A guerra tinha terminado. Havia já alguns meses desde que Voldemort deixara para sempre este mundo. A comunidade bruxa lutava para se reerguer e se reorganizar. Não havia tempo para chorar os muitos mortos e as famílias bruxas apenas prosseguiam. Logo que o Ministério da magia foi restabelecido, reuniu equipes os aurores que sobraram e contratou os membros da Ordem da Fênix para auxiliar na captura dos Comensais da Morte ainda vivos.
Logo, Azkaban estava cheia de pessoas esperando julgamento. Harry Potter deixara claro que não queria que ninguém deixasse de passar por um julgamento justo e que a todos os prisioneiros deveria ser dada a opção de se submeter ao soro da verdade para provar sua inocência. O Eleito lembrou a todos o que acontecera com seu padrinho, Sirius Black.
Harry, Rony e Hermione faziam parte de todos os julgamentos. Sua presença, como apontara a nova Ministra da Magia, Lydia Green, era absolutamente necessária para que o Trio de Ouro desse informações sobre os julgados. Outros membros da Ordem da Fênix participavam do tribunal. Naquele dia, o Eleito estava sentado ao lado de seus dois melhores amigos, próximo deles estava Arthur Weasley, que assumira o cargo de chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia.
- Por que está demorando tanto? – Rony reclamou, em voz alta.
Eles estavam esperando os prisioneiros há pelo menos meia hora, a audiência estava atrasada e um burburinho tomava conta do local.
- Parece que um dos prisioneiros solicitou Veritaserum. - Kingsley Shacklebolt adentrou o salão do julgamento, assumindo seu local ao lado do Trio de Ouro.
- Isso é novidade. – comentou Harry.
O menino já estava achando que tinha sido completamente inútil exigir que fosse dada ao réu a opção do uso de soro da verdade, nenhum dos julgados até então tinha feito essa opção. Sua curiosidade falou mais alto.
- Quem foi? – Hermione questionou, antes que o garoto pudesse fazê-lo.
- Draco Malfoy. – Shacklebolt informou.
Harry ficou um tanto desconfortável, ele se deu conta de que não sabia que aquele dia seria o julgamento dos Malfoy. Uma certa incredulidade tomava conta do Eleito, ele nunca havia imaginado que Draoc Malfoy, de livre e espontânea vontade iria se expor daquela forma frente a tantos bruxos e bruxas. O sonserino sempre fora absolutamente reservado.
- E qual é o problema? – questionou Rony. – O Ministério não tem a poção em estoque?
- Tem, mas o garoto Malfoy precisa preencher uma papelada autorizando o uso. – o auror explicou. – Além disso, Lúcio está criticando o filho, bastante insatisfeito com a decisão.
- Malfoy está enfrentando o pai? – Hermione ergueu a sobracelha.
- O garoto está irredutível, não se importou com nada que o pai disse. – Kingsley contou.
Naquele momento, Draco Malfoy adentrou o local. Harry arregalou os olhos ao ver o outro, naquele homem não havia nada da postura e aparência impecáveis que já vira alguma vez no velho inimigo de escola. A guerra já tinha levado muito do viço de Draco Malfoy e os meses em Azkaban terminaram de levar o que restara. Ele estava pálido, sujo e seu corpo as vezes entregava-se a tremores profundos que o sonserino lutava para disfarçar.
- Dou início a Audiência Criminal do dia vinte e cinco de julho, cuja finalidade é a apuração dos crimes cometidos por Draco Lucius Malfoy, residente na Mansão Malfoy, em Wiltshire. Inquisidora: Suprema Corte dos Bruxos. – a voz de Arthur Weasley se fez ouvir. – Sr. Malfoy, o senhor é acusado de ser partidário de Você-Sabe-Quem, de ter atuado como Comensal da Morte e por consequência feito uso de maldições imperdoáveis, puníveis com pena de prisão perpétua em Azkaban. O senhor é acusado, também, da tentativa de assassinato de Alvo Percival Wulfric Brian Dumbledore, que resultou em danos graves em Cátia Bell e Ronald Arthur Weasley, e de deliberadamente planejar e tornar possível a entrada de outros Comensais da Morte na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts na noite da morte do já citado diretor. O que o senhor tem a dizer a seu favor, sr. Malfoy?
Draco parecia tão magro e frágil que poderia se desfazer ali mesmo. Mas sua voz soou surpreendentemente firme quando ele falou.
- Eu nunca fui realmente partidário do Lorde das Trevas, talvez quando eu era mais novo, quando acreditava na visão deturpada que meu pai tem do mundo. Mas posso afirmar que não concordo com a maneira que Você-Sabe-Quem agiu.
Após essa primeira afirmação, Harry entendeu porque Malfoy tinha solicitado o soro da verdade. Ele queria ter a chance de mostrar, que embora muitas das acusações que pesavam sobre ele tenham sido verdadeiras, não havia trevas dentro do sonserino.
- No entanto, se tornou comensal da morte? – Arthur Weasley questionou.
- Eu fui coagido a receber a marca negra após meu pai cair em descrédito junto a Você-Sabe-Quem, por ter falhado em uma missão. Se eu não aceitasse tornar-me Comensal da Morte, iria morrer, bem como toda a minha família. Eu não tinha para onde fugir, sabia que meu pai não deixaria o Lorde das Trevas e que, por consequência, minha mãe também não. Eu não tinha opção a não ser ficar para impedir que minha mãe fosse torturada e morta após a minha partida.
Arthur Weasley assentiu.
- Foi quando você recebeu a missão de assassinar Alvo Dumbledore?
- Sim. – Draco confirmou. – Quanto mais o tempo passava, após o dia no qual recebi a ordem de Você-Sabe-Quem, mais eu tinha certeza que não era capaz de matar. Durante todo aquele ano eu tentei me convencer de que poderia fazer aquilo.
- Por que não conseguiu? – Arthur Weasley perguntou, fazendo Draco Malfoy erguer as sobrancelhas.
Muitas pessoas no recinto estranharam a pergunta do sr. Weasley. Harry notou imediatamente que ele estava se compadecendo de Draco e dando a chance do menino se explicar. Arthur Weasley era extraordinariamente bondoso e humano, e por isso mesmo não existiria ninguém melhor que ele para aquela função. Ninguém seria mais justo.
- No dia que fiquei frente a frente com o diretor e ele me disse que eu não queria de fato mata-lo, fiquei assustado com a rapidez com a qual ele tinha descoberto a verdade sobre mim. – Malfoy dava seu depoimento e, enquanto o fazia, Harry se lembrava da noite que Dumbledore morrera. Era verdade o que o sonserino dizia, tinha ficado completamente claro naquele momento que Draco Malfoy não era capaz de matar. Desde aquele dia, Harry já tinha se dado conta de que o garoto não era verdadeiramente mal. – Era verdade que eu tinha armado todas as minhas tentativas de assassinato sabendo que elas dificilmente atingiriam Dumbledore. Sei que feri outras pessoas nessas tentativas, o alívio tomava conta de mim cada vez que eu tomava conhecimento de que o meu plano tinha sido descoberto e não tinha sido fatal para ninguém. Também gostaria de nunca ter deixado que os Comensais da Morte invadissem Hogwarts.
- O senhor se arrepende de tais atos? – O sr. Weasley perguntou.
- Sim, sinceramente. – ele disse, sem necessidade. A poção da verdade não o deixaria mentir. Draco Malfoy parecia se esforçar para colocar todo seu orgulho de lado e despejar a verdade em seu coração, impelida pela poção que aceitara beber. – Eu gostaria de pedir perdão a srta. Cátia Bell, ao sr. Ronald Weasley e às suas famílias.
Um burburinho tomou o cômodo. Harry encarou seu melhor amigo, o ruivo parecia incrédulo, encarando Malfoy com a boca aberta. Com certeza Rony Weasley achou que já tinha visto de tudo durante a Guerra, nunca imaginou que viveria para ver o dia no qual Draco Malfoy pedira perdão por alguma coisa, muito menos a um Weasley. Era de conhecimento geral que outrora a família Malfoy considerara os Weasley bruxos de segunda categoria.
- Sr. Draco Malfoy, o senhor já fez uso da Maldição Impérius? – o julgamento foi retomado.
- Sim, uma vez, em Madame Rosmerta, proprietária do Três Vassouras.
- O senhor já fez uso da Maldição Cruciatus? – Arthur Weasley tornou a perguntar.
- Não. – Draco Malfoy respondeu. – Tampouco do Avada Kedavra.
Harry olhou dentro dos olhos muito azuis do sonserino. Percebeu que o garoto o encarava firmemente e sustentou o seu olhar. Sentiu uma verdadeira empatia por aquele homem que estava ali, expondo-se a um tribunal para ser julgado. Ele via aquele garotinho de 11 anos que na loja da Madame Malkin lhe dissera que somente filhos de famílias bruxas poderiam frequentar Hogwarts. Draco crecera ouvindo de seus pais que aquela maneira de pensar era correta e fora completamente coagido a seguir o caminho das trevas. Draco Malfoy não precisava ser punido, Draco precisava ser salvo.
- Alguém tem algum questionamento a fazer ao sr. Malfoy? – Sr. Weasley perguntou.
O Eleito pensou durante alguns segundos, quando Arthur Weasley já abria a boca novamente para falar, Harry se manifestou.
- Você sabia que era eu? Quando fomos capturados. – o grifinório se esqueceu de toda a formalidade.
- Sim. – Draco Malfoy respondeu, erguendo a sobrancelha. – Te reconheci imediatamente.
Eles sustentaram o olhar um do outro durante alguns segundos. Ambos sabiam o que aquilo significava. Se Draco tivesse entregado imediatamente Harry na Mansão Malfoy, Lucio teria chamado por Voldemort antes que Belatriz chegasse e reconhecesse a espada, impedindo a vinda do Lorde das Trevas. Harry teria sido morto.
- Senhor chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia, eu gostaria de testemunhar a favor do sr. Draco Malfoy.
Todos os presentes voltaram sua atenção para o Eleito, olhando para ele com surpresa, inclusive o Sr. Weasley, Rony, Hermione e Draco Malfoy. Aliás, este último parecia o mais surpreendido entre todas as pessoas. Harry entendia porque o tribunal parecia tão estupefato. Durante todos os julgamentos, Harry somente interferira para fazer acusações aos réus, que eram de fato comensais da morte assassinos e perigosos.
- O sr. Draco Malfoy fingiu não reconhecer a mim e aos meus amigos quando fomos capturados e levados para sua residência. Foi por causa de sua atitude que foi possível evitar que Voldemort chegasse até mim em um momento no qual eu estava desarmado, sem consciência exata do que eu poderia fazer para mata-lo e mais, em um momento no qual ele ainda não podia ser morto.
Durante todo momento no qual o Eleito falou, o sonserino não desprendeu os olhos de seu rosto. Harry tampouco o fez.
- Muito bem, sr. Potter. – Sr. Weasley começou. – Dando sequência ao julgamento, devido ao uso de Veritaserum ficou claro que o sr. Draco Malfoy foi coagido a tornar-se Comensal da Morte e nunca matou ou torturou alguém. Ficou claro, também, que o sr. Malfoy nunca quis ou foi capaz de matar Alvo Dumbledore. De modo que ele é inocente destas acusações e não há o que contestar. No entanto, constatou-se também que ele fez uso da Maldição Impérius, que suas tentativas de assassinato causaram danos a dois inocentes e que ele possibilitou a invasão de Hogwarts por comensais da morte. Esta Corte votará pelo perdão dos crimes ou pela condenação do réu. Quem é a favor da anistia?
Todos os presentes voltaram-se para o Eleito novamente e o assistiram erguer a mão. Harry sabia que Malfoy tinha alguma culpa, mas acreditava que ele fora mais carregado até aquele caminho do que seguido por ele com intenção própria.
Além disso, ele tinha tentado protege-lo na mansão, merecia a chance de ser quem ele teria sido se não tivesse crescido em um ambiente tão intolerante. O garoto havia permitido o uso da poção e mostrara verdadeiro e genuíno arrependimento. Isso era algo que não se poderia dizer de nenhum outro réu julgado por aquela Corte após a queda de Voldemort.
Com o voto do Eleito, vieram os votos de Rony Weasley e Hermione Granger, posteriormente, de Kingsley Shacklebolt e Arthur Weasley. Ao verem o Eleito, ou melhor, o Trio de Ouro assumir essa postura, a grande maioria dos presentes ergueu a mão e votou junto de Harry Potter. As pessoas confiavam no julgamento do Menino-Que-Sobreviveu.
- Sr. Draco Lucius Malfoy, essa Corte concede ao senhor a anistia pelos crimes cometidos durante a segunda Grande Guerra. – Arthur Weasley sentenciou. – O senhor está livre.
Harry encarou o sonserino, viu que ele estava surpreso com o desfecho do julgamento. Quando sua varinha foi devolvida a ele, o esboço de um sorriso chegou a aparecer brevemente em seus lábios, antes de se apagar por completo. O louro olhou mais uma vez na direção do Eleito e depois deixou o salão de julgamento.