dela não se importem, e caso alguém tenha alguma sugestããão... estou aberta a lê-las!
Agora vamos parar com a enrolação e dar início ao fic!

ATENÇÃO: ESTE CAPÍTULO CONTÉM CENAS LEMON

Ah, esse é meu primeiro fic e não dá nem pra resumir a história... Só lendo mesmo. Espero que gostem...


Não havia calçada separando a rua e o prédio. Nem a luz era suficiente. De modo que Duo tropeçou pela segunda vez, no meio da escuridão.

-Da próxima vez, convém trazer uma lanterna – pensou ele em voz alta, sorrindo ante essa idéia.

Nos últimos dois anos, tratava-se de uma das poucas ocasiões em que se movimentava para planejar sua vida, quebrando a monotonia cotidiana à qual se acostumara. Quem sabe aquilo não seria apenas o começo? Talvez aquele curso de "situações de emergência" , que estava prestes a iniciar, fosse o primeiro impulso para um novo tipo de vida? Quem sabe...
É bem verdade que a tentativa de se entregar ao novo trabalho no setor de "Comunicações" não tinha funcionado. Pelo menos, não para aquilo que ele desejava; ou seja, conseguir tirar Heero Yui de sua cabeça, do seu passado e do seu futuro. Quem sabe conseguiria desta vez com o novo curso. Sabia que nada seria novidade para ele, mas como ninguém na base sabia de seu passado como piloto Gundam este seria um primeiro passo para um novo tipo de trabalho.

-Tudo seria bem mais fácil se você não fosse tão idiota e tão vulnerável – disse ele em voz alta, estremecendo ante a verdade de suas próprias palavras.

Mesmo passados dois anos, e tendo milhares de quilômetros entre eles, Heero Yui mantinha o diabólico poder de intrometer-se em sua mente, impedindo-o de reorganizar sua vida. Estava sempre ali presente. Eram seus olhos e sua voz que teimosamente emergiam na poesia das canções que ele cantava e que o público parecia amar de todo coração. Durante noites inteiras sem dormir, Duo compunha poemas e os musicava. Então a presença de Heero se fazia inevitável nessas canções, transformando sua agradável melodia em lembranças tristes de um amor que se acabara.

À medida que ia se aproximando do prédio, Duo se perguntava se este curso realmente poderia ajudá-lo a aliviar suas mágoas e desilusões. A decisão de fazer o curso fora tomada de última hora. Seu superior no setor onde trabalhava como servidor civil lhe sugerira o curso como forma de aprimorar seu currículo e tentar uma vaga em algum outro setor mais ativo, já que Comunicações o fazia ficar muito tempo na frente do computador e ele era muito inquieto para isso. Mas "reagir a situações de emergência" era o que ele tinha feito toda a sua vida, e escutar alguém lhe ensinando a fazer isto não lhe pareceu muito promissor. Só fora até ali para não decepcionar seu chefe e amigo.

Ao ver as luzes do prédio, Duo apressou-se. Atravessou o portão e subiu os degraus que levavam a um hall com duas salas de aula. Na sala a esquerda, havia muitas cadeiras enfileiradas e uma meia dúzia de pessoas sentadas, além de outros três ou quatro que também vinham chegando. Não era uma classe muito grande . E isso era bom pois um número pequeno de estudantes sempre permite melhor contato com o professor.
Duo decidiu entrar logo na sala. E então arregalou os olhos ao ver a pessoa que estava sentada no lugar do professor. Sem conseguir dar mais um único passo, sentiu um calafrio a percorrer seu corpo e um gosto amargo, como se toda a sua bílis tivesse subido para boca. Diante dele estava Heero Yui! Parecia impossível, mas era verdade. Seu corpo reconhecia a presença familiar daquele homem.

- Não pode ser!... – gritou uma voz dentro dele. – E era um grito tão alto que Duo mal conseguiu contê-lo. Não podia acreditar!

Mas era Heero Yui , com aquele mesmo cabelo desgrenhado, castanho, e com aquele nariz ligeiramente proeminente. Sim, era o mesmo Heero, cuja boca sensual podia evocar as delícias celestiais com seu toque, mas também provocava desespero com suas palavras. E, por detrás dos óculos escuros, Duo podia adivinhar aqueles inconfundíveis olhos azuis, atentos a todo e qualquer detalhe.

De repente, Heero olhou fixamente para ele! Duo quis gritar e fugir, para não lembrar das dores e agonias que vivera no passado e que temia fossem se repetir agora. Desejou que o chão afundasse, desejou morrer. Qualquer coisa servia, desde que significasse uma fuga daquele lugar. Mas não conseguia se mexer, mesmo quando os demais alunos começaram a lhe pedir que saísse do caminho, para que pudessem entrar na sala. Os olhos de Duo permaneciam como que enfeitiçados por aqueles óculos escuros voltados em sua direção.
Será que Heero iria lhe dirigir a palavra? Será que ousaria falar com ele depois de tudo que lhe fizera? Duo sabia que era bem capaz disso. Aquele homem desafiaria o próprio demônio para atingir seus objetivos. E ele, Duo, seria capaz de responder? Provavelmente não.

-Você pretende entrar ou não? – murmurou uma voz feminina no ouvido de Duo, tentando conter a impaciência.

Mas Heero Yui, que nada perdia, também ouviu o pedido. E , com as narinas infladas como as de um garanhão, falou. Tinha a mesma voz profunda que ele tanto amara e que tanto temia. Por isso o coração de Duo gelou ao ouvir aquele som que parecia o de uma trovoada:

- Vão entrando, por favor – disse ele – Mesmo que eu não possa ver, tenho certeza de que vocês sabem onde fica a porta. Não tenham medo. Minha cegueira não é contagiosa.
Cegueira?! Duo não podia acreditar no que ouvira. Continuou ali imobilizado por mais um choque. E comprovou a cegueira quando seus olhos descobriram, ao lado de Heero, uma longa bengala branca.

- Como é? – disse alguém com irritação, por trás dele.

Empurrado pelo grupo, Duo teve apenas energia para virar-se e se sentar no banco mais próximo. Heero cego? Como podia ser isso? O que teria acontecido? Sua mente encheu-se de perguntas que se atropelavam, sem possibilidade de compreender. Não podia ser verdade!

Mas sim, tudo indicava tratar-se de um fato indiscutível. Heero olhara diretamente para ele, sem o menor sinal de tê-lo reconhecido. E nem mesmo alguém tão frio quanto Heero conseguiria se refrear até esse ponto. Ele simplesmente não o tinha visto. Heero Yui cego?

Duo tentou imaginar como seria seu retrato se Heero o visse agora: a longa trança escondida sob o quepe do uniforme da base (1), ao contrário do que usava a dois anos atrás quando era conhecido como Duo Maxwell . Achara mais seguro para não chamar tanta atenção já que não queria que ninguém o descobrisse ali. Seus olhos violetas, emoldurados por cílios deliciosamente longos, e a boca mantinha-se delicada e vulnerável. Apenas a sombra sob seus olhos era diferente, em conseqüência das noites mal dormidas, que tinham se tornado comuns em sua vida.

Seus olhos voltaram para o presente. Heero parecia ainda olhar em sua direção. Então Duo percebeu que ele poderia estar olhando para qualquer pessoa ali presente e para ninguém. Agora, só os outros sentidos funcionavam naquele que um dia fora chamado de Soldado Perfeito.

Duo estremeceu, sentindo uma ponta de ódio emergir do fundo de seu coração. Trocara o seu amor por desilusões, mentiras e abandono. Só então percebeu que apertava as mãos com tanta força até quase se ferir com as unhas.

Que estaria Heero Yui fazendo ali, naquela pequena e provinciana base de Armida, tão distante do QG? E como se atrevia a dar um curso teórico com aulas uma vez por semana?

-... e talvez vocês estejam se perguntando como é que eu posso dar um curso teórico de Emergência sem conseguir ler – estava ele dizendo – Mas também não quero fazer de conta que é fácil para mim. Para ser franco, nunca tentei nada parecido, nem mesmo quando tinha possibilidade de ler. Antes de mais nada, não sou absolutamente um instrutor. Sou um soldado, um piloto muito dedicado com muitos anos de experiência.

Heero fez uma pausa. Ainda uma vez Duo teve a sensação de que ele olhava para ele. Pior ainda, sentia como se ele o visse de verdade, mesmo que parecesse impossível em se tratando de um cego.

- Alguns de vocês não irão terminar o curso. Calculo que metade mais ou menos. Quanto aos que ficarem, quase com certeza irão me detestar quando chegar o final.

Bem, um de nós já o detesta, pensou Duo. E pensou com tal força que temeu tê-lo feito em voz alta. Duo desejou que ele tirasse os óculos e mostrasse seus olhos outrora azuis e medonhos. Estariam vazios agora? Nisso, ouviu uma voz, dentro de si, gritando: "Vá embora daqui!" Sabia que devia atendê-la, por questão de sobrevivência. Mas preferiu continuar sentado ali, mesmo correndo o risco de parecer masoquista.

Não prestara atenção no que ele havia falado agora, mas ele estava sorrindo. Não era o mesmo sorriso de antigamente: não se tratava de um sorriso bem-humorado. Havia, antes de tudo, amargura no ato de sorrir. Mais do que isso, estava cheio de cinismo, dor, ódio e até ressentimento. Seria por causa da cegueira? Provavelmente. Ele não poderia imaginar outro motivo para que Heero, insensível como era, pudesse se sentir magoado. Nunca sofreria por causa dele, tinha certeza, apesar de Duo querer que sofresse muito.

- Bom, colocarei as situações de risco para vocês e caberá a cada um descrever o que faria em cada caso – disse Heero – A parte mais difícil será a de reconhecer as falhas e tentar corrigi-las. Mas para um soldado profissional isso é muito importante.

Então, pensou Duo, já comecei a rever a minha história. Durante os últimos dois anos, não tinha feito quase nada além de repassar sua vida. E descobrira que o maior erro que tinha cometido fora apaixonar-se pelo piloto do Gundam Wing chamado Heero Yui. Ele olhou-o detidamente. Heero tinha dedos longos e delgados – dedos fortes, dissera o americano uma vez. Mas agora pareciam também dedos trêmulos. E Duo ficou surpreso ao perceber que Heero estava nervoso. Mas logo balançou a cabeça, em sinal de descrença. Heero Yui nervoso? Eis aí uma coisa impossível de acontecer.

- ... então iremos trabalhar mais ou menos assim, nessas próximas dez semanas – dizia ele – Tentarei fazer o possível para obrigar vocês a escreverem e reescreverem muitas e muitas vezes. Provavelmente serei um crítico implacável e, quem sabe até injusto. Sei que vocês não vão gostar muito de mim nestas horas.

Quanto a isso, não tenho dúvida, pensou Duo, especialmente porque já tive uma mostra de como o sr. Yui sabe ser impiedoso e injusto. E a medida que Heero continuava falando sobre o curso, Duo começou a se afastar dali, em espírito. Sua mente voltou para o passado, mergulhando em lembranças intensas e dolorosas.

Tinham se conhecido quando vieram para a Terra das colônias para iniciar a Operação Meteoro. Tinham se estranhado no início, mas também lutaram juntos muitas vezes até que praticamente formaram uma equipe que realizava suas missões sempre em dupla. O problema fora quando notara que sentia algo a mais pelo piloto do Wing. Eles dividiam um apartamento no QG e bem que Duo tentou se livrar daquilo para não perder o amigo, mas já era tarde, estava completamente apaixonado pelo japonês.

Duo tinha o costume de tocar violão a noite, e as vezes até compunha alguma coisa. Já havia confessado para Heero que um dia gostaria de tentar cantar num bar ou algo parecido nem que fosse por pura diversão. O japonês adquiriu o hábito de sentar-se perto dele quando começava a tocar e aqueles eram momentos maravilhosos em que Duo podia declarar seu amor através das canções sem se expor tanto.

Naquela noite, sentiu que Heero estava gostando das músicas, e tinha certeza que agradara muito, mesmo com aquele melancólico silêncio no final.

Quando mais tarde o pesadelo levara o japonês a debater-se no sono, Duo o acordara, envolvendo-o em seus braços para reconfortá-lo. Como era difícil escapar do contato suave do corpo colado ao seu, onde sentia, além do desejo, uma paz infinita!

- O que foi? – murmurou Duo, acariciando os cabelos do outro – Estava tendo um pesadelo?

A reação instintiva do japonês fora recusar o conforto vindo do americano, mas a meiguice de Duo o impedia de fingir. Murmurando palavras sem sentido, Duo o acalmou até que adormecesse novamente com a cabeça repousando em seu peito. Então, ao ouvir a respiração regular do sono, ousou tocá-lo sem medo. Deslizava as mãos nas costas musculosas e beijava o rosto adormecido.

Ao acordar, Heero percebeu ter em seus braços o corpo que evitava tocar. Imaginando que por estar dormindo, Duo não oferecia perigo, ele cobriu de beijos o rosto lindo, enquanto suas mãos deslizavam em busca das curvas tentadoras, esforçando-se por não despertá-lo.
E então, Duo entreabriu os lábios, entregando-se aos beijos e exigindo uma paixão intensa como a sua. O prazer então os envolveu e nenhum dos dois conseguiu resistir a onda avassaladora de sensações.

Há dias Heero se mantinha contido, com medo de chocar o americano, dando tempo para ele se acostumar com sua presença, mas essa espera só aumentava sua vontade de possuí-lo sem restrições. Já não era suficiente a proximidade, queria a intimidade mais completa, a união total. Conforto e afeto não bastavam, ansiava pelo delírio e pelo êxtase.

Como sonhava fazer a tantos dias, Heero enfim tirou o elástico e desfez a trança para libertar os cabelos de Duo. Fantasia nenhuma se comparava à textura do cabelo sedoso e ao seu perfume.

Abriu-lhe a camisa do pijama.

Descendo a boca e traçando o contorno dos mamilos com a língua, ele sentiu Duo se erguer contra seus lábios e sugou-o lentamente, prendendo entre os dentes o bico delicado e túrgido.

Gemendo baixinho, Duo se deixava arrastar pelo delírio. Via as mãos se movendo de encontro à sua pele alva e o contraste o tornava mais ansioso por uma união de corpos sem barreiras.

Procurando não se descontrolar, Heero afastou as pernas perfeitas que intuitivamente se abriram à espera dele. Flutuando num mar de sensações inebriantes, Duo se descontrolara quando sentiu a mão de Heero dentro da calça a tocar seu sexo. Este, segurando firmemente a cintura do americano permaneceu imóvel, forçando-se a agir com lentidão.

Duo sentiu os lábios percorrendo seu corpo sem se deter, ávidos mas exasperadamente lentos. Quando o japonês ouviu o gemido de paixão escapar dos lábios dele, afastou-se abruptamente.

Confuso, Duo pensou que ele fosse recuar, mas estava envolvido por sensações delirantes, e não conseguia perguntar-lhe por que parara de acariciá-lo.

Então o japonês o ergueu para despi-lo, mas as mãos trêmulas mal conseguiram segurar a calça do pijama. Sem hesitar, Duo ficou de pé e deixou cair a blusa e a calça no chão.

Imóvel, Heero contemplava a figura esguia, com a qual sonhara e que agora estava ali ao seu alcance.

Ao mesmo tempo embaraçado e exultante, Duo tomou a iniciativa. Jamais pensara em ficar nu diante de um homem, Heero porém o fitava fascinado, encorajando-o a prosseguir. Mas porque ele apenas o olhava, sem tocar ou se aproximar? Não o acharia atraente?

Então uma voz rouca, onde se mesclava a paixão e uma reverência profunda, o reconfortou:

- Você é a criatura mais linda do mundo, não existe tanta perfeição...

Sorrindo sem medo, Duo se deixou levar pelas mãos de Heero e deitado sob ele viu-o despir-se. Por uma fração de segundo, sentiu-se tomado de pânico, pois jamais imaginara que seria tão grande...Desejo e medo se alternavam em ondas sucessivas e pensou em pedir-lhe que não continuasse. Mas, se a dor era o preço a ser pago para pertencer àquele homem, ele aceitaria sem queixas! Confiante, abriu os braços para recebê-lo...

Heero deitou-se sobre Duo, mas um último vestígio de consciência ainda o impedia de dar vazão ao desejo desenfreado. Levou o dedo a boca e o encharcou com bastante saliva levando-o a entrada do americano. Com um movimento rápido, ele penetrou-o por inteiro. Manteve-o envolvido em seus braços até sentir que a dor se tornava mais tênue, enchendo o rosto adorado com beijos ternos.

Foi Duo quem começou a se mover, incitando-o a prosseguir. Gemendo de prazer, ele ergueu os quadris, seguindo o instinto primitivo do desejo.

Enlouquecidos de prazer os dois atingiram o êxtase juntos e seus gritos de paixão se elevaram, rompendo o silêncio.

Quando Duo, saciado, murmurou baixinho que o amava, Heero levou algum tempo até articular as palavras jamais ditas antes.

- Eu te amo, doçura...

- ... então é melhor a gente "meter a mão na massa" imediatamente – dizia Heero, aumentando ligeiramente o tom de voz , a ponto de chamar a atenção de Duo.- Gostaria que vocês escrevessem rapidamente alguns fatos sobre a vida de cada um. Nada muito complicado. Apenas o nome, idade, estado civil, profissão, hobbies, este tipo de coisa...- e tirou um maço de papéis e várias canetas da pasta.

Duo, sem perder mais tempo começou a escrever com todo cuidado : Chris Logan, 19 anos, solteiro, servidor civil atuando na área de telecomunicações. Seria o caso de mencionar as letras de música que fazia? Não, melhor não. Mas de repente, ocorreu-lhe que tudo aquilo era bobagem. Ele certamente não voltaria na semana seguinte. Quando levantou os olhos, teve a impressão que Heero o olhava novamente. A impressão foi tão forte que ele precisou se encolher para ficar bem atrás do rapaz de cabelos loiros que se sentava a sua frente.

- Bem, agora chega – disse ele – A seguir gostaria que cada um de vocês viesse até aqui e lesse seu exercício perto do gravador. Não fiquem constrangidos, por favor. Na próxima semana garanto que já estarei identificando vocês pela voz. E não teremos mais problemas deste tipo até o fim do curso.

Heero fez uma pausa e sorriu. Era o tipo de sorriso secreto que Duo guardava bem na memória.

- E não se esqueçam: sou muito bom para identificar vozes – disse ele, olhando diretamente para Duo.

O coração de Duo disparou ao ouvir aquela frase e ficou ainda mais inquieto quando Heero retirou os óculos e continuou a encará-lo. Pela primeira vez naquela noite, pôde ver os olhos de Heero. Sim, eram os mesmos olhos azuis que se iluminavam ou escureciam repentinamente, dependendo da situação. Mas também havia alguma coisa diferente neles, como se lhes faltasse vida. Apesar de estarem voltados para ele, os olhos de Heero pareciam olhar em direção ao infinito. Sem dúvida não podia ver Duo nem nada mais. Estava cego! Pela primeira vez ele tomou consciência deste fato. E foi como se recebesse um choque. Passou instantaneamente da raiva e ressentimento para compaixão. Sentiu pena de Heero e quase chorou, ali mesmo. Sim, ainda que pretendesse se vingar dele, não podia aceitar aquela cegueira como parte da vingança. Era pedir demais.

Enquanto o primeiro estudante se levantava para relatar os dados pessoais, Duo mergulhou de novo em seus pensamentos. O que fazer? Heero não parecia estar brincando quando fez aquele comentário sobre as vozes. Mas também lhe parecia difícil que o japonês pudesse reconhecer sua voz: ele jamais iria supor que, por extrema coincidência, seu antigo amante estaria ali em meio a um grupo de soldados inexperientes, numa base distante. Na verdade Duo não conseguia atinar com os motivos que teriam trazido Heero a uma base tão pequena e distante do QG. Não fazia sentido.

E de repente, era sua vez de apresentar-se. Duo ficou um pouco abobalhado e precisou obrigar suas pernas a se moverem. Olhou de soslaio para Heero, consciente de que ele iria fazer algum comentário sarcástico caso ele não se levantasse imediatamente. Afinal, conseguiu caminhar, mas pareceu-lhe demorar uma eternidade ir até a mesa. Seu coração tinha disparado e sua língua parecia pesada, seca e sem vida.

Mas isso tudo é ridículo, pensou ele. Heero não pode me ver. E mesmo que reconheça minha voz, o que poderá acontecer? Ele ficará em dúvida, sem condições de comprovar a verdade.

Então, por que motivo estava ali lendo seus dados pessoais com voz fingida? Só depois que voltou ao seu lugar é que Duo tomou consciência do que tinha feito. Ficou chocado ao constatar que modificara a voz sem perceber. Pior ainda: Heero parecia não ter se abalado em nada. E por que, Santo Deus, ele tinha que se preocupar com isso? Heero Yui não partilhava mais a sua vida. Ele próprio deixara isso bem claro. Pois bem: estava cego agora. E daí? Tinha olhos muito vivos quando tinha usado e abusado de seu corpo o quanto quis para depois despachá-lo sem sequer um adeus ou um obrigado, há dois anos.

Ele certamente tinha seus motivos para vir àquela base próxima à cidadezinha aonde certa vez, antes de conhecê-lo, Duo teve que ficar um tempo fazendo reparos em seu móbile suit. Fora assim que se encantara pela paz daquele lugar e onde agora tentava curar-se de um amor traído. Heero nunca fazia nada sem estar perfeitamente seguro de suas ações. Tratava-se do homem mais controlado e mais seguro que Duo encontrara em toda sua vida. Forte, cheio de confiança em si mesmo, dominador. Um homem que sempre sabia muito bem o que fazia.

- Bem, isso vai me dar trabalho suficiente para toda semana – disse Heero, logo que a classe toda terminou a leitura de seus dados pessoais. E como nosso tempo já está quase esgotado, por hoje é só. Agora vejamos... Não tenho intenção de assustar ninguém logo no começo. Portanto, vou passar um exercício que seja fácil para todos. Peguem aqui os papéis já impressos e me tragam na próxima aula. E, eu gostaria que alguém ... talvez você Chris, fechasse a porta dos fundos depois que todos saíssem. Ah, e também apagasse a luz, assim posso ficar mais sossegado.

- Está bem – respondeu ele, evitando denotar surpresa na voz, mas sem conseguir esconder a satisfação que sentia diante da escolha.

Enquanto todos arrumavam suas coisas e saíam, Heero permaneceu imóvel em seu lugar. Duo fechou a porta dos fundos e apagou as luzes. Veio tateando, no escuro até a frente da sala. No exato momento em que começava a sair, ouviu o som de um fósforo que se acendia. Quando olhou para trás, viu Heero acendendo um cigarro. Achou estranho, pois nunca vira o Soldado Perfeito fumando.

- Está tudo bem com você Chris? – perguntou aquela voz familiar vinda da escuridão.

- Sim, tudo bem – respondeu ele secamente. E acrescentou: - E você, tudo bem? Fiquei um pouco preocupado em deixar você aí na escuridão, mas...

Suas palavras foram interrompidas por uma gargalhada seca e de certa forma cruel.

- Você se esquece, Chris, que eu sempre estou no escuro. E lhe garanto que já estou acostumado com isso.

- Imagino que sim, mas não acho que viver no escuro seja muito agradável...

- Agradável? – respondeu ele com nova risada cruel. – Não é nada agradável. Mas também não é assim tão terrível. Evidentemente, não posso ter pressa em momento algum, por exemplo. Isso nem sempre é fácil...

- Você parece uma pessoa muito amargurada – disse Duo, imediatamente arrependido de ter dito isso. E tentou consertar: - Mas também acho que tem todo direito de ser assim...

- Com o tempo a gente se acostuma a qualquer coisa – respondeu Heero. – Aliás, não seria possível você se aproximar mais? Assim não preciso continuar gritando, para falar com você.

- Claro que sim – disse Duo, querendo dizer justamente o contrário. E começou a voltar atrás na escuridão, até o lugar onde Heero estava.

- Fale-me um pouco de você – pediu Heero, quase abruptamente.

- Eu já disse o que tinha que dizer – replicou Duo, cuidando para não denotar nenhuma emoção. – Talvez seja sua vez de falar...

- Bem, não tenho muito para contar. Sou cego. E agora estou aqui. Antes exerci a profissão de piloto de Mobile Suites.

Isso absolutamente não é tudo, pensou Duo. Sabia que Heero estava fugindo de alguma coisa que lhe doía muito. Por isso foi diretamente ao assunto.

- Como você perdeu a vista? – perguntou sem mais rodeios. Dessa vez a risada foi tão amarga que Duo pôde sentir seu gosto sem nenhum esforço.

- Qual das vezes? – disse ele, para espanto de Duo.

Bem, não sabia que ele ficara cego mais de uma vez na vida. Pelo menos nunca lhe tinha dito nada a respeito, durante o curto período em que estiveram juntos.

- Eu... não entendo o que você quer dizer – comentou ele, titubeando. A voz de Heero soou um pouco irritada, à medida que ele pronunciava bem cada uma das palavras:

- Pensei ter deixado claro que fiquei cego mais de uma vez.

- Bem, desculpe. Eu não sabia disso. – replicou ele, tentando não demonstrar sua raiva e nervosismo – Desculpe se a pergunta foi muito indiscreta. Talvez fosse melhor eu ir embora...

- Não torne as coisas mais difíceis – respondeu Heero repentinamente normal. Totalmente controlado.

Houve um breve silêncio, até que ele continuou falando, sem nenhuma alteração na voz.

- Eu é quem lhe devia pedir desculpas. Eu devia simplesmente explicar que fiquei cego duas vezes, ou melhor, foram duas ocasiões em conseqüência de uma mesma circunstância. A primeira vez foi... bom, algum tempo atrás numa espécie de acidente que eu sofri. Então a cegueira durou apenas um mês e eu achei que tinha me curado. Mas certo dia ela voltou de repente, e desta vez parece que não tem mais cura.

- Deve ter sido uma experiência horrível – disse Duo, sem conseguir se conter – Mas quanto tempo durou esse período em que você recuperou a visão?

- Não chegou a uma semana.

A resposta de Heero parecia não denotar grande interesse na discussão. Ele retirou um cigarro, rapidamente, e começou a procurar os fósforos.

- Desculpe, esqueci de lhe oferecer um cigarro. Aceita?

- Ah, sim. estava justamente pensando nisto – respondeu Duo um pouco involuntariamente.

E levantou-se de onde estava sentado, para apanhar o cigarro do maço que Heero lhe estendia. Para sua surpresa, Heero não apenas acendeu o fósforo sem dificuldade mas também ofereceu-o exatamente à sua altura. Como se... como se ele conhecesse muito bem sua altura. Duo inclinou-se para apagar o fósforo e, inadvertidamente, tocou sua mão na dele. Foi como se sua pele queimasse, de modo que retirou a mão , quase assustado.

- Aconteceu alguma coisa com você? – perguntou Heero, preocupado.

- Não... nada – gaguejou ele – Pensei que o fósforo fosse queimar os seus dedos.

- Ou seja, ainda não aprendi a brincar com fósforo, não é? – retrucou ele provocativo e ao mesmo tempo brincalhão.

Ambos riram por um momento, até que Duo lembro-se de quem era, mas sobretudo quem era aquele homem. Sim, tinham rido juntos tantas outras vezes!

- Acho que isso não é nada engraçado – disse ele, finalmente.

- È que você nunca me viu gastar uma caixa de fósforos inteirinha até conseguir acender um cigarro – replicou Heero.

- Não seria mais fácil usar um isqueiro?

- De fato, seria mais fácil – respondeu ele sem hesitação.

Aquele tom de voz deixou bem claro que Heero Yui gostava de escolher as alternativas mais difíceis, mesmo que cego, porque só assim aprendia alguma coisa.

- Você mora aqui há muito tempo? – perguntou ele, de modo tão inesperado que Duo tomou um susto e recuou. Só depois de alguns segundos conseguiu se controlar e responder.

- A primeira vez que estive aqui foi há muito tempo... – disse Duo, sabendo que a resposta não era mentirosa, mas, ambígua.

De fato, passara algum tempo ali quando precisou reparar o Death Scythe. E só voltara dois anos atrás.

- E você? – Perguntou rapidamente antes que Heero continuasse suas questões. – Mora aqui há muito tempo?

- Cheguei faz duas semanas.

- Deve ter sentido bastante diferença do QG. Ouvi alguém dizer que você morava lá. È verdade?

- No QG e em outros tantos lugares – respondeu Heero de maneira displicente – De fato, a gente sente a diferença. Mas é gostoso mudar um pouco de ar. Antes, eu achava que todos ao lugares eram iguais para uma pessoa cega. Mas os outros sentidos permitem notar as diferenças perfeitamente. Por exemplo, em matéria de poluição sonora essa base é um paraíso, se comparada ao QG.

- Ah, sim é uma base muito mais sossegada – disse ele, antes de acrescentar imediatamente: - Imagino que seja...

- Isso quer dizer que você nunca esteve no QG? – perguntou ele com uma curiosidade não muito típica em Heero Yuy.

- Estive em algumas das bases principais – disse Duo procurando se proteger. – Sem dúvida são lugares muito mais barulhentos do que aqui.

Heero pareceu notar que Duo se esquivava. Por isso ele continuou a falar, tentando acentuar seu sotaque do interior.

- Acho que já está ficando tarde. Aqui todo mundo dorme cedo.

- Claro, claro – replicou Heero, aparentemente sem notar a diferença de sotaque. –
Acredito que minha assistente já deve estar chegando para me apanhar.

Assistente? Duo sentiu o sangue desaparecer de seu rosto. Seria a mesma de antes? Ah, jamais poderia esquecer a voz daquela mulher que nunca vira – apenas recordava sua voz para sempre. Uma voz de secretária e guarda-costas que atendia o telefone para dizer friamente que Heero não estava. Heero nunca estava. Ou em reunião com Relena, ou cavalgando com Relena, sempre ela. E com certeza a secretária ria, imaginado quem seria aquele jovem inocente. Depois que ele desapareceu, Duo lhe telefonou várias vezes pois descobrira que ele estava no Reino Sank. E era sempre a voz gelada daquela mulher que atendia, para dizer que Heero não estava. Aos poucos, Duo acabou entendendo que ele nunca mais voltaria, que preferira ficar com Relena e que a secretária mentia, a seu pedido. Teve certeza disso no último telefonema, quando a mulher riu, do outro lado, assim como Heero deve ter rido daquele mocinho idiota que tinha caído de amores por ele.

Duo tentou ver as horas em seu relógio de pulso.

- Bom, acho que está na hora – disse ele, com forte sotaque. - Eu deveria ter ido embora faz tempo. Então, com licença...

- Claro, desejo-lhe uma boa semana Chris. Até a próxima quarta, então. E não se esqueça de fazer o exercício, está bem?

- Vou fazer o possível para não esquecer – respondeu Duo, ciente de que não tinha nenhuma intenção de fazer o exercício. – Boa noite.

E sem esperar resposta, Duo dirigiu-se para a porta e saiu.

Continua...

(1)– É óbvio que não daria para esconder aquela trança nem que o Duo usasse uma cartola! Mas como isso é necessário para o desenrolar da história, vamos todos fingir que acreditamos...

Comentários:

Eu já acabei o fic, mas como ele está MUITO grande, mandarei aos poucos, mas não vou demorar...
Por favor, me escrevam pra eu saber como ficou, afinal este é meu primeiro fic e eu sei que tá um melodrama só... acho que peguei muito pesado...
Beijinhos...