Fic: Dois mundos, um amor
Saori contemplava o oceano, distraída
com seus pensamentos.
Ela estava à bordo do Titanic, o
navio que nem Deus poderia afundar, como se dizia no dia da
partida.
Era seu primeiro dia de viagem. Ela deixaria para trás
seu país, para começar uma vida nova na América.
Julian, seu noivo, decidira se estabelecer nos Estados Unidos. Ele
também estava no Titanic, mas Saori quase não o vira.
Provavelmente, estava tratando de negócios.
"Melhor
assim", pensou ela. "Eu não suporto esse homem, que
infelizmente será meu marido".
Shunrey se aproximara
dela. Era mais do que sua dama de companhia: era também sua
única amiga.
- Saori? - chamou ela.
A jovem virou-se.
-
Diga, Shunrey.
- Precisa de algo?
- Sim... preciso ser
feliz!
Shunrey sentiu pena da amiga. Saori era linda e rica, mas
de que lhe adiantavam beleza e riqueza se ela não era dona do
próprio destino?
Saori desabafou:
- Estou tão
cansada... Cansada de só fazer o que os outros esperam de mim.
Eu quero ser livre!
- Saori, você precisa aceitar a vontade
de Deus. Vai se casar com Julian, e...
- Você sabe que não
o amo. Como Deus pode querer a minha infelicidade?
Shunrey
calou-se. Sabia que Saori tinha motivos para se revoltar.
- Sabe,
eu tive uma idéia... Você me empresta um vestido seu?
-
Saori, você tem um monte de vestidos, um mais lindo que o
outro.
- Eu quero ir até a terceira classe, e preciso de
uma roupa mais simples.
- O quê? Está louca?
-
Não, eu quero saber como é lá embaixo. Estou
entediada, quero me distrair um pouco.
- Mas e se o seu noivo
descobrir?
- Ele só vai saber se você contar.
Shunrey
suspirou.
- Isso não vai dar certo...
Apesar dos
conselhos da aia, a jovem milionária não desistiu de
seu plano. Depois de vestir as roupas emprestadas, Saori desceu até
a terceira classe, acompanhada por Shunrey.
Quando lá
chegaram, Saori avisou:
- Lembre-se: ninguém pode saber
quem eu sou. Para todos os efeitos, nós duas somos damas de
companhia.
As moças observavam tudo com curiosidade.
Acostumadas com ambientes luxuosos, estranharam um pouco a
simplicidade do local. Saori, entretida com o que via, não
percebeu que estava bem na frente da cozinha. De repente, a porta foi
aberta e a atingiu, derrubando-a no chão.
- Desculpe! Você
está bem?
Meio zonza, Saori viu um belo rapaz na sua
frente. Ele ofereceu a mão para ajudá-la a se
levantar.
- Ai! Você devia tomar cuidado!
- Quem mandou
você ficar parada na frente da porta?
Ela ia responder, mas
conteve-se. Realmente, ele não tivera culpa pelo que
ocorrera.
Shunrey perguntou:
- Você se machucou, Saori?
O
rapaz comentou:
- Saori... belo nome! Combina com você.
Ela
ficou vermelha.
- Bem, eu ainda não me apresentei... Meu
nome é Seiya.
Ele falava inglês fluentemente, mas
possuía um sotaque diferente...
- Você é da
Grécia? - perguntou Saori.
- Eu nasci no Japão.
Quando meus pais morreram, eu e minha irmã fomos morar com uma
tia na Grécia. Vivi lá dos 8 aos 18 anos.
- Que
coincidência! Eu nasci na Grécia, mas fui criada por meu
avô, que era japonês.
- Você não tem
traços orientais - observou ele.
Ela baixou os olhos.
-
Na verdade, eu fui adotada... me deixaram na porta da casa do meu
avô. Eu era apenas um bebê. Como ele tinha perdido seu
único filho, resolveu me criar como neta.
Nisso, um rapaz
de longos cabelos negros se aproximou deles.
- Seiya, temos muito
trabalho lá na cozinha.
- Calma Shiryu, estou
conversando.
- Não quero atrapalhar - disse Saori.
-
Estou cheio de descascar batatas! Só aceitei fazer isso para
viajar de graça.
- Bom Seiya, se pegarem você aí
parado... não quero nem ver!
Seiya olhou para Saori.
Convidou:
- Vamos sair daqui. Sei de um lugar onde ninguém
poderá nos perturbar.
Foi a vez de Shunrey se
intrometer:
- Cuidado Saori, você nem o conhece!
- Não
se preocupe, eu não mordo. Sua amiga estará segura ao
meu lado.
Sem cerimônia, ele pegou a mão de Saori e a
levou até o convés. Ela estava apavorada com a
possibilidade de ser vista por Julian, mas ficou quieta.
Felizmente,
o tal lugar à que Seiya se referiu ficava numa área de
pouca circulação.Dificilmente alguém os veria
ali.
Seiya começou a contar sua vida para a garota:
-
Eu conheci o Shiryu quando éramos crianças. Ele é
descendente de samurais, e me ensinou a lutar. Shiryu é
chinês, mas foi morar no Japão, onde ficamos
amigos.
Saori ouvia seu relato com interesse.
- Bom, depois que
fui para a Grécia, perdemos o contato durante vários
anos. Quando fez 15 anos, Shiryu foi passar uns tempos na minha casa.
Voltei a treinar artes marciais com ele.
Há alguns meses,
Shiryu recebeu um convite para dar aulas na Inglaterra. Mas você
sabe, a ameaça de uma Guerra na Europa dificultou as coisas...
Foi então que resolveu tentar a sorte na América, a
terra das oportunidades. Ele me convidou para ir junto, e aqui estou
eu.
- Puxa, vocês são muito determinados!
- Saori,
nada caiu do céu pra mim. Se eu quero ter um futuro melhor,
preciso batalhar por isso. Ir atrás dos meus sonhos...
Ela
ficou refletindo sobre essa última frase. Se pudesse, também
iria atrás dos seus sonhos...
- Já falei demais
sobre mim. Fale de você - pediu ele.
Saori ficou meio sem
graça. Não poderia lhe contar que era herdeira de uma
das maiores fortunas da Grécia. Nem que teria de se casar
assim que chegassem à América.
- Não tenho
quase nada para contar... sou dama de companhia de uma jovem muito
rica.
- Percebe-se, por suas maneiras, que você frequenta
lugares requintados.
Ela nem percebeu o tempo passar. Já
estava quase anoitecendo, e logo Julian iria passar em sua cabine
para levá-la para jantar. Precisava estar pronta.
-
Preciso ir, Seiya. Minha patroa deve estar me procurando.
Dizendo
isso, ela se afastou. Seiya perguntou:
- Quando nos veremos
novamente?
Aquilo estava indo longe demais... Para contentá-lo,
a garota respondeu:
- Quando eu tiver uma folga, irei
procurá-lo.
- Vou esperá-la...
Saori correu para
sua cabine. Ao entrar, deu de cara com Shunrey, que a aguardava
preocupadíssima.
- Saori, aonde você se meteu? O
Julian veio aqui, tive que inventar que você estava enjoada com
o balanço do navio e tinha se deitado!
- Desculpe, Shunrey,
eu nem percebi como o tempo passou rápido.
- Você vai
arrumar confusão... Aquele rapaz, o tal de Seiya, ficou
interessado em você.
- Imagine, nós só
conversamos. É apenas uma amizade, nada mais.
- Não
é isso que seus olhos dizem...
- Ah é? E o que eles
dizem?
- Eu nunca vi seus olhos brilharem tanto como agora. Você
está apaixonada!
- Ora Shunrey, você não sabe
o que diz!
- Se estou enganada, prove. Prometa que não
voltará lá de novo.
- Eu prometo - afirmou Saori,
sem muita convicção.
Vestiu-se e esperou por Julian. Foram jantar, mas ele não parava de falar sobre negócios. Ela não aguentava mais ouvi-lo.
Seiya
era tão diferente! Por incrível que pareça,
sentira-se mais a vontade com um estranho do que com o próprio
noivo.
Não podia negar que o rapaz era muito atraente. Mas
eles viviam em mundos diferentes... Shunrey estava certa. Era melhor
que não o encontrasse mais.