1 de junho, 219 AC

-Caros professores, alunos, convidados. É com muita honra que eu aceito vir a esse palanque ser o orador da turma de formandos do ano 219 AC. – a voz ecoou pelo salão, firme e imponente, simbolizando o homem que aquele jovem se tornara. Atenções se voltaram para ele e as conversas paralelas rapidamente cessaram. –Muitos resolveram seguir a medicina por vocação, por curiosidade ou motivos pessoais. Creio que eu me enquadro no primeiro e no último caso. Descobri a minha vocação quando me tornei voluntário em um hospital infantil. Resolvi que queria ser um salvador de vidas quando vi a mulher a qual amei como uma mãe definhar e morrer, enquanto pessoas lutavam ao seu redor para lhe salvar a vida. Mas não é sobre tristezas do passado que eu vou falar, pois hoje é um dia de alegria. Creio que falo em nome de todos quando digo que sem vocês, professores, educadores, não estaríamos aqui. E que cumpriremos com orgulho tudo o que os senhores nos ensinaram. Seremos os melhores, manteremos a tradição de confiança. Faremos o que prometemos fazer quando entramos na faculdade como meros calouros sonhadores. Salvaremos vidas. Mas não é apenas em nome dos outros que eu quero falar. Também gostaria de falar um pouco em meu nome. Eu agradeço aos professores, mas sinto dizer que eles apenas me deram a sabedoria que preciso para poder ajudar os outros. O conhecimento de vida eu adquiri de outras pessoas. Meus pais. Sou um sujeito de sorte, tenho dois pais, dois maravilhosos pais, os quais eu não trocaria por nada desse mundo. Sei que tivemos as nossas desavenças, nossas brigas, nossos momentos, mas se não fossem por eles, literalmente, eu não estaria aqui hoje. Não seria metade do que eu sou. Eu gostaria de dizer que os amo muito, e obrigado por tudo.

Veja, não diga que a canção está perdida

Tenha fé em Deus, tenha fé na vida

Tente outra vez.

-Você está se tornando muito mole, Heero. – Duo comentou divertido e Heero soltou um resmungo ao seu lado, tentando disfarçar as lágrimas de emoção. –É apenas um discurso. – riu entre os presentes na platéia.

-Fica quieto baka porque foi você mesmo que estava ontem se lamuriando, dizendo que o nosso garoto estava crescendo, blá, blá, blá.

-E está mesmo. Olhe para ele. – o americano apontou para o jovem sobre o palco, com a toga negra lhe descendo até os pés. O mais novo médico na sociedade. –Até ontem eu estava trocando as fraldas dele. – fungou um pouco.

-Ah, pelo amor de Deus, vocês dois! – Audrey, ao lado deles, resmungou, cruzando os braços sob o peito. Ao dezesseis anos tinha se tornado uma bela jovem, com os cabelos loiros longos e brilhantes e os olhos azuis cobalto sempre irradiando felicidade. Não lembrava em nada a menina que um dia viveu de hospital em hospital, durante horas e mais horas de sessões de quimioterapia.

Beba, pois a água viva ainda está na fonte

Você tem dois pés pra cruzar a ponte

Nada acabou. Não, não, não.

-Não se meta, Audrey. Isso é assunto de adulto. – Heero a repreendeu e a garota riu. Assunto de adultos? Aqueles dois estavam resmungando como uma criança que estava perdendo o seu melhor amigo. Por Deus! Não era como se Nathan fosse pegar o diploma e sumir do mapa. Como eram dramáticos.

-Certo, senhores da maturidade. Não eram vocês mesmos que queriam bater uma foto? Olha lá, Nathan terminou o discurso e está indo receber o diploma.

Duo e Heero viraram-se a tempo de ver um homem chamando o nome de Nathan.

-Nathaniel Maxwell-Yuy. – o rapaz se levantou e caminhou até o reitor da faculdade para poder receber o seu diploma. Duo rapidamente ergueu a câmera fotográfica para captar aquele momento e guardar no álbum da família quê, desde a chegada de Heero, havia ficado ainda maior.

Tente, levante a sua mão sedenta e recomece a andar

Não pense que a cabeça agüenta se você parar

Não, não, não, não, não.

Há uma voz que canta, uma voz que dança

Há uma voz visível, pairando no ar.

O jovem recebeu o diploma e agradeceu a todos os professores, descendo do palco e caminhando em direção ao grupo que estava aos fundos do salão. Assim que se aproximou deles, uma garotinha de três anos veio correndo em sua direção, o abraçando fortemente pelas pernas. Os cabelos castanho mel estava presos em duas tranças e os olhos cobalto brilhavam com uma inocência infantil. Nathan rapidamente a ergueu no colo, dando um beijo na bochecha rosada dela.

-Você tava tão bonito, Nat! – disse, soltando pequenas risadinhas depois.

-Helen! Solta o seu irmão, vai amassar a roupa dele. – disse Heero, pegando a caçula no colo.

-Não! Eu quero ir com o Nat!

-Depois querida. – Duo apaziguou, antes que a menina desse um escândalo. Era tão grudada em Nathan que chegava a fazer birra e mais birra quando as férias dele terminavam e ele tinha que voltar a faculdade, dando incríveis dores de cabeça aos pais. Mas também, ele foi o que mais serviu de babá para a menina quando Duo e Heero queriam um pouco de férias. Ela tinha puxado toda a energia do pai americano… ou seria a "mãe"? Mesmo assim, era de dar um chá de cansaço nos dois ex-pilotos. Mas ainda sim era o xodó de todo mundo.

-O que vocês acharam do meu discurso? – o rapaz perguntou com um sorriso, enquanto Audrey tentava alisar com as mãos os amassados que Helen deixou na toga do irmão.

-Tocante, Nat. – disse Drey. –Esses dois choraram como dois bebês. – e apontou o pai e o padrasto. Heero e Duo fizeram a mesma carranca. Cinco anos de convivência sob o mesmo teto fazia um adquirir certas manias do outro.

Queira, basta ser sincero e desejar profundo

Você será capaz de sacudir o mundo

Vai! Tente outra vez.

-Choraram como bebês! – Helen repetiu, dando risadas, no colo de Heero.

-Não é melhor irmos? – falou o japonês, vendo que a cerimônia já estava terminando. –Relena está nos esperando na mansão para uma festa daquelas.

-Festa? – Nathan estreitou os olhos. –Mas eu disse que ela não precisava…

-Tá, você sabe que "não" nunca funciona com a minha mãe. – Audrey envolveu o irmão pelos ombros, o levando em direção ao carro. Heero os seguiu de perto, rindo com Helen em seu colo, enquanto os dois filhos mais velhos discutiam alguma coisa mais à frente. Com certeza sobre a festa que Relena insistiu em dar ao enteado.

Duo parou no meio do caminho, os observando ao longe. Agora ele poderia dizer que suas crenças e convicções estavam erradas, que realmente Deus existia. O Deus que Padre Maxwell e Irmã Helen tanto acreditavam. Afinal, quem mais poderia tê-lo feito sobreviver à guerra, tê-lo feito passar por tantas provações, para no final ser recompensado tão maravilhosamente? Tinha quem amava ao seu lado. Tinha um marido, dois filhos e uma enteada, maravilhosos. Além de grandes amigos como os ex-pilotos, Relena, entre outros. E todos estavam com saúde, bem e felizes. Assim como ele. É, Deus existia mesmo e não tinha esquecido dele.

O vento soprou suavemente, balançando alguns fios soltos da trança de Duo, e ele teve a impressão que uma voz suave veio junto com a brisa.

"Agora vocês têm uns aos outros. Até um dia, Duo."

-Até um dia… - murmurou com um pequeno sorriso. -… Hilde.

Tente, e não diga que a vitória está perdida

Se é de batalhas, que se vive à vida

Tente outra vez.

Owari

Beijos e até a próxima. Daphne